sexta-feira, 29 de junho de 2012

GP de Londres, ou o Primeiro de Abril a 28 de junho

Causou alvoroço nesta quinta-feira o anuncio da apresentação, na imprensa britânica, de um "GP de Londres", com o apoio da Santander, e acompanhado de um video com a participação de Lewis Hamilton e Jenson Button, os pilotos da McLaren. O circuito, desenhado em pleno centro da capital britânica, com passagens por alguns dos grandes marcos da cidade, como o Big Ben e o edificio do Parlamento, entre outros, passou a ilusão de que num futuro próximo, á noite, haverá carros de Formula 1 rolando a 300 km/hora por aquelas bandas.

Mas quando a poeira assentou, os mais atentos notaram a razão pelo qual este anuncio, tão inesperado e tão bem feito - afinal de contas, falamos de patrocinador e com declarações dos dois pilotos da McLaren - escondia algo mais: desviar as atenções em relação à sentença dita no dia anterior, no Tribunal de Munique, que condenou o banqueiro alemão Gerhard Gribowsky, a oito anos de prisão por frause e evasão fiscal. E o dinheiro descoberto na conta dele é proveniente de Bernie Ecclestone, que o pagou em 2002 para que ficasse nas suas mãos, e que depois as colocou nas mãos da CVC Capital Partners. Uma sentença destas, numa altura em que a Formula 1 vai entrar em bolsa, talvez mais para o final do ano, não seria boa publicidade de todo. E portanto, este "tirar o coelho da cartola", no caso do "GP de Londres", quase me faz pensar que a partir de agora, o Dia das Mentiras na cidade de Londres se comemora a 28 de junho.

O jornalista britânico Joe Saward, quando escreveu ontem sobre este assunto, colocou no título uma afirmação irónica: "GP de Londres... e que tal uma corrida em Marte?", e nas linhas a seguir ele escalpeliza a razão pelo qual ele afirma que tudo isto não passa de um embuste para inglês ver. Porque, para começar, desde quando que Bernie Ecclestone oferece algo a um lugar? Tirando a história de Nova Iorque - e isso é algo nebuloso para mim - não me recordo de nada assim semelhante, mas a minha memória já não é o que era.

Saward, para desmontar o esquema, vai aos detalhes mais básicos. Primeiro que tudo, fala que todo este esquema não passa de uma arte mágica com o objetivo de desviar as atenções para algo mais importante, que foi o "caso Gribowsky". mas depois aponta factos: que mais valias traz uma corrida de Formula 1 num dos destinos turisticos mais visitados do mundo, por exemplo? E se a ideia é o de trazer para ali o GP da Grã-Bretanha, como é que irá rasgar um contrato que foi assinado no ano passado e cuja validade vai até... 2027? Para não falar do eventual lucro que tal corrida possa ter. Eis um extrato:

"De qualquer maneira, só posso imaginar o que a CVC Capital Partners e os seus "amigos de Kansas" (o equivalente britânico aos 'amigos de Peniche') irão dizer sobre alguém que concorde em reduzir os seus proveitos por uma larga margem. Financiar uma corrida do seu próprio bolso ira requerer a que a Formula One Group pague a diversas partes: as equipas quererão a sua habitual percentagem, caso não haja comissões vindas de algum promotor local, significará que serão gastos à volta de 30 milhões de dólares. Acrescentem a isso outros 30 milhões para crias as infraestruturas, que apenas será pago pelas receitas de bilheteira. Se tiverem à volta de 120 mil pessoas e cada um pagar em média 200 dólares, isso significará receitas de 24 milhões. Estão a ver toda a coisa? Isto tudo poderá assustar os investidores, porque isso traria prejuízos a eles. A Formula 1 não ganha nada em impulsionar as receitas locais - é por isso que os governos locais pagam para ter as corridas nos seus lugares - mas no caso de Londres, tal impacto pode ser minorado."

A única ideia no qual Londres poderia fazer sentido, seria num eventual GP da Europa, que a partir de 2013 não terá circuito onde correr, depois que Valencia e Barcelona terem chegado a acordo em partilhar o lugar onde se realizará o GP de Espanha...

Em suma, esta ideia faz-me lembrar um album do Michel Vaillant, escrito em 1982, que especulava sobre uma corrida nas artérias de Paris. O titulo era "300 km/hora em Paris", e provavelmente Jean Graton deve ter desenhado a história a partir de um dos delírios do Tio Bernie. Afinal de contas, o anãozinho anda por aqui há muitos, muitos anos... e com uma pontaria afinada. Como conclui Joe Saward:

"Apesar de adorar a ideia de ver um Grande Prémio em Londres, e achar que tal coisa até seria ótimo para o desporto, tenho aquela sensação de que esta ideia desaparecerá após algum tempo, depois de ter feito o seu trabalho de desviar as atenções da questão mais importante destes dias: quais são as implicações no veredicto do caso Gribowsky? O cínico dento de mim diz-me que uma pessoa que não tem nada a esconder não necessita deste tipo de truques, mas perfiro esperar para ver se os procuradores [de Munique] decidem fazer alguma coisa antes de fazer qualquer julgamento sobre o 'caso Gribowsky'."

E pelos vistos, o truque resultou: alguém fala hoje sobre a sentença de Munique?

1 comentário:

Unknown disse...

Vale a pena notar que no site de JS - http://www.joe-saward.com/ - ele aparece numa foto com Ecclestone para impressionar os visitantes.

De qualquer forma, fui banido pelo tipo no ano passado quando sugeri que ele estivesse a trabalhar para Tony Fernandes... Mas OK, jornalistas podem fazer o que quiserem com blogues pessoais, não me importo.

Corrida de Londres? Av. da Liberdade, Lisboa 2008, RF1 Roadshow - Grande Prémio de Lisboa em 2013 talvez? Se Boris Johnson não estiver interessado, António Costa agradece. Agora falta perguntar ao presidente da CM de Lisboa...