sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Uma carta para Colin Chapman

Caro Colin:

Provavelmente já deve ter ouvido isto dezenas de milhares de vezes, mas não ouviu isto da minha parte: para mim, foi uma das pessoas mais marcantes da Formula 1, senão a mais marcante. Nunca foi uma pessoa dita convencional, porque sempre puxou os limites de tudo. Os limites técnicos, comerciais e até os limites legais.

Desde os seus tempos do Lotus Seven que ficou obcecado com a ideia de que "quanto mais leve, mais veloz é o carro". De fato o foi, mas o preço a pagar foi elevado. Tirando o Enzo Ferrari, você foi o dono que viu mais pilotos mortos a bordo dos seus carros. Stirling Moss, que guiou todo o tipo de carros, acabou a sua carreira a bordo de um Lotus, em Goodwood, Alan Stacey e Chris Bristow morreram na mesma tarde em Spa-Francochamnps em carros teus, em circunstâncias diferentes. Parece que não ficaste abalado com nada disso. 

Até ao dia em que um dos teus carros matou o teu melhor piloto, e provavelmente o teu melhor amigo, Jim Clark. Pensaste sériamente em largar tudo, mas mantiveste o passo, porque afinal de contas, tinhas conseguido o negócio da tua vida quando convenceste a Imperial Tobacco a patrocinar os teus carros. Primeiro, eram Gold Leaf, depois a John Player Special. 

Muitos ficaram com medo de andar nos seus carros, mas sabiam que de outra forma, não seriam campeões. Aparentemente, quando Jochen Rindt perguntou se deveria ficar na Brabham ou ir para a Lotus, a resposta que teve - uns falam do próprio Jack Brabham, outros afirmam que foi o seu empresário, um tal Bernie Ecclestone - foi: "se quiseres ser campeão do mundo, vais para a Lotus. Se quiseres sobeviver, ficas na Brabham". Isso só demonstra o fascinio e consequente medo de guiar nos teus carros.

E os teus carros ficaram definitivamente na História. Com números. Todo e qualquer "petrolhead" sabe que se falar de numeros como "25", "49", "72" ou "79", sabem que se fala de carros míticos, que marcaram toda uma geração. Os meus favoritos pessoais são o 72 e o 79, porque acho que marcaram toda uma época. Mas também foram carros que morreram pilotos teus. Rindt foi no 72, e Peterson podia ter sido salvo se tivesses um modelo 79 de reserva e não o 78 com que ele usou, na sua corrida fatal. 

Ficou também obcecado com a ideia de que conseguia controlar tudo, mesmo nos aspectos que nunca conseguir controlar. Como na história do DeLorean, não é? De nada adiantou ter morrido - ou fugido para o Mato Grosso, como alguns amigos meus gostam de especular, qual Elvis Presley - para sabermos as falcatruas com a DeLorean, com as contas paralelas no Panamá e na Suiça, ou então os milhões de libras dados pelos governo britânico a uma fábrica da Irlanda do Norte para construir DeLoreans, e no final descobriu ser-se um buraco sem fundo. Quando as coisas ficaram fora de controlo, o coração não aguentou. Pudera... quem aguentaria aquilo tudo? E o escândalo? A reputação? E a possibilidade de passar algum tempo na prisão? Não admiraria que, tendo você 54 anos, parecia ter 70.

Em suma, você ficou para a História como uma personagem complexa, com várias camadas, por vezes contraditória. Um dia podia ser o projetista genial que contornava as regras vigentes para bater a concorrência, outro dia andava com personagens duvidosas como o David Thiemme, da Essex. Mas o legado ficou. A Lotus continua a existir, a sua equipa de Formula 1 decaiu e saiu de cena por 16 anos, para depois voltar e ter... duas equipas com o mesmo nome. Acho que de além-túmulo, teria adorado assistir a isto. Ou então, teria criado um novo Polo Norte Magnético, de tanto você se revirar na campa...

Na minha opinião, as suas contradições só o tornaram ainda mais fascinante. Acho que merecia um filme de Hollywood, sabe? Ah pois... Caro Colin, desejo-lhe que goze a Eternidade da melhor maneira. Não sei por onde anda, e francamente, não quero saber se está no Mato Grosso ou no Raio que o Parta. Foi-se para o Grande Desconhecido e provavelmente já deve ter ajustado contas com alguns que pagaram o preço mais elevado por terem o previlégio de guiar as suas máquinas.

Quanto a mim, despeço-me. Espero que nos encontremos por aí, um destes dias, neste vasto Universo, para uma conversa sobre automobilismo. De perferência sem o anão por perto...

Sem comentários: