Há 25 anos, a 30 de julho do ano 2000, a imagem de um piloto a chorar agarrado à bandeira do seu país, numa autódromo alemão, comoveu todo o mundo da Formula 1, porque sabia que ele, acima de tudo, merecia aquela vitória. E muitos julgavam que a partir dali, ele poderia ir a caminho de uma carreira cheia de títulos, quando a realidade foi diferente.
Mas mais que isso, a vitória de Rubinho foi o aliviar de uma pressão que existia desde maio de 1994 e que, provavelmente, condicionou boa parte da sua carreira.
Nascido a 23 de maio de 1972, em São Paulo, Rubens Barrichello ganhou o nome de "Rubinho" porque, por coincidência, tinha nascido no mesmo dia que o seu pai. Começou cedo a sua carreira, nos karts, antes de em 1990, aos 17 anos, ter ido para os monolugares, na formula Opel Lotus. No ano a seguir, rumou à Formula 3 britânica, onde correu pelo título contra o escocês David Coulthard, conseguindo ser campeão. No final desse ano, decidiu-se contra uma oferta para ir à Formula 1, indo para a Formula 3000, correndo pela Il Barone Rampante, onde conseguiu quatro pódios, sem vitórias, e foi terceiro no campeonato.
Isso causou novo interesse do pessoal da Formula 1, onde acabou por ficar na Jordan. Estreou-se em Kyalami, na África do Sul, e na terceiro corrida, em Donington, andou bem perto... do pódio. Partindo do 12º posto na grelha, no final da primeira volta, tinha passado sete carros e era quarto, apenas atrás de Ayrton Senna, Alain Prost e Damon Hill. Andou boa parte dessa prova no terceiro lugar, aproveitando bem o piso húmido e sabendo trocar de pneus na altura certa. Contudo, a seis voltas do final uma avaria no sistema de pressão de combustível causou o seu abandono, masm mesmo assim ainda se classificou na décima posição.
A duas corridas do final do campeonato, no Japão, conseguiu os seus primeiros pontos, ao ser quinto. Curiosamente, foi ali que se estreou aquele que iria ser o seu companheiro de equipa para as duas temporadas seguintes, o irlandês Eddie Irvine.
A temporada de 1994 começou de forma auspiciosa. Um quarto lugar no Brasil seguiu-se um terceiro posto em Aida, no Japão, comemorado fortemente num pódio que tinha Michael Schumacher e o veterano Gerhard Berger. Contudo, na corrida seguinte, em Imola, as coisas poderiam ter acabado muito mal, quando sofreu um acidente na Variante Bassa, a mais de 200 km/hora, batendo contra a barreira de pneus e sofreu uma forte desaceleração. Quando acordou, tinha Ayrton Senna a seu lado, preocupado com o seu estado. Ele recuperararia, mas não iria participar na corrida. Dois dias depois, ele e o resto do mundo iria assistir, horrorizado, ao acidente mortal do seu compatrtiota. O que não sabia era que, as partir daquele momento, o país iria pedir, implorar, para que calçasse o mais rapidamente uns sapatos difíceis de calçar: o de ser o brasileiro campeão, herói dos domingos de manhã, como Senna era.
Algum tempo depois, em setembro, conseguiu mais um feito: no sábado do GP da Bélgica, em Spa-Francochamps, e aproveitando o tempo instável, com o asfalto húmido, marcou o melhor tempo, e conseguindo, aos 22 anos e 84 dias, ser o mais jovem poleman da Formula 1 até então. E ainda por cima, num Jordan! Com isso, acabava a temporada com 19 pontos e o sexto lugar da geral.
Ficou na Jordan até 1996, conseguindo mais um pódio, no Canadá. No final desse ano, rumou para a uma nova equipa, a Stewart, esperando que fosse o primeiro piloto da equipa montada por Jackie Stewart, mas fortemente apoiada pela Ford. Um segundo lugar no Mónaco, à chuva, foi o seu melhor resultado, numa temporada marcada por diversos problemas mecânicos. E as coisas não seriam muito diferentes em 1998, com dois quintos lugares.
As coisas iriam melhorar bastante em 1999. Com Johnny Herbert como companheiro de equipa, voltou aos pódios em Imola, ao ser terceiro, e as constantes colocações nas primeiras filas da grelha pareciam fazer com que as aspirações de vitória pudessem ser concretizadas. Em Magny-Cours, palco do GP de França, ele conseguiu a pole-position, e a corrida aconteceu com chuva. Mas no final, ficou com outro terceiro lugar porque Heinz-Harald Frentzen tinha feito uma estratégia melhor, na sua Jordan.
Mais tarde no ano, em Nurburgring, parecia que iria ter uma nova chance, numa corrida parcialmente à chuva, turbulenta e com os principais candidatos a terem problemas. Mas no final, que fez melhor as coisas... fora Herbert, o seu companheiro de equipa. Ele iria dar a primeira - e única - vitória da Stewart, enquanto Barrichello voltaria a ser terceiro. Mais uma boa chance de vitória, em condições favoráveis a ele, apenas para outros aproveitarem. E ele no pódio, a aplaudir e a receber troféus mais pequenos.
Contudo, no final dessa temporada, teve a chance que queria: correr por uma grande equipa. Acabaria na Ferrari, no lugar do seu ex-companheiro da Jordan, Irvine - curiosamente, o irlandês iria ficar no lugar de Barrichello, na Jaguar, a substituta da Stewart - onde iria ser o companheiro de equipa de um Michael Schumacher que passara parte da temporada passada fora de combate depois de um acidente no GP da Grã-Bretanha, em Silverstone.
Rubinho começou bem, com uma pole-position e um segundo lugar na Austrália, mas até ao meio da temporada, com mais cinco pódios e uma pole-position, mas... ainda não tinha ganho. A meio da temporada, tinha 36 pontos, era quarto classificado numa competição entre Ferrari e McLaren e 20 pontos atrás de Michael Schumacher.
E assim chegamos ao final de semana do GP da Alemanha.
Ao longo do final de semana, em Hockenheim, o tempo ficou instável e para piorar as coisas, teve problemas de óleo no seu carro, conseguindo apenas o 18º melhor tempo. E para piorar as coisas, fez o tempo usando o carro de reserva cuja prioridade era para... Schumacher. E quando o alemão teve problemas, o brasileiro estava limitado. Resultado final: 3,8 segundos atrás do poleman, David Coulthard.
O dia da corrida estava nublado, mas a pista estava seca. Contudo, a minutos da partida, começou a chover na zona do Estádio, obrigando os pilotos a escolherem os pneus mais adequados, com muitos a ficarem com secos, mas com ajustes nas asas, para o tempo molhado. Quando as luzes se apagaram, a sorte começou a ser favorável ao brasileiro, quando Michael Schumacher e Giancarlo Fisichella, no seu Benetton, se envolvem e acabaram na primeira curva. Atrás, Barrichello partiu ao ataque, passando oito carros na primeira volta, acabando em décimo. Havia uma razão: ele iria fazer duas paragens para reabastecimento.
Os McLaren estavam na frente, com Hakkinen na frente de Coulthard, enquanto o brasileiro subia volta após volta. Demorou cinco voltas até ser sexto e logo depois, tinha passado o Jaguar de Johnny Herbert, para ser quinto. Na volta 12, era quarto, passando o Arrows de Pedro de la Rosa. Depois, mantendo o ritmo, foi buscar o Jordan de Jarno Trulli, tentando chegar a terceiro. Conseguiu apanhá-lo na volta 15, passando-o, antes da primeira paragem para reabastecimento. Por essa altura, tinha feito a volta mais rápida da pista.
Regressando à pista em sexto, o destino, o acaso - ou a sorte - entrou em cena mais uma vez. Na volta 25, um trabalhador da Mercedes entrou na pista com cartazes no seu corpo, reclamando de um despedimento de uma das suas fábricas. O homem, um francês, foi imediatamente retirado da pista, causando a entrada do Safety Car. Boa parte dos pilotos foi às boxes, incluindo os McLarens... mas não Barrichello. Quando a corrida recomeçou, na volta 29, ele pressionou Trulli para tentar o terceiro posto, mas pouco depois, na volta 30, o Sauber de Pedro Diniz e o Prost de Jean Alesi colidiram, causando nova entrada do Safety Car, para limpar os destroços da pista.
Quase ao mesmo tempo em que a corrida recomeçou... começou a chover em parte da pista, na zona do Estádio. A chuva era ligeira, humedecendo a pista, e colocava dúvidas sobre se valeria a pena colocar pneus de chuva ou não. As coisas pioraram na volta 35, mas quatro pilotos decidiram manter-se na pista. E um deles era Barrichello. Contra as ordens do seu engenheiro, ele menteve-se na pista, com pneus secos. Todos repararam nisto e queriam saber se essa aposta arriscada iria compensar ou não.
Hakkinen tinha colocado pneus de chuva, mas apenas tinha chovido em parte da pista e quando chegava à parte seca, ficava em desvantagem para o brasileiro da Ferrari. Na volta 36, o brasileiro passou-o e começou a afastar-se do piloto da McLaren, e com o passar das voltas, o tempo piorava. Mas não ia às boxes.
E à medida que as voltas passavam, rumo à meta, parecia que o milagre iria acontecer.
A chuva caiu ainda mais na última volta, mas Barrichello mantinha-se na pista, acelerando para a meta. No final, não só era o final de um jejum de sete anos de vitórias brasileiras, desde o GP da Austrália de 1993, como era o seu primeiro triunfo da sua carreira. E ainda por cima, como tinha sido apanágio durante a sua carreira, a sua condução tinha sido brilhante, aproveitando as condições instáveis naquele dia. E nisso, ele era realmente muito bom.
E há muito tempo que todos não tinham visto uma vitória emocionante, e popular.