(
continuação do capitulo anterior)
A sexta-feira foi chuvosa, e os pilotos pouco ou nada aproveitaram daquele dia, a não ser para ver como é que se comportariam naquelas condições. Ninguém deu mais do que meia dúzia de voltas no rápido Zeltweg, sem arriscar muito, para conservar os carros, pois previa-se tempo seco para amanhã, e aí todos quereriam marcar um tempo para a grelha de partida.
Na Austria, a Ferrari tinha inscrito três carros para a corrida, com o terceiro carro a ser dado para Michele Guarini, que tinha ganho novamente a confiança dos homens de Maranello após o GP britânico. Na Jordan, continuavam a ter três carros, para Pieter Reinhardt, Antti Kalhola e Pedro Medeiros, um claro sinal de confiança nos três pilotos, e que por ali o dinheiro abundava...
A Matra não tinha cedido à tentação e decidiu continuar com os dois carros, para Philippe de Beaufort e Gilles Carpentier. Estava mais ocupado em garantir o título para Beaufort o mais rapidamente possivel, pois era a prioridade numero um. Mas pensava em dar um terceiro carro nas corridas americanas para Pierre Brasseur, que dominava na Formula 2, depois do desinteresse de Monforte no título após os eventos de Junho, como o acidente de Rouen e o estatuto de piloto oficial na Apollo.
A Temple-Jordan mantinha a dupla da Alemanha: Brian Hocking e Manfred Linzmayer, mas Bob Bedford preparava-se para entrar na equipa em Monza, no seu regresso após o acidente e o pulso fraturado nos treinos de Brands Hatch. Quanto ao seu futuro, estava a negociar uma ida para a BRM, ao lado de Teddy Solana e Anders Gustafsson. Mas também queria tentar a sua sorte na McLaren onde Peter Revson e John Hogarth estavam presentes. Comntudo, Bedford sabia que os dois eram veteranos e sabia que eles precisariam de sangue novo em 1971... e ainda faltava saber os planos pós-competição de Bob Turner. Ele falava amiude que encarava a ideia de comprar um chassis Jordan ou Apollo e o inscrever sob o nome de "Turner Racing". E claro, ainda faltava a Lamborghini, que depois da primeira experiência no inicio do ano, recolhera-se após a morte de Bruce McLaren e o final do acordo. Mas sabia-se que trabalhavam para o seu regresso, o mais tardar, para 1972.
Mas ali na Austria começavam todos a olhar para a tabela de pontos: Philippe de Beaufort era o lider inconstestado e começava-se a encarar a hipótese do título ser decidido naquele fim de semana, caso ele vencesse e os seus adversários não pontuassem. A hipótese estava no ar e muitos começavam a pensar nessa ideia, ainda por cima num circuito favorável aos motores mais potentes.
- Quantos pontos tem de avanço? perguntou Teddy Solana.
- Trinta e um. Beaufort tem 53, Reinhardt 22. Eu tenho 19 e o Van Diemen 18. O homem e a sua máquina dominam tudo, respondeu Alex.
- Ele pode ganhar o título agora?
- Se ele ganhar aqui e nem eu, nem o Reinhardt, nem o Van Diemen pontuarem, consegue um avanço de 40 pontos. A faltar quatro corridas... sim, ele ganha o título aqui.
- E se desistir?
- Se desistir e, digamos, o Van Diemen vencer e nem eu, nem o Reinhardt pontuarmos, a distância diminui para 26 pontos. Na pior das hipóteses, ele ganha no Canadá.
- E se tu ganhares?
- Se eu ganhar e o Beaufort desistir, a diferença cai para... er... 25 pontos. Não é muito, continua confortável e continuaria a conquistar o título no Canadá.
- E os descartes?
- São inuteis. Ele desistiu em Kyalami, e basta ele não acabar uma corrida... dos treze deste ano, bastam-lhe os onze melhores resultados. Este ano isso é inutil.
- Então, o Reinhardt tem de ganhar aqui, certo?
- Sim, mas acho que são os Ferrari que têm hipóteses, contra os Matra. Se o Van Diemen ganhar aqui e em Monza, e se o francês não pontuar, a diferença entre os dois fica reduzida de 35 para 17 pontos.
- Mas ele ainda liderava.
- Sim, lidera. Ouve... por muito que calculemos, ele tem o caneco na mão. Pode não conseguir aqui, mas pode conseguir em Monza, Mont-Tremblant ou Watkins Glen. O campeão este ano é ele!
- E o que vai ele vai fazer depois?
- Hmmm... tenho uma ideia, mas não digo.
- Porquê?
- É segredo, mas acho que se somarmos dois mais dois, já sabemos o que vai ser.
- Ahhh...
- Topaste?
- Sim, topei.
- Mas não digas que fui eu. Pouca gente sabe, e para metediços, já bastam os jornalistas que puluam por aqui.
- Claro, dormes com uma...
- Curiosamente, 'señor Solana', foi ela que me disse isto, e pediu-me para jurar segredo.
Ao vê-los conversar do outro lado da boxe, Pete chamou-os:
- Ei! O treino vai começar agora e eu não vos pago para dizerem segredinhos um ao outro.
- Sim, patrão, respondeu Alexandre, sorridente.
Antes de se dirigirem para lá, Alex deu uma cotovelada no braço de Teddy e disse:
- Sobre a última parte, bico calado. Não digas a ninguém, nem ao Pete, nem a mim, nem à Teresa. Eles sabem do nosso segredo.
- Ahhh... OK.
- Portanto, nada de apanhar uma piela ou divertires-te com as meninas locais, avisou, antes de se dirigirem para os respectivos carros. Não contas isto nem a tua mãe.
Pouco depois da hora do almoço, começavam os treinos daquele dia no autódromo austriaco. O dia estava limpo, a temperatura amena e a pista seca. Aos poucos, os carros rolavam na pista, primeiro para se adaptarem às condições, e depois para começarem a marcar tempos para a corrida do dia seguinte.
Com o passar dos minutos, Matra, BRM e Ferrari começavam a marcar os melhores tempos, mas de vez em quando via-se um Jordan ou um Apollo a tentar entrar na tabela dos tempos mais rápidos da tarde. No minuto dez, Philippe de Beaufort marca um tempo de 1.37,6, para deixar uma mensagem à concorrência que era a referência. Mas cedo os Ferrari responderam, com Patrick Van Diemen a fazer 1.37,3 e depois 1.37,0. Logo a swguir, Bob Turner faz 1.37,3 e Anders Gustafsson faz 1.37,5, com Gilles Carpentier a fazer 1.37,4. Todos muito juntos, quando se estava na meia hora do treino.
Na boxe da Apollo, depois de Teddy ter feito 1.38,0 e Monforte 1.38,3, tinham voltado às boxes para afinar o carro e calçar pneus novos. Pete estava debruçado sobre Alexandre, que disse:
- Eles hoje estão endiabrados. Eu mal consigo chegar-me a eles, estamos com um segundo de atraso em relação aos Matra, BRM e Ferrari.
- Temos de tentar, Alex.
- Davam jeito aqueles pneus do outro dia.
- Pois davam, mas eles só nos vão dar no "the Glen".
- Bolas... dois meses a assar. Se chegar ao pódio, é uma maravilha.
- É verdade...
- 1.36,7! REINHARDT!
Pete e Alex ficam espantados com a mensagem dada por Teresa, que os vê e depois vai ter com eles para comunicar a noticia:
- Ouviram o que disse?
- Ouvimos, mas que treta ele tem no carro?
- Nâo sei, não cortou a pista, mas conseguiu.
- 1.36,8, BERNARDINI!
- É a Pam. Acho que a pista está a melhorar, disse Pete.
- Ah é? Então tenho de ir para lá. Estes pneus são novos?
- São.
- Vai demorar para aquecer e ser eficiente. Mas tenho de tentar. Até já.
Ambos afastam-se do carro, depois de ele dar a ignição. Menos de dois minutos depois, o Apollo rola na pista e começa a subir, no sentido de dar umas voltas de aquecimento e tentar fazer o melhor tempo possivel.
Quando Alex se lança para mais uma volta, Patrick Van Diemen consegue baixar o seu tempo para 1.36,5 segundos, enquanto que Carpentier fazia 1.37.0. Beaufort parecia não reagir, mas estava na pista, tentando melhorar o seu tempo. Alex tinha de os acompanhar, sob pena de não ter um tempo suficientemente bom para o colocar nos lugares da frente da grelha e comprometer as hipóteses de pontuar no campeonato.
No final da curva anterior à meta, feita em quarta a fundo, Alex lançou-se carregando o seu pé no pedal, balançando-se para a meta, e passando-a a alta velocidade. Depois começou a subir até á Curva Hella-Licht, feita para a direita e a alta velocidade, acelerando pelas paisagens, subindo e descendo naquele traçado desenhado na montanha. Raramente abrandava, excepto nas curvas interiores, onde reduzia para terceira, para ajudar a travar o seu carro. Contudo, num circuito a alta velocidade, este era um bem raro, e o que contava era ser veloz o suficiente para marcar um bom tempo. E após um minuto e meio, aparecia na meta. Teresa tinha o cronómetro na mão, com o dedo no botão de "parar". Quando passou pela meta, carregou tão violentamente que ia deixando cair. No final viu o tempo, fez uma cara resignada e mostrou a Pam.
- 1.36,9. É bom, mas não chega.
- Pois não, querida. O Reinhardt melhorou agora: 1.36,5, iguala Van Diemen. E parece que o Beaufort e os Ferraris vem lançados...
Poucos instantes depois, vinham três carros. Primeiro, um Matra a dar de si, com o capacete azul francês, de Beaufort, a ir nos limites com o ronco do seu V12 a uivar naquela paisagem cheia de gente. Lançado na pista, aproximava-se da linha de meta, e quando passou, fez um tempo que espantava todos os presentes que tinham o cronómetro na mão. Na boxe da Matra, um mecânico comemorava o feito, e a palavra soava veloz, como fogo em mato seco: o carro azul tinha feito um tempo do outro mundo: 1.35,5 segundos.
Instantes depois, dois Ferrari circulavam juntos, dando o seu melhor. O facto de andarem juntos indicava que estavam a dar o seu melhor e que os tempos poderiam ser surpreeendentes. Muitos sustiveram a respiração à medida que os carros de Bernardini e Van Diemen passavam pela linha branca. O tempo que mercaram era bom, mas não o suficiente para destituir o francês do primeiro lugar. Van Diemen fazia 1.35,9, e Bernardini fazia 1.36.2, e conseguia a sua melhor posição da gralha de sempre. Era um sinal de que a Ferrari estava cada vez mais competitiva.
No final do treino, Beaufort era todo sorrisos ao sair do seu carro, apesar da máscara de esforço que tinha dado ao fazer aquela volta-canhão, com pouca gasolina no seu depósito e com os pneus usados. Mas conseguira nova pole-position, ao lado de Van Diemen, e à frente de um surpreendente Bernardini e de Pieter Reinhardt, com Bob Turner e Alexandre de Monforte na terceira fila. Depois vinha Carpentier, Solana e Gustafsson, para fechar o "top ten" dos vinte pilotos presentes nas verdejantes montanhas austriacas, prontas para mais um fim de semana automobilistico, a primeira naquele veloz circuito.
(continua)