sábado, 14 de agosto de 2010

O piloto do dia - Jackie Oliver

Foi um dos muitos pilotos britânicos dos anos 60 que passou por equipas de relevo como a Lotus e a BRM. Venceu corridas importantes na Endurance, ajudou a fundar duas equipas de Formula 1, primeiro a Shadow, e depois da Arrows. Com a primeira foi o último campeão da Can-Am na sua fase inicial, e a segunda para além de fundar, irá cuidar da equipa durante anos a fio, até ao final do século. No dia em que comemora o seu 68º aniversário natalicio, hoje falo-vos de Jackie Oliver.

Nascido em Romford a 14 de Agosto de 1942, Keith Jack Oliver começou a sua carreira em 1961 a bordo de um Mini, nas vários cmapeonatos locais de Turismo, a bordo destes carros, muito populares nessa altura. Pouco depois comprou um Lotus Elan e começou a correr nas corridas da sua categoria. Nessa altura correu em várias máquinas, desde o Marcos GT até ao ford mustang, sempre nas várias corridas de "Saloon Cars", muito populares nessa altura.

A sua rapidez inata fez com que ambicionasse mais altos vôos e em 1966, passou para a Formula 3, num Brabham privado. Deu nas vistas, não tanto pelos resultados, porque normalmente a sua máquina quebrava nas corridas, mas pela rapidez mostrada. E pouco depois, mostrava-se a Colin Chapman, que o contratou para correr na equipa oficial da Lotus, na Formula 3, onde num espaço de dois anos, chegaria à Formula 1.

A partir de 1967, Oliver corre na Formula 2 e na Endurance, onde dá nas vistas, mas o seu melhor resultado é ao volante de um Lotus 47, vencendo a BOAC 500, em Brands Hatch, ao lado de John Miles. Continuava a correr na formula 3, mas os resultados tardavam em aparecer. Mas mesmo assim, Colin Chapman mantinha a confiança e em 1968, iniciou o ano na Formula 2, correndo pela equipa oficial.Contudo, os acontecimentos precipitaram-se na equipa. Em Abril, Jim Clark estava morto e Chapman chama Oliver para o substituir na equipa de Formula 1, ao lado de Graham Hill. Iria ser o segundo piloto da equipa e iria se estrear na categoria máxima do automobilismo.

Só que este novo estatuto não lhe garante uma época completa na Formula 2, ao serviço da equipa oficial. Assim sendo, fala com um velho contacto seu, Tony Rudlin, que dirigia a Herts & Essex Aero Club, uma equipa feita à volta de um ex-piloto de motos, Roger Frogley. Ambos acordaram que iria correr sob as suas cores, com a Lotus a fornecer-lhe um chassis de Formula 2, mais assistência técnica e peças sobressalentes.

A temporada de Formula 2 foi interessante, mas não vitoriosa. No final da temporada, foi convidado a participar em quatro corridas da Temporada Argentina, uma série de competições na América do Sul, onde os pilotos europeus competiam contra os talentos locais. no final, classificou-se em terceiro lugar na competição.

Em paralelo, a sua vida na Formula 1 era dificil. Logo na sua quarta prova, em Rouen, palco do GP de França, tem um forte acidente em que sai ileso, mas que fica sem carro. Antes, no GP da Belgica, consegue os seus primeiros pontos da carreira, ao terminar o GP da Belgica na quinta posição. Chega a liderar o GP da Grã-Bretanha, em Brands Hatch, mas o seu motor rebenta e não consegue chegar ao fim. Consegue fazer a volta mais rápida no GP de Itália, mas no final, só acaba três das dez corridas em que participou. O seu melhor resultado acontece no México, onde acaba no terceiro lugar da classificação. Um bom resultado, mas insuficiente para ficar na equipa para a temporada de 1969.

Nessa altura, transferiu-se para a BRM, com a esperança de ter melhor material nas suas mãos. Contudo nesse ano, numa equipa com três pilotos (ele, John Surtees e o mexicano Pedro Rodriguez), havia querelas internas e um mau chassis. Resultado: Oliver só conseguiu acabar duas corridas, e o melhor foi um sexto lugar no GP do México, a última prova do campeonato.

Em compensação, a sua performence na Endurance foi excelente. Contratado pela John Wyer para dirigir um dos seus Ford GT40, começou o ano a vencer as 12 Horas de Sebring com o belga Jacky Ickx, e em Junho aconteceu o mesmo nas 24 horas de Le Mans, em conjunto com o piloto belga, depois de uma final emocionante com o Porsche 908 de Gerard Larrousse. Após 24 horas de corrida, a diferença entre ambos tinha sido de meros... 120 metros.

Em 1970, continua na BRM, agora com o mexicano Pedro Rodriguez, e enquanto que ele ganha em Spa-Francochamps e consegue 23 pontos, o máximo que Oliver consegue é um quinto lugar no GP da Austria, disputado no novo Osterreichring, em Zeltweg. Só terminou três das treze vezes em que disputou corridas naquela temporada, e as suas aspirações de fazer carreira na Formula 1 foram simplesmente destroçadas. E o melhor simbolo dessas aspirações destroçadas foi o acidente que teve nas voltas iniciais do GP de Espanha, quando bateu forte no Ferrari de Jacky Ickx e ambos pegarem fogo, saindo sem ferimentos de monta.

Em 1971 dedica-se a tempo inteiro à Can-Am, deixando de lado a Formula 1, do qual só fará três corridas pela McLaren, para substituir Peter Gethin. Corre numa nova equipa, a Shadow, fundada por Don Nichols, e faz carreira na categoria, primeiro contra os McLaren do neozelandês Dennis Hulme e o americano Peter Revson, e depois contra os Porsche guiados pelos americanos George Follmer e Mark Donohue. No final de 1972, época em que Oliver faz uma passagem fugaz pela BRM, guiando o carro no GP da Grã-Bretanha, a Shadow decide envolver-se na Formula 1 e o contrata, ao lado de Follmer.

O chassis DN-1 era um bom projecto, mas a mecânica falhava constantemente. Oliver voltava a viver o seu inferno, mas no confuso GP do Canadá, em Mosport, ele finta o destino e termina a corrida no terceiro lugar, conseguindo o seu segundo e último pódio da sua carreira. Em 1977 ainda faria mais um "one-off", no GP da Suécia, para substituir o novo recruta Riccardo Patrese, mas acaba no nono lugar.

A sua carreira na Formula 1: 51 Grandes Prémios em oito temporadas (1967-73, 1977) dois pódios, uma volta mais rápida, treze pontos. Vencedor das 24 Horas de Le Mans e das 12 Horas de Sebring em 1969, e das 24 Horas de Daytona em 1971.

A partir daqui, Oliver concentra-se na Can-Am, onde se torna campeão em 1974, numa época marcada pelo primeiro choque petrolífero, que causa o cancelamento de várias corridas devido à falta de gasolina. Depois disso passa para a Formula 5000, onde corre durante três temporadas, antes da tal última passagem pela Formula 1, em 1977. Por esta altura já fazia parte da estrutura desportiva da equipa, e ao longo desse ano, boa parte dos seus membros queriam retirar o controlo da sua equipa das mãos de Don Nichols.

Contudo, a trama foi descoberta e ele, em conjunto com Franco Ambrosio, Tony Southgate, David Wass e Alan Rees, sairam da equipa e fundaram a Arrows. Oliver ficara com a parte desportiva, e tinham trazido com eles a jovam esperança italiana Riccardo Patrese. Em pouco mais de dois anos, Oliver tomou conta da equipa, à medida que os restantes membros a abandonavam.

A equipa durou 25 temporadas (1978-2002) e nunca ganhou um Grande Prémio, mas sempre teve boas combinações e deu a primeira oportunidade a muitos bons pilotos. O belga Thierry Boutsen e o austriaco Gerhard Berger são dois dos pilotos que começaram ou tiveram os seus primeiros Grandes Prémios ao serviço da Arrows. Outros pilotos correram por lá, desde Patrese até Heinz-Harald Frentzen, passando por Derek Warwick, Eddie Cheever, Alan Jones, Marc Surer, Stefan Johansson, Michele Alboreto, Aguri Suzuki, Jos Verstappen, Gianni Morbidelli, Damon Hill, Mika Salo, entre outros. Brasileiros como Chico Serra, Christian Fittipaldi, Ricardo Rosset, Pedro Diniz e Enrique Bernoldi também passaram por lá.

Oliver aguentou as dificuldades, e por duas vezes na sua vida cedeu grande parte das suas acções. A primeira foi em 1990, quando a vendeu à japonesa Footwork, que permaneceu até 1993, com Jackie Oliver como director desportivo. Quando se retiraram, devido a problemas financeiros, Oliver voltou a ter o controlo da equipa, mas três anos mais tarde, as coisas estavam cada vez piores, e aceitou uma proposta de Tom Walkinshaw para que este comprasse grande parte das acções. Isso aconteceu no inicio de 1996, e Oliver ficou lá até ao final de 1999, quando vendeu o resto das acções e se retirou de cena, com uma confortável soma de dinheiro.

Fontes:

O despiste de Jim Clark: Treinos do GP de Portugal, 1960

Isto é raro: um despiste de Jim Clark.

Ao longo da sua carreira, que foi toda ela passada na Lotus, o piloto escocês raramente teve acidentes. O de Itália, em 1961, que matou Wolfgang Von Trips e mais 14 espectadores, e o seu acidente fatal, em Hockenheim, numa prova de Formula 2, a 7 de Abril de 1968, são dois dos mais conhecidos, mas para além desse, não se conhecem mais acidentes graves do piloto escocês. E nenhum desses dois acidentes que referi antes foram excessos do piloto: no primeiro caso foi um desentendimento, e no segundo, a causa foi um furo lento...

Aqui, a raridade maior, para além de ver um Clark zangado consigo mesmo e Colin Chapman entre os bombeiros e policias da cidade do Porto, a ajudar a tirar dali o modelo Lotus 18/21, é a causa: um excesso do piloto. Não foi um problema mecânico, não foi um factor externo, nada... a culpa foi de Jim Clark. E no instantâneo tirado por Bernard Cahier, a linguagem corporal de Clark diz tudo: ele é o responsável por destruir aquele veículo, já de si frágil, pelos acidentes graves que já tinha causado ao longo daquela época: Stirling Moss, Henry Taylor, Alan Stacey...

A foto foi tirada nos treinos, e Clark, para compensar, deu à Lotus, no dia seguinte, o terceiro lugar e um pódio. O seu primeiro pódio. O terceiro posto compensou o facto do "poleman", John Surtees, ter desistido com um radiador furado e nada terem feito para avitar o dominio dos Cooper da dupla vinda dos Antipodas: Jack Brabham e Bruce McLaren. Dois pilotos que ele viria a cruzar várias vezes ao longo da década que iria começar...

Quanto ao cenário, a Formula 1 só voltaria a Portugal dali a 24 anos. Outro cenário, outros carros, outros protagonistas. Nenhuma das duas personagens conhecidas estaria viva em 1984.

GP Memória - Portugal 1960

Tinha passado um mês desde a corrida britânica quando máquinas e pilotos rumavam à cidade do Porto para correrem o GP de Portugal, que naquele ano voltava ao circuito da Boavista, depois de um ano a correr na lisboeta Montes Claros, no Monsanto.

Mário de Araujo Cabral voltava a correr num Formula 1, desta vez num Cooper-Maserati da Scuderia Centro-Sud, ao lado do americano Masten Gregory. Era a primeira alteração na lista de inscritos para a grelha de partida na corrida portuguesa. A segunda grande alteração era o regresso de Stirling Moss à competição, no seu Lotus-Climax, da Rob Walker Racing, quase dois meses após o seu acidente quase fatal nos treinos para o GP da Belgica, em Spa-Francochamps. Estavam presentes dezasseis pilotos, representando as equipas de fábrica da Cooper, Lotus, Ferrari e BRM, e os privados da Rob Walker Racing, a Centro Sud e da BRP.

Na Cooper oficial estavam Jack Brabham e Bruce McLaren, enquanto que na BRP estavam Olivier Gendebien e Tony Brooks. A Ferrari inscrevia dois carros para o americano Phil Hill e o alemão Wolfgang Von Trips, enquanto que a BRM tinha três carros para o americano Dan Gurney, o britânico Graham Hill e o sueco Jo Bonnier. Na Lotus estavam, para além de Moss, que corria pela escocesa Rob Walker Racing, os carros oficiais de Jim Clark, Innes Ireland, Henry Taylor e John Surtees.

Na qualificação, a luta foi entre o BRM de Dan Gurney e o Lotus de John Surtees, mas no final foi Surtees que conseguiu dar à Lotus a sua primeira pole-position oficial da marca, batendo o americano por algumas décimas de segundo. Jack Brabham completava a primeira linha no terceiro posto. Na segunda linha estavam o Lotus de Stirling Moss e o segundo BRM de Graham Hill. Na terceira estava o Cooper de Bruce McLaren, o Lotus de Ireland e de Jim Clark, e a fechar o "top ten" estavam os Ferrari de Wolfgang Von Trips e de Phil Hill.

Ainda nos treinos, Henry Taylor tem um acidente que o fere num braço e o impede de correr na prova portuguesa. Quanto a Mário "Nicha" Cabral, é o último a partir para a corrida do dia seguinte.

Na partida, Brabham parte melhor e toma a liderança, mas pouco depois sai largo numa curva e Gurney fica com o comando, com o piloto australiano a cair para o sexto lugar. Atrás do americano estavam Moss, Surtees e Phil Hill. As coisas permaneceram assim até à décima volta, quando Gurney começou a ficar para trás devido a uma fuga de óleo, fazendo com que o comando caisse às mãos de Surtees, com Moss logo atrás, bem colado ao seu compatriota no Lotus oficial.

Contudo, pouco depois, Moss tem problemas devido às velas do seu carro, e também caiu na classificação. Mas para piorar as coisas, sofre um pião e para virar, guia alguns metros em sentido contrário. Com isso, so comissários não tiveram outro remédio senão desqualificá-lo.

Surtees continuava na frente, seguido de Brabham, que tinha recuperado e lutava pelo segundo posto com o Ferrari de Phil Hill, mas na volta 29, o americano despista-se e Brabham respira melhor. E mais acontecria na volta 36, quando Surtees desiste um um radiador furado, cujo óleo tinha vertido para os pedais, fazendo-o escorregar e perder o controlo do carro.

Com isto, Brabham era o lider e o seu companheiro Bruce era segundo, a caminho de mais uma dobradinha da marca de John Cooper. E foi assim que cruzaram a meta, no final da 55ª volta. A completrar o pódio estava um jovem de 24 anos chamado Jim Clark, que conseguira ser o melhor representante da Lotus naquele dia. O Ferrari de Wolfgang Von Trips, o Cooper-BRP de Tony Brooks e o Lotus de Innes Ireland fecharam os lugares pontuáveis.

Virtualmente, Jack Brabham tinha ganho o bicampeonato, dado o enorme avanço que tinha sobre o terceiro classificado, Innes Ireland, já que o segundo, Bruce McLaren, era o seu companheiro. E quando um mês depois, todas as equipas inglesas se recusam a correr na oval de Monza, afirmando que era demasiado perigosa para ser corrida, essa virtualidade se tinha transformado em realidade, pois só ficaria a faltar o GP dos Estados Unidos, em Riverside.

Fontes:

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Grand Prix (numero 53 - Grand Prix du Monaco, 3)

10 de Abril de 1970, dia da corrida.

Alexandre de Monforte encosta o seu carro à boxe, feliz por ter levado o seu carro até ao fim sem problemas de maior. As pessoas aplaudem o vencedor, que naquele momento sai da espécie de escudo montado pelos jornalistas e fotógrafos, escoltado por um oficial do Automobile Club du Monaco, sobe as escadas para ter junto do Principe Ranier e da sua esposa, a ex-Grace Kelly. Pierre Charles de Beaufort, com a sua barba aparada e o seu penteado aprumado, já que teve tempo para pegar no pente que tinha no seu bolso, subia as escadas para receber o troféu de campeão e a coroa de louros.

Recebeu os cumprimentos dos principes e depois desceu alguns degraus para ficar em sentido e ouvir os primeiros acordes da Marselhesa. Pierre de Beaufort estava satisfeito, pois finalmente tinha alcançado o objectivo de ganhar aqui, no Monaco. Era o primeiro francês a fazê-lo, desde Maurice Trintignant, em 1958. Aliás, o velho Trintignant lá estava, a assistir e certamente a aplaudir os feitos de alguém que finalmente poderia ser um digno sucessor seu e alguém do qual a França se poderia orgulhar. E também conseguira algo inédito: um francês, num carro francês e com motor francês, tinha ganho no Mónaco.

Mas o filme da corrida envolveu um pouco de tudo, até uma reviravolta digna de um filme de Alfred Hitchcock. E o piloto que subia ao pódio para receber o troféu do segundo classificado, o alemão Pieter Reinhardt, estava de cara fechada, e sorrindo timidamente quando recebeu as breves palavras de alento por parte do Principe Ranier. Ao contrário do terceiro classificado, o mexicano Teddy Solana...

- Parabéns. Mais um resultado nos pontos.
- Obrigado, Pete. Mas acho que tive sorte no meio disto tudo. Sem problemas e o pódio era meu.
- De facto... teres um furo e acabres em quarto lugar, e um feito.
- Ainda não te disseram, querido? perguntou Pam.
- O quê?
- Fizeste a volta mais rápida, respondeu Pete.
- Hã? A sério? Nesta carroça datada?
- Incrivel, mas real. Foi mais 0,8 segundos do segundo classificado, mas conseguiste.
- Também, com a luta que tive com o Van Diemen...
- Confesso que fiquei impressionado com o teu estilo de condução. Não é qualquer um que consegue chatear um belga e ainda ter força para ir atrás do Teddy. Tiraste cinco segundos em duas voltas e acabaste colado a ele.
- Tive sorte, apenas. Pete, podemos falar?
- Claro, respondeu.

Ambos foram para um canto e Alex perguntou:

- Quanto é que queres por um dos teus chassis?
- Como?
- Quero comprar um dos teus Apollo.
- Bom... oito mil libras.
- Quanto é que tu abaterias por devolver o Eagle?
- Talvez uns dois mil, 2500... porquê?
- Pete... tenho consciência dos meus limites. Este carro já deu o que tinha a dar. Ali na pista, eu dei tudo, numa máquina que a afinei até ao limite. Tirei tudo de mim e dele, mas francamente... a minha sorte com este carro, para este ano, acabou. E vou provar isso em Spa-Francochamps. Logo, o que queria era ter um dos teus chassis em Zandvoort, pelo menos. Preciso de me manter competitivo, Pete. Tenho seis pontos neste momento, algo que muitos dos de fábrica. E acho que começam a olhar para mim com outros olhos.
- Isso já notei. Vou pensar nisso com mais calma...

Ambos foram interrompidos por John O'Hara. Ar algo triste, mas ao menos tinha cumprido a sua missão.

- Então, grande reviravolta, hein?
- Ainda não estou em mim, rapaz... nem no meu tempo de piloto me tinha acontecido uma coisa destas. É mesmo sinal de que, se queres ganhar, tens de primeiro cortar a meta.
- Mas então, o que aconteceu?
- Ainda não sabes, míudo? O Reinhardt perdeu uma corrida na última curva!
- Hã? Mas como?
- Não travou onde devia. E o Beaufort passou-o, afirmou Pete.
- A sério?
- Logo à noite devem mostrar na televisão. Mas é verdade: um duelo entre os dois que acaba na Curva do Gasómetro, onde ele sai de frente e dá a liderança ao Beaufort. Ele só liderou 125 metros em oitenta voltas, e é o vencedor. Incrível!

De facto, era mesmo incrivel. A corrida começou com Beaufort a largar mal e a ser superado por O'Hara, Reinhardt e Monforte. Na volta seguinte, livra-se do "rookie" sildavo e parte em perseguição a Reinhardt, que tinha sido superado por O'Hara na Curva do Gasómetro. O irlandês tratou de se afastar do pelotão, mas na volta 28, trava tarde no Mirabeau e sai em frente. Volta à corrida, atrás de Reinhardt e Beaufort, mas não sabia era que os seus travões estavam a cader. Duas voltas depois, não consegue travar a tempo na Ste. Devôte e bate nos rails de protecção, entortando o eixo traseiro e desistindo logo de seguida.

Entretanto, Monforte era terceiro classificado, atrás de um pelotão que faziua tudo para o apanhar. Primeiro o Ferrari de Patrick Van Diemen, depois para o Apollo de Teddy Solana, e depois para o BRM de Bob Turner. Monforte dava tudo por tudo pelo carro, e os seus adversários se viam aflitos para o alcançar, quanto mais o ultrapassar. E então, na volta 51, Monforte tem um furo lento, na chicane do porto, e assim que notou que o carro estava desiquilibrado, rumou à boxe, apanhando todos de surpresa.

- O que foi?
- Tenho um furo.
- Onde?
- Roda traseira direita. Tenho a certeza.
- Bateste em alguma coisa?
- Não. Mas mudem-me a roda, rápido!

Os mecânicos fizeram o que podiam, mas perderam mais de 40 segundos a colocar uma roda nova. Quando assim o fizeram, Monforte era oitavo, fora dos pontos, e com menos uma volta do que a dupla que se degladiava na frente: Reinhardt vs Beaufort.

Q
uando Monforte voltou á pista, começou a guiar como um doido, tentando recuperar o tempo perdido. Quando Pam começou a monitorizar os tempos dele, ficou surpresa. Não com o ritmo imposto ou o tempo em si, mas pela sua consistência. Por aquela altura, os da frente faziam 26,5, 26,8. Monforte fazia voltas seguidas a 27,0, 26,9. E foi assim durante mais de vinte voltas: a dar o melhor, numa máquina totalmente datada, mas incrivelmente afinada.

Apanhou os seus rivais em relativamente pouco tempo, e esperou pelos seus azares. Primeiro, Turner rebentou o motor na volta 62, depois de ter ultrapassado Bernardini na volta 55. Foi atrás de Van Diemen durante voltas a fio, e este andava claramente a bloqueá-lo nas voltas anteriores à sua ultrapassagem, na volta 75. E na volta seguinte, faz a sua primeira volta mais rápida: 1.25,3.

Na sua frente, Reinhardt e Beaufort lutavam pelo comando. Ambos davam tudo por tudo a cada curva, a cada canto. Já eram máquinas cansadas de tanto curvar, de tantas marchas trocadas... mas continuavam. Mais atrás, Monforte andava no limite, como que a querer mostrar alguma coisa. Na realidade, tentava o impossivel: apanhar Teddy Solana. Quando começou a ver a placa de que estava a meros sete segundos, a cinco voltas do fim, imprimiu um ritmo alucinante para o tentar apanhar. Em duas voltas, conseguira tirar meros dois segundos por volta a um mexicano muito mais lento do que ele.

No final, parecia que estava na sua própria batalha, querendo provar alguma coisa. Talvez que era piloto e que não o esquecessem. Pete ficou aflito, pois o queria que ele abrandasse e segurasse os três pontos. Na volta 79, faz 1.24,7, melhor do que o 1.25,0 de Reinhardt e 1.25,1 de Beaufort.

E nesse inicio de volta, Reinhardt é o lider, com Beaufort a pressioná-lo. Mas as suas máquinas estão no limite. Na subida do Casino, o francês trava tarde demais e quase sai de pista, dando uma vantagem com mais de setenta metros sobre o alemão. Parecia que tinha tudo acabado. Mas na descida do Mirabeau, os travões de Reinhardt começavam a ceder. Estes respondem mal e quase sai de pista. Na realidade, eram dois pilotos no limite dos seus carros.

Beaufort tenta passá-lo, mas Reinhardt fecha-lhe a porta e continua na frente no Gancho. Na Viragem do Portier, ambos os carros travam cuidadosamente, para não os desgastarem ainda mais, e aceleram para o Túnel. Ambos estão colados quando fazem a chicane do Porto. Beaufort trava mais cedo para se precaver de alguma falha, e dá espaço a Reinhardt. E se calhar foi isso que o salvou de uma derrota, pois a seguir, na Curva do Gasómetro, Reinhardt trava a fundo... e o carro não respondeu.

Ele segue em frente, vira o volante todo à direita e as rodas reagem, mas o piso, que já estava escorregadio, não colabora. O carro vira, mas tarde, e bate de lado nos fardos de palha. Beaufort assiste à cena toda na pista e trava cedo, tentando controlar a euforia por ver o seu rival encostado. Friamente, fez a curva enquanto este estava desesperado para sair dali. Demorou 25 segundos para o fazer, mas conseguiu. E por essa altura, já Beaufort estava rodeado pelos seus mecânicos, o seu director desportivo e os reporteres franceses rodeavam-no, o vencedor inesperado do GP do Mónaco de 1970.

Mais atrás, Pieter Reinhardt parava o carro depois da bandeira de xadrez. Mudo e quedo no seu carro, olhava para a multidão que cercava o seu rival. Estava zangado. Zangado consigo mesmo por ter deixado fugir esta oportunidade de vitória, desconhecendo como é que todos iriam reagir, a começar pelo seu chefe. Bruce foi o primeiro a aproximar-se e a estender a sua mão para dizer: "Well Done. Conseguiste seis pontos, são importantes no campeonato, Old boy. E temos máquina!"

Atrás dos quatro primeiros, Beaufort, Reinhardt, Solana e Monforte, acabavam o Ferrari de Patrick Van Diemen e o McLaren de Peter Revson, que chegaria à frente do último classificado, a cinco voltas do vencedor, o outro McLaren-Lamborghini de John Hogarth. Pelos vistos, era uma máquina fiável, mas lenta, e faltava saber como é que se iria comportar num circuito de ponta como seria Spa-Francochamps. Era uma grande incógnita que só dali a três semanas é que se iria saber. E tal como nas duas provas anteriores, iria haver um limite de inscritos, embora nas Ardenas seria de dezoito.

Enquanto todos falavam, discutiam, celebravam e amargavam, Pieter continuava a estar fora dali. Ainda pensava como é que tinha deixado escapar aquela vitória daquela forma. Deveria ter sido ele a recber a taça de vencedor e o hino a tocar deveria ser o alemão e não o francês. Estava triste, e foi com um sorriso triste que recebeu os parabéns pela corrida bem disputada e pelo segundo lugar. Um segundo lugar bem amargurado.

Aos poucos, passaria do choque para a resignação. Foi vê-lo e deu abraço, e ao afastar, disse a Bruce:

- Foi bom, mas neste momento o que quero é embebedar-me para tentar esquecer esta tarde.

(continua)

GP Memória - Hungria 1995

Após o triunfo de Michael Schumacher na Alemanha, a situação na Williams era de quase desesperante. A diferença entre Schumacher e Damon Hill era de 21 pontos (35 contra 56), e com mais de metade do campeonato, essa diferença dava ao piloto alemão uma quase certeza de que o bicampeonato seria seu.

À chegada do pelotão da Formula 1 a paragens hungaras, havia mudanças no pelotão. Martin Brundle estava de volta à Ligier, substituindo o japonês Aguri Suzuki, enquanto que na Minardi, o italiano Pierluigi Martini dava o lugar ao português Pedro Lamy, que regressava à Formula 1 após um ano e meio de ausência, recuperado do horrível acidente em Silverstone, em que sofreu ferimentos graves nas pernas quando testava o seu Lotus.

Na qualificação, os Williams foram os melhores, monopolizando a primeira fila, onde Damon Hill foi melhor do que David Coulthard, relegando Michael Schumacher para o terceiro lugar da grelha. Uma segunda fila que ia partilhar com o Ferrari de Gerhard Berger. Mika Hakkinen era quinto, no seu McLaren-Mercedes, superando o segundo Ferrari de Jean Alesi. O Jordan de Eddie Irvine era sétimo da grelha, seguido pelo Ligier-Mugen Honda do regressado Brundle, do segundo Benetton de Johnny Herbert e do segundo Ligier de Olivier Panis.

Nesta sua corrida de regresso, Lamy ficou com o 15º posto da grelha, inferior a Luca Badoer, seu novo companheiro de equipa, mas o importante é que estava em forma e capaz de acompanhar o pelotão.

O tempo estava otimo no dia da corrida, e quando esta começou, os Williams partiram na frente, com Hill à frente de Coulthard, que servia de tampão para impedir Schumacher de o ultrapassar. Mas o alemão pressionou o escocês até que este cometeu um erro e ficou com o segundo lugar, partindo em perseguição do lider.

Na 13ª volta, o Arrows de Taki Inoue fica parado por causa do rebentamento do motor. Este saiu do carro com um extintor para apagar o fogo, mas o azarado japonês não viu a chegada de uma ambulância, guiada por um afoito comissário de serviço. Resultado: piloto atropelado, mas sem consequências de maior. Uma situação dramática com final cómico...

A corrida prosseguiu com Hill em primeiro e Schumacher em segundo, mas quando ambos pararam para reabastecer, as coisas no lado do piloto alemão andaram más, pois o reabastecimento foi catastrófico. Quando acabou, voltou à pista com mais de meio minuto de diferença sobre o britânico.

No meio do pelotão, Hakkinen já tinha desistido na terceira volta com o seu motor Mercedes rebentado, mas a luta era dura e renhida, graças à estreiteza da pista hungara e da sua incapacidade de ultrapassar: Ferrari, Jordan, Ligier, o Benetton de Johnny Herbert e o Sauber de Heinz-Harald Frentzen. A corrida tratou de seleccionar os candidatos: Alesi já tinha desistido com problemas de travões, na volta 42, depois foi Blundell, na volta 54, com uma fuga de combustível, e treze voltas depois foi a vez do motor Mugen Honda de Brundle rebentar.

Mas o maior drama foi nas voltas finais. Primeiro, na volta 77, quando o sistema elétrónico do motor de Michael Schumacher desligou-se, deixando o alemão apeado e com a certeza de que Damon Hill iria conseguir dez pontos. E na última volta, Rubens Barrichello era terceiro classificado e a caminho de um pódio, quando o motor rebenta na última curva. De um pódio certo, o brasileiro acabou fora dos pontos em meros 400 metros... com toda a equipa no muro das boxes, pronta a comemorar. Sete voltas antes, o seu companheiro Eddie Irvine ficara pelo caminho com a embraiagem partida.

No final, Damon Hill foi o vencedor, com David Coulthard a assegurar a dobradinha para a Williams. Gerhard Berger subia ao pódio num terceiro lugar caído do céu, enquanto que nos restantes lugares pontuáveis ficavam o Benetton-Renault de Johhny Herbert, o Sauber-Cosworth de Heinz-Harald Frentzen e o Ligier-Mugen Honda de Olivier Panis.

Fontes:

http://www.grandprix.com/gpe/rr574.html
http://en.wikipedia.org/wiki/1995_Hungarian_Grand_Prix

Noticias: pilotos da IndyCar criam sua própria entidade

Na Formula 1 existe há mais de quarenta anos o Grand Prix Drivers Association (GPDA), que serve para defender os interesses dos pilotos, mas nos Estados Unidos, até aos dias de hoje algo semelhante não existia. Contudo, isso vai mudar. A entidade, que ainda não tem nome oficial, foi constituída esta semana e será liderada pelo escocês Dario Franchitti, que terá como adjuntos o brasileiro Tony Kanaan e o inglês Justin Wilson, e terá como objectivos dialogar com as entidades oficiais com o objectivo de melhorar a categoria.

"Muitos de nós sentam e conversam, mas ter todos numa mesma sala é a nossa meta. Vamos ouvir a opinião de todos sobre a segurança e sobre as coisas que vemos na pista e os outros não vêem. É um novo tempo que está a vir", disse Franchitti, em declarações captadas pelo sitio brasileiro Tazio.

O presidente da IndyCar Racing, Brian Barnhart, ficou satisfeito com a iniciativa dos pilotos: "Sempre tentei ser acessível para qualquer piloto por qualquer motivo que eles tivessem. Tudo que puder ser feito de uma forma mais organizada, vou apoiar.", afirmou.

O acidente fatal de Manfred Winkelhock



Não direi que se trata de um achado, mas ele existe: as imagens do acidente fatal de Manfred Winkelhock, no circuito canadiano de Mosport, a 11 de Agosto de 1985, durante uma prova do Mundial de Sport-Protótipos, num Porsche 962 da Kremer Racing.

O acidente ocorreu na Curva 2, poucos minutos depois de ter rendido o suiço Marc Surer, curiosamente um bom amigo dos tempos da Junior Team da BMW nos anos 70, em conjunto com Eddie Cheever e Jan Lammers, creio eu, que correram na DRM, a antecessora da DTM.

Nunca se entendeu muito bem o que causou o acidente, mas falou-se muito numa falha de travões do seu Porsche 962, que o fez ir direito ao muro, de frente, causando ferimentos graves na cabeça e na perna direita. A corrida não foi interrompida, mas esteve neutralizada duranta mais de vinte voltas para que tirassem Winkelhock dos destroços do seu carro. Foi levado para Toronto, e recebeu cirugia de emergência, mas acabou por morrer na manhã do dia 12, catorze horas depois do acidente e sem voltar à consciência.

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Grand Prix (numero 52 - Grand Prix du Monaco, 2)

Monaco, 9 de Maio de 1970.

A qualificação iria começar dentro de alguns minutos. O dia estava encoberto, mas não iria chover, e os pilotos e carros procuravam encontrar a melhor afinação para enfrentar o circuito em seco, algo que tentaram fazer nos treinos livres. Alguns conseguiram logo, mas outros ainda procuravam, e isso era importante, pois tinham somente sessenta minutos para conseguir um dos dezasseis lugares mágicos. E aqui, tal como tinha acontecido em Jarama, estavam vinte pilotos inscritos.

John Hogarth via-se aflito com o seu motor flat-12. A falta de potência não era problema por aqui, num circuito sinuoso e lento como as ruas do principado. Mas os pequenos problemas deste motor, que ainda sofria com a sua juventude e o seu peso (muito mais pesado do que um V8) faziam com que em média, perdesse entre dois e três segundos em recta. E isso o colocava num lugar extremamente perigoso em termos de grelha, algo que mesmo a sua experiência o impedia de tirar o melhor do conjunto.

Cavenaghi e McLaren estavam a conversar sobre o motor. O italo-argentino gostava de ouvir Bruce, e começava a questionar a utilidade de tal motor, e toda a politica envolvida. Questionava, por exemplo, a razão porque aquele motor tinha sido feito fora da orbita de Sant'Agata Bolognese, numa empresa que trabalhava para um dos seus rivais, a Alfa Romeo. E pensava nisso porque tinha descoberto que o V12 que tinham na companhia, feito há cinco anos por Bizzarini, para competir com o "nemesis" de Maranello, era bastante melhor do que o flat-12, apesar de ser um 3.5 litros. E ele discutia com Bruce sobre a necessidade de um "plano B".

- Bruce, temo que tenham feito um mau acordo.
- Ora, mas porquê? Ainda agora começamos...
- Nada tenho contra o projecto em si, mas acho que fomos apanhados no meio de uma tempestade.
- Em que sentido?
- Conheces a relutância do Signore Ferruchio em competir na Formula 1, e o que ele fez para que isto prosseguisse, mas acho que isto foi outro erro.
- O flat-12?
- Creio que sim. Muito pesado e pouco potente.
- Hmmm... Mesmo assim, temos de dar uma chance, certo?
- Claro, mas temo que tudo isto vá pelo cano abaixo.
- Qual é a tua ideia?
- A fábrica tem um V12, e acho que deveriamos aproveitar. É de 3.5 litros, mas acho que se pode reduzir para 3 litros, e aumentar para os 5 litros da Can-Am, se quiseres.
- Para a Can-Am não vale a pena. Para a Interseries, a história é outra. Eles vão ter novo regulamento em 72, e eu quero estar lá. Para mim, acho bom que desenvolvas os carros para a Europa. Os Estados Unidos são outro território. Talvez para mais tarde.
- Vou tentar convencê-lo a mudar...
- Tenho uma ideia melhor. Faz o teu trabalho de casa. Já vi que és bom, se mostrares algo como facto consumado aos patrões, eu apoio-te no teu projecto, serve?

Cavenaghi virou-se para Bruce e disse:

- Claro, aceito perfeitamente.

Os dois apertaram a mão e o neozelandês foi para o seu carro. O homem que controlava tudo, Teddy Mayer, tinha ido ter com ele para informar que o treino tinha acabado de começar. Cavenaghi ficou no seu lugar e ficou a pensar sobre a melhor maneira de construir um motor V12 capaz de debitar tanto ou melhor do que os V8 da Cosworth ou os V12 da sua arqui-rival.

--- XXX ---

Noutra boxe, na Apollo, John O'Hara já fazia a sua primeira volta lançada na pista, e tivera o BRM de Turner e o Jordan de Cervantes à sua frente, em voltas de aquecimento, prejudicando a sua primeira tentativa de marcar um tempo decente. Para Pete , era uma tarefa dificil de coordenar, pois tinha dois carros oficiais e um oficioso, e não queria que existisse mais do que um carro a circular, para que todos tivessem uma chance de marcar um tempo decente, sem filas.

- Como anda o teu irmão?
- Veremos. Não tarda ele passa aqui.

Poucos instantes depois, o carro de O'Hara passa pela meta e Sinead para o cronómetro. Este marcava 1.26,3, um bom resultado, colocando-o no segundo lugar da tabela, apenas atrás do Ferrari de Van Diemen. Contudo, logo a seguir passa o Jordan de Reinhardt e marca 1.25,9 segundos, fazendo com que este seja o melhor tempo da sessão. Logo a seguir, aparece Beaufort e marca 1.28,8 e é ele que lidera a tabela de tempos. Mas O'Hara aproveita a volta para tentar de novo e marca 1.28,5 e é o primeiro homem naquele momento. Faz uma volta de desaceleração e volta às boxes, ao mesmo tempo que Teddy sai para tentar a sua sorte.

- E então?
- Tive sorte, não cruzei com ninguém, disse John.
- Estás a ir bem, mano. É o que interessa, respondeu uma Sinead sorridente.
- Ainda nem chagamos aos vinte minutos, retorquiu John.
- Ainda falta o Alex marcar tempo. Espero que aproveite, afirmou um pensativo Pete.

Já estavam muitos carros na pista, tentando marcar um tempo. Alexandre esperava, concentrado, no seu carro, para que um dos mecânicos lhe desse um sinal para que ele pudesse tentar a sua sorte no traiçoeiro circuito monegasco, onde um azar significa um carro danificado e o regresso às boxes a pé. Com esse tempo a passar, inevitavelmente ele estava no final da tabela de tempos. Para conseguir um tempo nos dezasseis primeiros, tem de fazer 1.28,5, tempo feito por Manfred Linzmayer, no seu Jordan privado. Algo que não era fácil, pois ainda nos não-qualificados andavam os Jordan-Temple de Antti Kalhola e Brian Hocking. E no outro lado estavam o Jordan de Cervantes e o McLaren-Lamborghini de John Hogarth.

Passava quase meia hora desde que começou o treino quando as rodas começaram a girar. Alexandre lançou-se à pista, numa primeira volta em ritmo de passeio, sem ninguém a incomodar nem a prejudicar. Depois da chicane do Porto, Alexandre começou a acelerar, antes de chegar à Curva do Gasómetro. A partir dali, começou a dar tudo por tudo, acelerando a fundo até Ste. Devôte, subindo até ao Casino, onde se faz uma curva à direita, descendo a Mirabeau, até nova curva à direita, em direção ao emblemático gancho, no lugar onde era a Estação e agora vai ser transformado num Hotel. Depois, nova curva à direita, onde acelera a fundo, passando pelo tunel e descando até à zona do porto, onde tem de encarar uma chicane, feita em terceira.

Até agora, não apareceram carros alguns. Trava na chicane do Gasómetro e lança-se para a meta, dando o seu máximo, e marca um tempo, sem parar, rumo a nova volta.

- Quanto fez, Sinead?
- 26,3.
- Tás a gozar.
- Não, não me enganei. Ele fez 1.26,3.
- Isto significa que está à frente do Teddy. Ele tem 26,5.
- E acho que vem para mais. Está alguém à sua frente? pergunta Pam.
- Não creio, querida. Não vi nenhum carro a passar ou sair antes dele.

Pete ficou pensativo, na expectativa de ver no que ele ia fazer. Entretanto, passavam mais dois carros, um Temple e um BRM, talvez o de Turner, e depois via um grande espaço, até que ouviu o ruido do carro vindo do Porto. Viu-o a travar para abordar a Curva do Gasómetro, fê-lo quase em "slide" e acelerou rumo à meta, dando o máximo. Ao passar, Pete perguntou:

- Quanto?

Houve um momento de silêncio. Depois, ouve-se o gaguejar de Sinead.

- Eu... eu... acho que está errado.
- Como assim?
- Se isto estiver certo, ele fez 1.25,8 segundos. Igual ao John, numa máquina com dois anos.

Pete estava espantado. Parecia que num circuito em particular, um jovem piloto, ainda no seu segundo Grande Prémio da sua carreira, estava a fazer o seu melhor numa máquina datada, que em principio teria dificuldades num circuito para marcar tempo, pois os carros da frente tinham máquinas muito mais actualizadas. Se ele fazia isto, o que faria num carro novo?

Alexandre regressava à boxe, debaixo dos aplausos da equipa. Ao ver o panorama no seu cockpit, ele sorriu e saiu da carro.

- Pelos vistos, sai-me bem.
- Ah sim. Já conseguiste o teu lugar para amanhã.
- Otimo, é isso que me interessa. E os outros?
- O John vai sair, o Teddy está à espera.
- Bom, e o meu tempo? Não vi nada...
- Pois...
- Estiveste bem. Estás bem dentro dos qualificados.
- Ah é? em que lugar.
- Neste momento... és segundo classificado.

Alexandre ficou incrédulo por um momento e depois começou a rir-se. Ergueu as mãos em sinal de vitória e disse, feliz:

- Vou poupar o carro para amanhã. Agora cabe aos teus rapazes melhorarem. E o 16º, tem quanto?
- 1.28,3.
- Melhor ainda. Volto para o hotel e vou tirar uma sesta, hehe! Aliás, até tiro uma sesta aqui.

Alexandre foi buscar uma cadeira tipo "chaise longue" e deitou-se nas boxes. Tinha um sorriso de orelha a orelha e colocara as mãos atrás da cabeça, assistindo triunfalmente ao resto do treino.

Como era óbvio, o seu tempo foi superado, mas não tão facilmente como julgava. O'Hara baixaria para o 25,5, mas não seria pole-position. O melhor seria Pierre de Beaufort, com 1.24,8, com O'Hara no terceiro lugar, depois de Pieter Reinhardt, no seu Jordan, fazer 1.25,0. Alexandre de Monforte conseguia um inédito quarto posto, à frente de grande parte do pelotão oficial. Iria ter a seu lado o BRM de Bob Turner, que tinha ganho por cinco vezes o GP do Mónaco, e mesmo aos 42 anos, dava um ar da sua graça.

Quanto aos mais lentos, os Jordan do velho Temple lutaram contra o segundo BRM de Gustafsson, o terceiro Jordan de Cervantes e o McLaren-Lamborghini de Hogarth. O Jordan de Linzmayer era o 13º da grelha e já não o apanhavam. Depois, Kahola punha mais tranquilo o velho Temple, e no 15º posto ficava o carro do conde espanhol. Restava um posto e no ultimo minuto, os dois candidatos, mais um dos não-qualificados, o suiço Perrot, tentavam a sua sorte.

Separados por meio circuito, Hogarth dava o seu melhor para conseguir o lugar, e a sua veterania veio ao de cima, ao conseguir fazer as coisas bem e a marcar um tempo um segundo mais rápido do que o pretendido, e até a ficar acima de Cervantes a Kahola. Assim, Perrot e Hocking tentavam a sua sorte, mas quando o sul-africano faz a Mirabeau... sai de frente, sem que o voltante respondesse, e ficou por lá. Ele ficou parado por um momento, tirou o volante e saiu lentamente do carro. Pulou o guard-rail e caminhou lentamente para as boxes. O seu treino terminara, e não conseguira a qualificação.

(continua)

Manfred Winkelhock

Quando se anunciou a entrada de Marcus Winkelhock na Spyker, em Julho de 2007, aproveitei a oportunidade de elaborar e publicar uma biografia do seu pai, Manfred, um dos alemães que correu na Formula 1 nos anos 80, altura em que não eram muitos e não tinham o impacto que têm agora. De facto, a Alemanha teve construtoras e escuderias na Formula 1, e Winkelhock correu numa, a ATS do irascivel Gunther Schmid, mas pilotos de jeito, tirando Jochen Mass e Rolf Stommelen, o período entre 1961, com Wolfgang Von Trips e 1991, ano em que Michael Schumacher iniciou a sua carreira, foi um deserto.

Mesmo no seu tempo, Winkelhock tinha a sombra de um seu conterrâneo mais rápido, Stefan Bellof, do qual se detinham imensas esperanças, dada a sua velocidade e uma boa dose de loucura. O que não se sabia, quando Manfred morreu, era que Stefan Bellof iria ter pouco mais de quinze dias de vida...

Muitos tem uma boa impressão de Manfred. Uma personalidade divertida, da mesma estirpe de Hans-Joachim Stuck, um verdadeiro "palhaço". Uma das fotos mas famosas dele é do inicio da carreira na Formula 1, quando se mete com uma das meninas da placa nos momentos que antecedem o GP do Brasil de 1982, corrida essa que termina no quinto lugar, a unca vez que conseguiu pontos. Ele estava apenas na sua terceira corrida da sua carreira, depois de um começo no GP de Itália de 1980, a bordo de um Arrows, substituindo o seu compatriota Jochen Mass.

Essa oportunidade acontecera semanas depois do seu maior susto da vida, em Nurburgring. Em 1980, mesmo depois da Formula 1 ter rumado a Hockenheim, o Nordschleife, vulgo o "Inferno Verde" era usado pelas utras categorias. Formula 2, Mundial de Sport-Protótipos, o DRM - antecessor do DTM - usavam frequentemente o mitico circuito de 22 quilómetros e mais de uma centena de curvas. E aqueles carros já não eram como os dos anos 60, já tinham soluções aerodinâmicas como o efeito-solo. E no Flugplatz (nome tão apropriado, diga-se...) Winkelhock deu um "loop" completo, saindo do carro a sacudir o pó, depois de ter apanhado o susto da vida dele...

Para além das passagens pela ATS, correu na Brabham e RAM, testou máquinas como um Toleman e sabendo que as suas oportunidades na Formula 1 não seriam muitas, decidiu fazer "perninhas" no Mundial de Sport-Protótipos, a bordo de um Porsche 962 da Kremer Racing.

Ainda bem que todos se lembram de assinalar os 25 anos da morte de Manfred. Uma pessoa cuja carreira e vida acabou na curva dois do circuito de Mosport, quando foi vitima de um furo, ou de uma falha nos travões, algo que nunca foi totalmente esclarecido. Ainda por cima, entrou no carro, um Porsche 962, pouco minutos depois de lhe ter sido entregue pelo seu companheiro, o suiço Marc Surer. Semanas depois, com o acidente mortal de Beloff e um outro acidente que causou lesões a Jonathan Palmer, as equipas de Formula 1 decidiram meter clausulas exclusivas que os impediam de correr noutras categorias.

Para nós, os que gostamos, percebemos e não deixamos passar estas datas em claro, estas são boas ocasiões para não deixarmos cair no esquecimento estes homens que pagaram o preço mais alto pela modalidade que tanto amavam. É o mínimo que podemos fazer.

GP Memória - Hungria 1990

Depois de duas semanas, a Formula 1 voltava à acção no tortuoso circuito de Hungaroring, numa Hungria que completara a sua revolução democrática e a consequente abertura ao capitalismo. A Cortina de Ferro tinha sido cortada, todos os países do Leste eram democracias, a Alemanha se preparava para a reunificação e a União Soviética ainda vivia, mas dentro dela se agitavam os vários povos com desejo de independência, a começar pelos países bálticos.

No paddock, a Camel anunciava que a partir de 1991 iriam apoiar a Williams e a Benetton, deixando de patrocinar a Lotus, que estava a ter uma temporada decepcionante. Entretanto, Peter Wright e Peter Collins iriam ser os managers da equipa, com o objectivo de encontrar apoios que substituíam os que iam perder com a saída desta tabaqueira.

Entretanto, outra equipa estava em maus lençóis. A Monteverdi-Onyx funcionava só com arames e as coisas prometiam ficar ainda piores, após um forte acidente de Gregor Foitek durante os treinos de Sábado, devido a uma falha na suspensão. O suíço, cujo pai era um dos proprietários da equipa, afirmou que já tinha passado pelo suficiente e abandonou a equipa naquele mesmo fim de semana. Desnecessário seria dizer que ambos os carros não se qualificaram, mas tinham passado a pré-qualificação no dia anterior, em conjunto com os AGS de Yannick Dalmas e Gabriele Tarquini.

Na qualificação propriamente dita, os melhores foram os Williams-Renault de Thierry Boutsen e Riccardo Patrese. O belga tinha feito a sua primeira pole-position da sua carreira e a primeira de um belga desde 1972, com Jackie Ickx, em Monza. Na segunda fila estavam os McLaren de Gerhard Berger, que tinha superado o seu companheiro, Ayrton Senna. Na terceira fila ficaram o Ferrari de Nigel Mansell e o Tyrrell de Jean Alesi, enquanto que Alessandro Nannini era o sétimo da grelha, à frente do Ferrari de Alain Prost. A fechar o "top ten" estavam o segundo Benetton de Nelson Piquet e o Dallara-Ford de Andrea de Cesaris.

Entre os não qualificados, para além dos dois Onyx, ficavam o AGS de Yannick Dalmas e o carro de David Brabham, na equipa fundada pelo seu pai.

O dia estava quente e limpo, e os pilotos encaravam 77 voltas de um circuito tortuoso e algo enfadonho, com uma grande probabilidade dos carros ficarem numa longa fila indiana. E em muitos aspectos, foi o que aconteceu. Na partida, Berger tentou superar os dois Williams, mas não conseguiu, e Boutsen ficou na liderança da corrida. O austríaco só tinha conseguido ficar em segundo, superando Patrese. Mais atrás, Senna era surpreendido por Mansell e Alesi, caindo para a sexta posição.

Quanto a Alain Prost, também perdeu lugares na partida para De Cesaris, Nannini e Piquet. Nas voltas seguintes, enquanto que Alesi abria espaço devido à sua menor velocidade de ponta, Prost, Nannini e Piquet perdiam tempo para tentar superar o italiano da Dallara.

Na volta 21, Senna passa Alesi, mas isso foi de pouca dura, pois teve um furo e rumou às boxes, caindo para o décimo posto. Mais atrás, Nannini supera Alesi e junta-se aos quatro da frente, enquanto que Prost tinha uma falha na transmissão e despista-se a meio da corrida, ficando de fora. Pouco depois, Alesi tem um encontro imediato com o Minardi de Pierluigi Martini e também desiste.

Por essa altura, os cinco primeiros estavam juntos: Boutsen, Berger, Patrese, Mansell e Nannini, com Senna a aproximar-se. Na volta 50, Berger decidiu colocar pneus novos e logo a seguir Mansell tenta passar Patrese, mas a manobra é um fracasso e perde posições para Nannini e Senna. O italiano decidiu então proteger o seu companheiro, permitindo-o que se afastasse, mas somente ate que ele fosse às boxes. Quando tal aconteceu, o pelotão, liderado pelo Benetton de Nannini, aproximou-se.

Senna decidiu tentar passar o italiano por todos os meios e na volta 64, na chicane, fez a manobra. Contudo, esta foi mal calculada e coloca o piloto do Benetton fora de pista. Senna nada sofreu, mas a corrida do italiano terminava ali. Oito voltas depois, Mansell tenta fazer a mesma manobra, no mesmo local, mas ambos batem e abandonam de imediato.

Com isso, Senna pressionou Boutsen até aos metros finais, mas quem levou a melhor foi o belga. A fechar o pódio ficou o outro Benetton de Nelson Piquet, que aproveitou bem os desastres dos outros para subir ao pódio. Riccardo Patrese, o Lotus de Derek Warwick e o Larrousse-Lamborghini de Eric Bernard ficaram com os restantes lugares pontuáveis.

Fontes:

http://www.grandprix.com/gpe/rr494.html
http://en.wikipedia.org/wiki/1990_Hungarian_Grand_Prix

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Grand Prix (numero 51, Grand Prix du Monaco - 1)

Monaco, 7 de Maio de 1970. Primeiro dia de treinos.

A chuva era uma chatice, naquela quinta-feira no sul de França. No calendário era Primavera, mas em termos de cartão postal, aquilo tinha mais ar de Inverno, aquele Inverno que agora só se encontrava nos pontos mais altos dos Alpes. O Mónaco seria mais uma cidade entalada na Riviera francesa se não fosse o seu estatuto especial: uma cidade-estado, neste caso uma monarquia, com um Casino e uma ex-atriz de Hollywood como princesa. Tal como nos contos de fadas. E este conto de fadas moderno ajudava no Orçamento do Estado monegasco...

O "Grand Prix de Monaco" existia desde 1929, e Monseiur Louis Chiron, o seu presidente, e que tinha sido um dos maiores pilotos do seu tempo, fazia o seu melhor para manter a sua eficácia. Depois do acidente de Nino Barlini, três anos antes, foram colocadas barreiras de proteção, primeiro uma só, mas depois do susto de Toino Bernardini, na prova de Formula 2 do ano passado, decidiram duplicar essa barreira. Mas algumas vozes já lhe diziam que se calhar, isso também não chegava. Ninguém sabia se isso era verdade, logo, tinham de esperar por este fim de semana para saber se sim ou não.

No "paddock", Pete Aaron via um velho amigo seu. Aliás, dois velhos amigos seus: Dan Gurney e Michael Delaney. Estavam acompanhados por Bruce McLaren e John Hogarth, naquilo que mais parecia ser uma reunião de velhos amigos. Dos vivos, só faltava Tim Randolph, que cuirosamente, também lá estava, mas a fazer de comentador na cadeia de TV americana ABC. E que provavelmente o iria chatear, mas no bom sentido, no fim de semana, fazendo perguntas sobre o circuito e sobre o carro.

- Velhas baleias, como vão?
- Andamos bem, e agradados pelos teus feitos. Tens material para seres campeão do mundo, mas não pensavamos que fosse agora.
- Isto ainda vai demorar, e o campeonato mal começou.
- Mas uma vitória na Africa do Sul e um pódio em Espanha não são coisas para se deiterem fora, não é verdade? perguntou Michael
- Lá isso é verdade. E o teu filme?
- Anda complicado. Estou em fase de montagem, e ando a brigar com os estudios sobre o tipo de montagem que eles querem. Tou farto de lhes dizer que o tempo deles acabou. SE levarem a melhor, temo que o filme fique uma merda.
- Tem calma, isso se resolve, respondeu McLaren.
- Que isso vai acontecer, isso vai. Mas prefiro que seja à minha maneira.
- Quando é que fazes um nosso?
- Veremos. Se der certo, eu faço, sorriu Michael.
- Quanto a mim, quero ver se hoje as coisas correm bem. Com esta chuva, não me parece, afirmou Pete à medida que olhava para fora e via o céu cinzento e os fios de chuva a cairem no asfalto.

--- XXX ---

Enquanto isso, os carros rolavam na pista, tentando segurar-se como podiam no asfalto molhado. Na boxe da Apollo, tentavam-se achar as melhores afinações para chuva, especialmente agora com as asas implantadas nos carros. Neste circuito travado, o "downforce" necessário era maior, para se fazer bem as curvas, embora fosse penalizador nas rectas. Mas o componente mais penalizado eraa caixa de velocidades, pois durante a corrida, faziam-se mais de 2700 mudanças de caixa durante as - agora - oitenta voltas da corrida.

- Como é que isso vai, perguntou John O'Hara.
- Está quase pronto, John, respondeu o mecânico-chefe.
- Ainda bem, preciso de dar umas voltas para ver como é que está.
- Há algum sinal do tempo amainar? perguntou Sinead, protegida num guarda chuva multicolor.
- Não hoje, receio. Sexta-feira vai parar, mas não corremos nesse dia, lamenta John. Sábado é a incógnita. Espero que esteja bom, referiu.
- E há de estar, retorquiu Teddy, enquanto saia do carro.
- Então?
- Um inferno, mas ainda é praticável. Quem se diverte é o nosso terceiro piloto, dizia Teddy, quando nesse preciso instante, Alexandre passava pela recta como uma bala para fazer mais uma volta ao traçado.

De facto, Alexandre dava voltas sem parar ao traçado, para se habituar à potência do carro e memorizar as curvas, treinando-se à chuva. Não sabia que tal iria acontecer no dia da corrida, mas ao menos estava precavido, caso acontecesse. Falava-se que podia chover no Domingo, mas nada estava confirmado. Até lá, guiava no seu Eagle o melhor que podia, o mais rápido que podia. E até marca tempos interessantes, para um chassis que acusava o seu uso e que não era mais do que uma adaptação de um carro velho aos novos tempos. Mas ele lhe tinha dado os seus primeiros pontos na corrida anterior, portanto, ainda dava luta.

Após passar pela Curva do Gasómetro, Alexandre foi para dentro das boxes, onde encostou o carro e saiu do cockpit, para se refrescar e dizer o que sentia:

- Para a chuva, o carro está bom, quase perfeito. Agora resta saber o que vai acontecer, se no Sabado não chover. Vamos ter de fazer tudo de novo, sem garantias que vai acontecer o mesmo no Domingo.
- Pois é, e parece que até estás a portar-te bem. fizeste o oitavo tempo, respondeu Aaron.
- Otimo, só que isto pode não servir de muito. Se no Sábado não chover, volta tudo à estaca zero. E aqui é como em Jarama: vinte carros para 16 lugares, sem tirar nem pôr.
- Então temos de dar o tudo por tudo, respondeu Teddy. O que não será fácil.

--- XXX ---

O fim de semana monegasco estava cheio de festas e bailes organizados quer pela Casa Real, quer pelas federações e alguns patrocinadores presentes, já a mostrar aquilo que valiam no meio. Ainda por cima na corrida mais glamorosa da Europa. Num deles, todos as lendas do automobilismo, chefes de equipa, pilotos e respectivas acompanhantes estavam por lá, desde Henry Temple a Pete Aaron, misturados com actores de Hollywood. Michael Delaney trouxera Kirk Douglas, por exemplo, para ver mais uma vez o ambiente do automobilismo. Ele que, como membro da equipa, convidara-o para fazer uma visita especial às boxes na Sexta e no Sábado.

Quanto aos pilotos, todos eles estavam num grupo em amena conversa, falando das condições da pista sob chuva e das possibilidades de marcar um tempo decente em piso seco.

- Somos vinte para 16 lugares. Não será fácil, afirmou John O'Hara.
- Tu não terás essa preocupação, John, respondeu Patick Van Diemen, sem sequelas visiveis do seu acidente na prova anterior, em Jarama. Nem eu, nem se calhar todos os que estão em equipas oficiais. Quanto aos privados... afirmou, olhando para Alex e Antti, em amena conversa num grupo à parte, que incluia uns joviais Toino Bernardini e Brian Hocking, mais o jornalista André Barros. Van Diemen aproximou-se a afirmou: Juntem-se a nós.
- Mas pensava que estavamos juntos!
- Estão um pouco separados de nós. Para isso já bastam os mais velhos...

Eles moveram-se um pouco e continuaram em amena cavaqueira sobre as condições e outras coisas mais. Passado uns minutos, notaram que o jovem finlandês falava mais do que o habitual, e tinha um copo de Martini na mão. Notando quem tinha tido tal proeza, John O'Hara aproximou-se de Alexandre de Monforte e afirmou:

- Como é que tu conseguiste desenrolar a lingua?
- Um pouco de persuasão, um copo na mão e já está!
- Tenta não fazer isso muitas vezes, rapaz.
- O copo? Não. Ele é tímido por natureza. Não conhecia ninguém e o presoal da Formula 2 teve pena dele e começou a meter conversa.
- E fala tão bem como corre?
- Acho que ele explica melhor num carro de corridas. O Bruce jordan está de olho nele.
- E falando no Diabo...

Bruce Jordan aproximou-se do grupo e saudou os presentes.

- Ah! É sempre bom ver os senhores em alegre convivo uns com os outros. "Good show!"
- Credo, parece o Bob Turner em novo... respondeu John.

Bruce tinha agora um fino bigode e patilhas quase até ao final da orelha. Segurava um copo de "whisky" na mão ("Tua marca, John? Infelizmente não, respondeu") e foi ter com eles para saber como andavam, fazendo conversas de circunstância. As coisas aconteceram ao longo da festa, com os convivas, mais de 150, a beber e a conversar, mesmo sem a presença dos Principes do Mónaco. Perto da meia-noite, John O'Hara olhou para as horas e disse:

- Por mim, já chega. Volto para o hotel para dormir.
- E não vais ver os pincipes? perguntou Alexandre.
- Rapaz... se tudo correr bem, irei ver os pincipes no Domingo, quando subir as escadas para receber o troféu de vencedor. Queres apostar? perguntou sorridentemente.

(continua)

Sobre Tazio Nuvolari, um semideus das pistas

Existem imensas histórias sobre ele para alimentar a lenda. Que quando atropelou um veado em Donington, pegou na cabeça e colocou como troféu de caça na sua sala de estar; calou meio milhão de alemães em Nurburgring em 1935, quando eles estavam tão convencidos que iria ser uma alemão a ganhar que nem tinham o disco com o hino italiano... algo que o próprio Tazio resolveu, emprestando o seu. Correu toda uma Mille Miglia à noite, com as luzes apagadas, mesmo atrás do seu rival Achille Varzi, a mais de 150 km/hora, para o surpreender no momento em que as ligou e o ultrapassou, perto da meta.

Correu pela Alfa Romeo, Ferrari, Maserati e pelos alemães da Auto Union. Ganhou todos os Grand Prix da altura, excepto o da Checoslováquia. As suas façanhas foram tantas e o seu estilo de condução foi tão admirado que o Dr. Ferdinand Porsche disse certo dia: "Tazio Nuvolari é o maior piloto do passado, do presente e do futuro".

Começou a correr no motociclismo, adquirindo um estilo que o veio a ser útil mais tarde, quando teve de domar os carros de motor traseiro feitos pela Auto Union e pela pena do genial Dr. Ferdinand Porsche. Tal como Bernd Rosemeyer, eram os unicos que sabiam guiar e aproveitar ao máximo aquelas máquinas.

Ganhou tudo o que havia de ganhar na Europa: Targa Florio (duas vezes), campeonato europeu, Grand Prix do Monaco, as Mille Miglia, as 24 Horas de Le Mans... em máquinas como Alfa Romeo, Maserati e Auto Union. Era o piloto mais admirado de Itália, da Europa e do Mundo, sem qualquer tipo de dúvida. E tinha apenas 1.65 metros, o que nos leva a pensar que o talento não se mede aos palmos.

Tinha um negro sentido de humor. Chegou a dizer, certo dia, a Enzo Ferrari, quando lhe comprou um bilhete de ida e volta para a Sicilia, antes de competir em mais uma edição da Targa Florio: "Você é um estranho homem de negócios... e se voltar para casa num caixão?" Outra das suas lendas era que chegou a pegar numa perna de presunto da janela de um talho. Lenda ou não, é verdade que conduzia muitas das vezes lesionado, com uma ou as duas pernas engesssadas... e às vezes, vencia!

Tazio Nuvolari sobreviveu a tudo. À morte dos seus companheiros e rivais nas pistas, como Varzi, Borzachini, Rosemeyer... a duas guerras mundiais, fintou a Morte na pista vezes sem conta e chegou a sofrer o pior, quando os seus dois filhos morreram na adolescência, vitimas de doença. Resistiu até ao fim, chegando até a conduzir com um lenço ensanguentado numa mão e fazendo a condução com a outra. Parou de correr quando sofreu uma trombose, em 1952. Dois anos antes tinha feito a sua última corrida, nas montanhas dos arredores de Palermo, na Sicilia.

E a 11 de Agosto de 1953, dia em que morreu, a Itália inteira prestou tributo a ele. 55 mil pessoas foram a Mântua prestar a sua homenagem, o seu caixão foi levado num chassis de automóvel, com pilotos como Alberto Ascari, Juan Manuel Fangio e Luigi Villoresi. O jornalista e escritor Cyril Posthumus afirmou anos dpeois: "Tazio Nuvolari não era um simples corredor de automóveis. Na sua Itália natal ele tornou-se num ídolo, um semideus, uma lenda, um exemplo daquilo que todos os jovens italianos queriam ser. E era o exemplo do David que derrotava todos os Golias do automobilismo. Não por uma vez, mas sim por várias vezes. Simplesmente era 'Il Maestro'".