Frank Williams, proprietário da equipa com o seu nome, fundado em 1977 do lado de Parick Head, morreu este domingo aos 79 anos. Estava doente desde há algum tempo, especialmente depois de 35 anos remetido a uma cadeira de rodas após o seu acidente em 1986, que o deixou paralisado da cintura para baixo. Com ele, a equipa conseguiu nove títulos de Construtores, entre 1980 e 1997, E sete de pilotos, com gente como Alan Jones, Keke Rosberg, Nelson Piquet, Nigel Mansell, Alain Prost, Damon Hill e Jacques Villeneuve.
Mas para além de campeões, passaram e contribuíram para a equipa pilotos como Clay Regazzoni, Carlos Reutemann, Jacques Laffite, Riccardo Patrese, Thierry Boutsen, Ayrton Senna, Heinz-Harld Frentzen, Jenson Button, Juan Pablo Montoya, Ralf Schumacher, Mark Webber, Nico Rosberg, Pastor Maldonado, Rubens Barrichello, Nico Hulkenberg, Felipe Massa, Valtteri Bottas, Lance Stroll e George Russell, entre outros.
E acolheu nos seus chassis, motores como Cosworth, Honda, Renault, BMW e agora, Mercedes.
E entre as pessoas que trabalharam por lá contam-se projetistas e engenheiros como Frank Dernie, Adrian Newey, Paddy Lowe, Neil Oatley, Antonia Terzi, e dirigentes como Toto Wolff.
Josh Capito, atual diretor de equipa, deixou no comunicado oficial a sua homenagem ao seu fundador:
"Sir Frank foi uma lenda do nosso desporto. Seu falecimento marca verdadeiramente o fim de uma era para a nossa equipa e para a Fórmula 1. Ele foi um ícone e um pioneiro. Os seus valores – que incluiram integridade, trabalho de equipa, uma independência e determinação feroz – continuam a ser o ethos central da nossa equipa e são o seu legado, tal como o nome de família Williams sob o qual nos orgulhamos de correr."
Nascido a 16 de abril de 1942 em South Shields, perto de Newcastle, filho de um oficial da Royal Air Force, Frank Williams ficou com o bichinho do automobilismo no inicio dos anos 60. Tentou ser piloto, chegando a correr na Formula 3, com um Brabham, em 1964, mas não teve grande sorte, e cedo virou para a aquisição de chassis para a Formula 2 e Formula 1. Pelo meio, conheceu e fez amizade com o escocês Piers Courage, herdeiro de uma cervejeira com o seu apelido, que tinha aspirações de competir na Formula 1. Em 1969, adquiriu um Brabham BT26, na equipa Frank Williams Racing Cars, e alcançou dois segundos lugares, no Mónaco e em Watkins Glen, no GP dos Estados Unidos.
Animado com estes resultados, no ano seguinte pediu a Alessandro De Tomaso, um construtor italo-argentino, para fazer um chassis para Courage. Desenhado por um jovem Gianpaolo Dallara, os resultados foram modestos, e para piorar as coisas, em Zandvoort, a 21 de junho, durante o GP da Holanda, um despiste causou a destruição do carro e a morte do piloto e amigo. Apesar de abalado pelo acidente, continuou a sua equipa, lutando para sobreviver. A certa altura, atendia telefonemas numa cabine telefónica do outro lado da rua, pois o telefone da sua fábrica, em Slough, tinha sido cortado por falta de pagamento.
Nos anos seguintes, adquiriu chassis March, para pilotos como Henri Pescarolo e José Carlos Pace, aliou-se à Iso-Marlboro para construir chassis, o FW03, onde correram gente como Arturo Merzário, Howden Ganley e Jacques Laffite, entre outros pilotos pagantes, entre 1973 e 1975. Os seus melhores resultados foram o quarto lugar no GP de Itália de 1974, com Merzário, e o segundo lugar no GP da Alemanha de 1975, com Laffite ao volante.
Em 1976, parecia que tinha atingido o "jackpot" quando se aliou ao canadiano Walter Wolf, que ficou coim 50 por cento da equipa e foi chamada de Wolf-Williams, que tinha Jacky Ickx e Arturo Merzário. Com chassis Hesketh 308, os resultados continuavam modestos, e a meio do ano, Wolf decidiu despedir Williams e tomar conta da equipa. Alguns meses depois, no GP da Argentina de 1977, o sul-africano Jody Scheckter acabou por vencer. deixando Williams realmente deprimido.
Mas graças à determinação da sua mulher, Virginia (Ginny), e a contratação de um jovem engenheiro, Patrick Head, que ambos voltaram a fazer uma equipa, agora chamada de Williams Grand Prix Engeneering, cuja primeira sede foi em Didcot, numa antiga fábrica de carpetes. O seu primeiro piloto na nova era foi o belga Patrick Néve, que com 250 mil dólares da cerveja Belle-Vue, pagou o seu lugar e andavam num March 761, antes dos sauditas entrarem em cena e injetarem dinheiro suficiente para construir aquilo que foi o Williams FW06, com o australiano Alan Jones ao volante, vindo da Shadow. Era 1978, e os primeiros resultados relevantes começaram a aparecer, com um segundo lugar no GP dos Estados Unidos, em Watkins Glen.
Com mais dinheiro, veio um segundo piloto, Clay Regazzoni, e Head fez o primeiro chassis marcante, o FW07. Estreou-o em Long Beach, mas foi em Silverstone que deslumbrou a todos, onde durante o GP da Grã-Bretanha, Jones e Regazzoni dominaram, e no final foi o suíço a triunfar porque o carro de Jones cedeu na volta 28.
Mas depois, a Williams venceu quatro das cinco corridas seguintes, terminando em segundo lugar no Mundial de Construtores, e Jones foi terceiro, batido apenas pelos Ferrari de Scheckter e Gilles Villeneuve. No ano seguinte, foi o triunfo, com Jones campeão e um FW07 que era realmente o melhor chassis do pelotão, a par do Brabham BT49. Poderiam ter alcançado o título em 1981, mas o duelo interno com o argentino Carlos Reutemann fez dispersar recursos - o argentino recusou ceder o comando para Jones no GP do Brasil, numa chuvosa Jacarépaguá - e foi aproveitado por Nelson Piquet para triunfar. Aliás, a equipa sabotou Reutemann porque preferiria Jones.
No ano seguinte, com o finlandês Keke Rosberg - Jones e Reutemann abandonaram a equipa e a Formula 1 - e o novo chassis, o FW08, voltou a vencer campeonatos. Mas com o motor Cosworth a perder potência para os Turbo, assinou um contrato com a japonesa Honda, que em 1983 regressava à Formula 1 depois de quinze anos de ausência.
Em 1985, a Williams contrata Nigel Mansell, vindo da Lotus, e apesar dos resultados terem sido inicialmente modestos, no final do ano, com a maior potência e fiabilidade dos motores japoneses, venceram as três últimas corridas da temporada, em Brands Hatch e Kyalami, duas delas com o britânico ao volante. E também foram as três últimas corridas com o FW10, que seria substituído pelo FW11 em 1986.
O carro era bom, tinham contratado o brasileiro Nelson Piquet, vindo da Brabham, e todos viam a equipa como uma das favoritas. E então um dia, em fevereiro, após um dia de testes no circuito de Paul Ricard, Williams ia para o aeroporto no seu Ford Sierra de aluguer, ao lado de Peter Windsor, então o assessor de imprensa da equipa, quando perdeu o controle e despistou-se. Não levava o cinto de segurança colocado e o carro capotou, fazendo-o bater com a cabeça no vidro e fraturando o pescoço de modo bem grave. Naquela noite, estava em coma e tinha perdido a sensibilidade do pescoço para baixo.
Lutou pela vida nos quatro meses seguintes, sempre com Ginny a seu lado, determinado a não o deixar morrer, fazendo muitas das vezes de enfermeira e convencendo os médicos a não desligarem as máquinas de suporte de vida. Em julho, em Brands Hatch, no GP da Grã-Bretanha, fez a sua primeira aparição pública e foi recebido debaixo de uma forte chuva de aplausos. A equipa correspondeu, com Mansell a triunfar, perante um público em delírio. E Ginny foi ao pódio buscar o troféu, em nome da equipa.
Mas apesar de tudo, havia um duelo interno, quase fratricida, entre Mansell e Piquet. E quem aproveitou foi Alain Prost, que com o seu McLaren, levou o campeonato, depois de um rebentamento espetacular do pneu do britânico em Adelaide, a 260 km/hora, em plena reta Brabham, quando tinha tudo para ser campeão. Mas no ano seguinte, o título foi de novo para a equipa, com Piquet ao volante, porque Mansell se lesionara em Suzuka, durante a qualificação para o GP do Japão.
Depois da Honda, e um ano de transição com os motores Judd, a Williams assina um contrato com a Renault, que constriu um motor V10 de 3.5 litros. Como pilotos, tinha o italiano Riccardo Patrese e o belga Thierry Boutsen que, não sendo campeões, deram à equipa quatro vitórias em 1989 e 1990. E no final desse ano, contrataram um jovem projetista vindo da March, Adrian Newey.
Regressado Mansell em 1991, que estivera na Ferrari, e com a ajuda de Head, construiram o FW14, outro dos chassis marcantes da equipa e da Formula 1. Estreado no GP dos Estados Unidos de 1991, depois de problemas de juventude, que provavelmente deram o título a Ayrton Senna, no seu McLaren MP4/6B, dominou a Formula 1 no ano seguinte, dando por fim o título do britânico. E era um carro do outro mundo: caixa sequencial semi-automática, controlo de tração, suspensão ativa, muitas dessas coisas desenhadas por Paddy Lowe. No ano seguinte, Alain Prost, de regresso após um ano sabático, também venceu o campeonato, com o FW15C, ao lado de um estreante, o britânico Damon Hill.
Contudo, em 1994, as regras mudam, provavelmente para impedir a continuação do domínio da Williams, e Prost retirou-se, dando lugar a Ayrton Senna. O FW16 era um carro instável e o brasileiro não conseguia domá-lo perante um jovem lobo, o alemão Michael Schumacher.
Depois, veio Imola. A segunda morte de um piloto num dos seus carros, quase 24 anos depois de Courage. Frank Williams estava no quarto daquele hospital em Bolonha quando Senna exalou o seu último suspiro e pensou na crueldade do momento e o que iria fazer dali por diante. Uniram-se à volta de Damon Hill, provavelmente com ele a lembrar o que se tinha passado ao seu pai em 1968, quando trouxe de Hockenheim o cadáver de Jim Clark e tentou colar as peças de uma Lotus em choque. Mas ao contrário do seu pai, não conseguiu o título por causa da colisão com Michael Schumacher, em Adelaide.
Mas em 1996, com Hill e o canadiano Jacques Villeneuve, filho de Gilles Villeneuve, conseguiram voltar aos triunfos, e o mesmo aconteceu em 1997. Mas no final desse ano, o acordo com a Renault termina e confia em motores de preparadores até ao próximo acordo com um construtor relevante. E já tinha um em vista: a BMW.
O acordo aconteceu no ano 2000, e ali, tinha o alemão Ralf Schumacher, irmão mais novo de Michael Schumacher, e um jovem de 20 anos que tinha vencido um concurso para ver quem era o melhor, num conjunto de jovens pilotos. Seu nome era Jenson Button. Contudo, ficou apenas uma temporada, porque foi substituído pelo colombiano Juan Pablo Montoya. Nos três anos seguintes, tornou-se na força de oposição aos Ferrari dominantes, mas depois da vitória de Montoya no GP do Brasil de 2004, e da recusa de Williams em vender a sua equipa à marca alemã, com esta a decidir ir para a Sauber, a equipa entrou num lento declínio.
A partir dali, poucos foram os momentos de brilhantismo. A pole-position de Hulkenberg em Interlagos, em 2010, a vitória de Pastor Maldonado em Barcelona, em 2012, e a pole-position de Felipe Massa no GP da Áustria de 2014, e a monopolizar a primeira fila da grelha com o finlandês Valtteri Bottas, e o terceiro lugar no campeonato de Construtores nesse ano, foram escassos momentos de uma equipa que dominara na categoria máxima do automobilismo.
Head e Williams foram nomeados cavaleiros e decidiram reformar-se. As operações do dia-a-dia foram entregues a Claire Williams, a sua filha, uma rara mulher num mundo de homens, mas provavelmente via nela a reencarnação da determinação de Ginny, que tinha morrido em 2013, vitima de um cancro. Mas os dias de gloria estavam para trás, e a idade apanhou-o. Tinha deixado de acompanhar nas boxes e estava mais em casa, entre um susto e outro. E ainda deve ter sabido da venda da equipa à Dorilton Capital, provavelmente para cuidar do seu pai cada vez mais débil.
Agora, a Williams está noutras mãos. Os novos donos prometeram que manterão um legado de meio século na categoria máxima do automobilismo. O seu legado. O de um homem determinado a vencer, que adorava automobilismo e a velocidade, e tinha todo o tempo do mundo para o alcançar. Porque sabia que estava a fazer tudo certo.
Frank Williams disse que queria ter ficado na fábrica até ao fim. É provável que queria morrer na sua sede em Grove, rodeado pelos seus carros. Não creio que isso tenha acontecido.
Mas sabíamos que era um titã, mesmo em vida, mesmo debilitado pelo seu acidente, que o deixou numa cadeira de rodas nos últimos 35 anos da sua existência. Tinha escrito a sua parte da história ainda vivo e consciente do que tinha feito. No final, o seu legado pessoal é o do ser humano determinado, que vivia pela adrenalina da velocidade e contra tudo e todos, sobreviveu e alcançou o seu objetivo. Já era imortal em vida. E se hoje, todos dizemos o seu nome e curvamos em sua memória, aquilo que lembramos foi o que fez, como chegou lá, as dificuldades que passou, que nunca desistiu até ao triunfo e o legado que deixou na história do automobilismo em geral, e da Formula 1 em particular.
Ars longa, vita brevis, Frank.