Três semanas depois do seu acidente, na estância de ski francesa de Meribel, tenho evitado falar nos últimos dias sobre o estado de saúde de
Michael Schumacher devido à pouca fiabilidade das fontes e das noticias que aparecem nos jornais e sites especializados. A variedade de noticias - umas a dizerem que ele sairá do coma nos próximos dias, outras a dizerem o contrário - fazem com que esteja completamente de "pé atrás" sobre este caso. Assim sendo, prefiro recorrer às fontes oficiais, que afirmam que o estado de saúde do ex-piloto de 45 anos continua "estável", apesar de estar em coma artificial.
“Insisto e repito que qualquer informação relativa ao estado de saúde de Michael Schumacher que não seja oriundo dos médicos que trabalham no seu caso devem ser considerados puros rumores. Repito igualmente que a sua família tem plena confiança no trabalho desenvolvido pelos médicos. O estado de saúde de Michael Schumacher continua estável”, disse Sabine Kehm, a assessora de imprensa de Schumacher, na passada sexta-feira.
É certo que as pessoas querem saber de novidades sobre o estado de saúde do alemão, mas a maneira como certa imprensa, especialmente a dita "tabloide", está a forçar as coisas, é um pouco a maneira como eles desejam fazer disto uma novela. Mas apesar disso, há perguntas que as pessoas fazem e do qual desejam respostas. Será que isto é permanente e vai ficar anos num estado vegetativo, como no caso de Ariel Sharon? Será que quando acordar, será alguém que perderá movimento do seu corpo e sujeito a convulsões potencialmente fatais, como aconteceu a Maria de Villota? Os médicos dizem que "cada caso é um caso", e é verdade, porque o corpo humano é extraordinariamente complexo.
Assim, por estes dias, a melhor coisa é ler alguém que sabe da coisa: o antigo médico da Formula 1,
Dr. Gary Hartstein.
Ele têm um blog, como sabem, e sobre isto, ele têm escrito da maneira mais instrutivo e profissional possível. E o que ele diz é para serem pacientes. E é verdade: coisas como estas demorarão o seu tempo. Semanas, meses, se calhar anos. E ele poderá não mais ser o mesmo.
Mas há uma coisa que ouvi uma só vez, no dia seguinte ao acidente, e não ouvi mais, nem da parte dos médicos, nem da parte de outras pessoas: a escala do coma. Do Dr. Payen, um dos médicos da equipa que assiste Michael Schumacher, ouvi que a sua escala era "intermédia", significando que não iria acordar tão cedo, nem que estaria num estado vegetativo permanente. E isto foi há três semanas. Isto têm um nome: escala de Glasgow, devido ao facto de que quem fez a definição terem sido dois médicos de um hospital da cidade escocesa, em 1974.
Eis a definição dessa escala, dita por Hartstein:
"Consideram-se três critérios: abertura do olho do paciente, a resposta motora, e a capacidade verbal. Como pode ver, se olharem para os critérios de pontuação, os pontos para cada parâmetro podem ir do mais alto (o que representa um nível "superior" de função) ao mais baixo, o que representa uma função "pior".
Em termos de abertura dos olhos, 4 pontos são atribuídos se o paciente abrir os seus olhos de modo espontâneo, 3 pontos se abrirem a uma estimulação vocal, 2 se abrirem apenas em resposta à dor, e 1 se não houver qualquer abertura dos olhos.
A atenção então se vira para as respostas verbais do paciente. Se existirem respostas apropriadas a perguntas simples, obtêm-se 5 pontos. Se existir confusão ou desorientação, marcam-se 4; respostas inadequadas ou palavras não relacionadas "ganham" 3 pontos. Se o paciente apenas faz sons incompreensíveis em resposta à estimulação, são dados dois pontos, e, como com os olhos , se não houver resposta verbal apenas um ponto é dado. Obviamente este critério não pode ser avaliado com precisão quando o paciente é entubado, e quando esse fato é observado, muitas vezes dá-se a atribuição de um "valor" de "T" para este critério.
As respostas motoras são extremamente importantes. Se o paciente reage a comandos simples (i.e, mexer os dedos, mover o dedo indicador, etc) ele/ela recebe 6 pontos. Quando a resposta a um estimulo doloroso é uma tentativa orientada para remover o estímulo, são atribuidos 5 pontos. Em seguida, existe uma resposta de retirada (4 pontos), a uma série de movimentos desorganizados representando uma resposta primitiva para escapar do estímulo. Se o coma é ainda mais profundo, o paciente irá responder ao estímulo doloroso com uma flexão anormal dos braços e/ou pernas (3 pontos), uma resposta que se origina ao nível do tronco cerebral. Ainda mais profundo é a extensão anormal, porque este é integrado em níveis ainda mais baixos do tronco cerebral . A isso é atribuído dois pontos . E, se não existe qualquer resposta motora a todos os estimulos, recebe 1 ponto.
Se existe uma diferença na resposta dos lados direito e esquerdo, a melhor resposta é utilizada para marcar pontos (mas a "pontuação" do outro lado também conta).
Como você pode ver, as pontuações variam de um máximo de 15 a um mínimo de 3. A pontuação GCS é avaliada com bastante frequência - várias vezes ao dia - e oferece uma maneira confiável e reprodutível de se avaliar se o paciente está "a acordar" ou a "adormecer" , ou mesmo a permanecer na mesma. É também usado para estratificar aproximadamente a gravidade da lesão. Pontuações entre 13 a 15 pontos são consideradas como "leves" (e muitas vezes correspondendo ao que é observado em pacientes que sofrem contusões) . Traumatismo craniano moderado está presente em resultados entre 9 a 13 pontos, enquanto uma pontuação entre 3 e 8 pontos é definido como uma lesão grave na cabeça.
Já agora, qualquer paciente com uma pontuação de 8 ou menos é considerado como estando em estado de coma."
A explicação pode ser longa, mas a ideia é para esclarecer as pessoas que não estão familiarizadas com esta situação. E o conselho que dá é que as pessoas sejam pacientes com um caso como este e confiar nos médicos. Os perigos são existentes e há o risco de agravamento. Mas pilotos no passado, como
Cristiano da Matta, conseguiram sair deste caso sem sequelas graves e conseguiram ter uma vida normal. Essa é a grande esperança dos médicos: que desportistas como ele, ou pessoas que estejam no topo da sua forma, consigam fazer com que o corpo - e o cérebro - recupere das suas funções de antes do acidente.
É essa a nossa esperança.