No passado dia 14, em Bruges, o belga
Jean-Pierre Van Rossem morreu ais 73 anos de idade vitimado por um cancro pulmonar. Van Rossem foi um pouco de tudo: licenciado em Economia, adorava as luzes da ribalta. Confessava-se marxista, mas chegou a ter dois aviões particulares e mais de 130 Ferraris, numa coleção pessoal que chegou a guardar num castelo. A sua fortuna chegou a valer quase mil milhões de dólares, e pelo meio criou um "supercomputador" do qual previa as subidas e quedas das várias Bolas um pouco por todo o mundo, e aparentemente dava lucros fabulosos a quem investisse.
No final, era mais um "esquema Ponzi"e foi denunciado por isso. E para escapar à prisão, criou um partido politico do qual entrou no Parlamento belga, mas não foi isso que o impediu de passar uma temporada na cadeia. Mas pelo meio, e graças ao seu esquema, a Moneytron, que adquiriu uma equipa de Formula 1, a Onyx e durante um ano, viveu as luzes da ribalta da categoria máxima do automobilismo, antes de vender tudo no inicio de 1990.
Nestes dias, a
Motorsport britânica decidiu recordar essa excêntrica figura - no mínimo - através do testemunho de um dos seus pilotos, o sueco
Stefan Johansson, pois foi com ele que conseguiram os únicos pontos da marca, incluindo o inesperado terceiro lugar no GP de Portugal de 1989, o último pódio da carreira do sueco.
"Ele chegou à equipa depois da minha assinatura", começou por dizer o sueco. “Minha primeira impressão foi, bem… mas à medida que nos conhecíamos melhor ao longo da temporada, percebi que sua imagem pública - algo de que ele estava muito ciente - era muito diferente do homem privado. Gostei dele e gostei da companhia dele. Ele era engraçado, gentil, gentil e cumpria suas promessas - embora às vezes ficássemos sentados em seu escritório por dias, recusando-se a sair até que o dinheiro fosse transferido", continuou.
A ideia inicial do salto da Onyx para a Formula 1 era para ser em 1988, e tinha a ver com o dinheiro da Marlboro e os serviços de Stefano Modena, o campeão da Formula 3000 em 1987, mas o acordo acabou por não acontecer. As coisas foram adiadas para o ano seguinte, com o projeto feito por Alan Jenkins, o ORE-1, mas o projeto acabou tão tarde que o carro ainda estava a ser montado em Rio de Janeiro, antes da primeira pré-qualificação do ano, numa temporada onde apareceram... seis equipas só para aquela fase do fim de semana.
"Isso era brutal", diz Johansson. "Você iria para a pista às 6 da manhã e não haveria nenhum bom dia; você só iria ouvir um rosnar dos mecânicos porque você só queria entrar no carro e fazê-lo.
“Havia doze carros perseguindo quatro lugares. Uma hora. Luz verde. Um tiro no escuro, quase. O menor problema nas últimas voltas, quando os melhores tempos eram definidos... acabou o final de semana. Ridículo."
“Era um grupo bastante robusto de carros, pilotos e equipas também. Muitas vezes, aqueles que conseguiram passar para a qualificação acabavam no meio da grelha. Talvez apenas a classificação para as 500 Milhas de Indianápolis tenha pressões semelhantes."
Contudo, Johansson sabia que o carro feito por Jenkins era bom, e no México, conseguiu a sua primeira qualificação real, para depois chegar ao quinto lugar em Paul Ricard, lugar onde Bertrand Gachot também qualificou o seu carro. Mas ambos não passaram para a qualificação em Silverstone e os Minardi conseguiram o milagre de chegarem no quinto e sexto postos, com Pierluigi Martini e Luis Perez-Sala. Resultado: mais seis meses de inferno pré-qualificativo.
E nessa altura, havia luta interna na equipa, com o choque de egos entre Earle e Van Rossem. Resultado: o inglês foi-se embora e Van Rossem, que pouco ou nada entendia da gestão de uma equipa, ficou com o comando. E foi nessa altura que dizia à imprensa que queria os motores Porsche V12, que metade do pelotão desejava, ameaçando ir embora caso não as tivesse. Como seria de esperar, o contrato aterrou na Arrows. E para além disso, foi responsável por algumas decisões bizarras, como por exemplo, o despedimento de Gachot antes do GP da Hungria devido a comentários que foram divulgados na imprensa.
Johansson disse depois que foi uma bela experiência, e o potencial para ser melhor existia, mas no final desse ano, Van Rossem vendeu a equipa para Peter Montverdi, porque a bolha da Moneytron tinha explodido.
"Fomos um grupo de gente que alcançou coisas notáveis com o orçamento disponível. Uma equipa novinha em folha, começando do zero, terminando no pódio e em décimo no campeonato foi um milagre. Nós tínhamos os ingredientes para sermos como a Jordan", começou por comentar.
“Ter sido contratado por Enzo Ferrari foi o ponto alto da minha carreira na Formula 1, obviamente, mas aquela temporada com o Onyx foi uma experiência incrível. Foi uma pena Van Rossem ter vendido. Eu não acho que ele estivesse perdendo o interesse. Foi mais que ele podia suportar.”, concluiu.
A Onyx foi vendida para o suíço Peter Montverdi e Johansson foi despedido depois do GP do Brasil de 1990, com um ORE-1 que não tinha sido desenvolvida desde o final da temporada anterior. Foi substituido por Gregor Foitek, mas não durou mais meia temporada, fechando antes do GP da Bélgica.
Quanto a Van Rossem, em 1991, a justiça belga o condenou a cinco anos de prisão por fraude fiscal. Tentou evitá-la, criando um partido politico de cariz populista, o ROSSEM, e conseguiu três deputados. Mas isso não evitou que entrasse na cadeia quando o mandato terminou, e assim ficando sem imunidade parlamentar.