sábado, 7 de março de 2015

A recuperação do carro de Ott Tanak

Quem viu os jornais de hoje, como eu, parece que os ralis só têm protagonismo quando acontece um acidente. Com a "estória" do carro de Ott Tanak no fundo do reservatório mexicano (a sequência de fotos pode ser revista por aqui), resta contar o resto da história. É que em menos de três horas, os mecânicos da M-Sport conseguiram fazer as devidas reparações ao carro do piloto estónio e o recolocaram na estrada a tempo de participar no dia de hoje do Rali do México, em modo "Rally2".

E o que fizeram? Depois de recuperar o carro, após dez horas debaixo de água, colocaram nova caixa de velocidades, tanque de combustível, sistema de arrefecimento, válvulas do turbo, componentes eletrónicos, sistema de travagem, suspensões dianteira e traseira, e inúmeros outros componentes. Em suma, um carro novo, à excepção do chassis. A equipa também reparou o motor, drenando-o do excesso de água. E tudo isto em meras três horas! Para completar o ramalhete, Tanak e o seu navegador colocaram o carro no "Parc Fermé"... pelos seus próprios meios.

"Isto foi algo que nunca vi antes. O carro esteve submerso o dia todo num lago, e a equipa reconstruiu-o em apenas três horas. Foi um desafio maluco, mas eu sabia que os rapazes da M-Sport o conseguiriam", comentou o piloto estónio. 

Malcolm Wilson, o diretor da equipa, estava muito contente com o feito da sua equipa de mecânicos em Leon: "Depois do que aconteceu ao Ott [Tänak] e o Raigo [Mõlder] hoje foi um enorme alívio ver que eles ficaram bem, e para mim foi muito importante termos conseguido preparar o carro, pois eles queriam mesmo voltar aos troços. Isso mostra verdadeira determinação! Para além disso o trabalho dos nossos mecânicos foi fenomenal, e havia muita gente no parque de assistência que não acreditava ser possível. Mas eu sabia que sim, e que valia a pena o esforço. A equipa merece todo o crédito, e estou certo que a lealdade e respeito pelo Ott e o Raigo os incentivou, até por eles terem ficado ali com eles o tempo todo", comentou.

Contudo, o tempo no fundo do lago pode ter comprometido o resto do rali para eles. É que quando na manhã deste sábado, eles foram tirar o carro do Parque Fechado, o carro recusou a colaborar, perdendo quase quatro minutos até que ele começasse a funcionar, mudando-lhe as velas e empurrando para fora do parque de assistência.

O carro voltou a parar na ligação para a 11ª classificativa, e após mais algumas tentativas, não puderam fazer mais nada, com o piloto estónio a terminar o seu rali por ali. O que foi um final inglório, depois de tanto trabalho para o recuperar... 

WRC 2015 - Rali do México (Dia 1)

O primeiro dia do Rali do México não mostrou nada de novo: Sebastien Ogier já está na frente do Rali, com o Seu Volkswagen Polo R, numa liderança cada vez mais destacada, e onde já viu alguns dos seus pilotos mais relevantes de fora devido a despistes.

As duas primeiras classificativas, ocorridas na madrugada desta sexta-feira na Europa nas ruas de Leon, demonstraram que Ogier arrebatou a liderança, depois de Thierry Neuville ter sido o mais veloz e ser o primeiro lider. A diferença de 1,2 segundos sobre o piloto belga da Hyundai parecia não ser grande, mas na terceira classificativa, que aconteceu já na tarde desta sexta-feira por aqui, Ogier começou a distanciar-se da concorrência. No final da quarta especial, de El Chocolate, tinha um avanço de 13,3 segundos sobre Neuville.

O inicio do dia tinha visto Kris Meeke a ser veloz no seu Citroen DS3 WRC, vencendo a terceira especial, mas na quarta, o inglês sofreu um despiste e acabou fora de estrada. Os danos foram tais que eles decidiram regressar amanhã no "Rally2". Outro dos desistentes de hoje foi Hayden Paddon, que também sofreu um despiste, que danificou o seu Hyundai i20 WRC. Também regressará amanhã, através do "Rally2". Ott Tanak foi outro desistente, vitima de... afogamento. O seu carro caiu num reservatório, mas nem ele, nem o seu navegador sofreram ferimentos, pois conseguiram sair a tempo.

Outro que também teve problemas na quarta especial foi Robert Kubica, que teve um problema na quarta especial e ficou parado por mais de dez minutos, perdendo o sexto lugar que tinha na altura, então a 4.1 segundos da liderança.

Pela tarde, Jari-Matti Latvala começou a destacar-se, ao vencer duas classificativas de seguida e ascender ao segundo lugar. mas na oitava classificativa, Thierry Neuville fura e acabaria por capotar. Os estragos eram muitos e a equipa resolveu voltar no sábado através do "Rally2". No final do dia, Latvala estava a apenas 10,2 segundos de Ogier e preaprava-se para lutar pela vitória no segundo dia do rali.

O terceiro classificado é agora o Citroen de Mads Ostberg, que está agora a 26,8 segundos, depois de ter andado todo o dia com problemas na sua caixa de velocidades. Com os problemas resolvidos, não se distanciou muito dos Volkswagen, mas têm atrás de si o carro de Anders Mikkelsen, a 42,7 segundos. Elfyn Evans não esperava chegar ao final do dia sendo o unico sobrevivente dos Ford, mas é agora o quinto classificado, quase a um minuto da liderança (59,7 segundos, para ser mais exato), na frente do unico Hyundai de Dani Sordo.

Martin Prokop é o sétimo, a dois minutos e dois segundos, e partir daqui, são os "sobreviventes": o Ford do ucraniano Yuri Protassov é o oitavo, a quatro minutos e 25 segundos, seguido pelo carro de Nasser al-Attiyah, e o ford do peruano Nicolas Fuchs, a mais de seis minutos e 19 segundos da liderança.

O rali do México continua este sábado.  

sexta-feira, 6 de março de 2015

As fotos do dia






A incrível sequência de fotos do acidente desta tarde de Ott Tanak e Raigo Molder, que saíram incólumes do carro após o seu Ford Fiesta WRC ter caído no lago, durante a terceira classificativa do Rali do México. O piloto estónio e o seu navegador conseguiram sair a tempo do carro, e aparentemente, o seu navegador levou com ele o seu caderno de apontamentos!

A classificativa foi naturalmente interrompida para se poder assistir ambos os pilotos. Eles não sofreram ferimentos, mas o seu rali acabou. Ao contrário de Sebastien Ogier, que está na frente com o seu Volkswagen Polo R.

A foto vi primeiro no sitio do Rodrigo Mattar, mas esta sequência de fotos vi depois no Facebook do João Carlos Costa.

Este mês, no Nobres do Grid...

(...) Todos estes circuitos [Istambul, na Turquia; Yeongam, na Coreia do Sul e Buddh, na India] foram o resultado das ambições destes países em ascensão no panorama mundial em receber a Formula 1. Várias corporações e os estados em questão queriam ter, quer por razões comerciais, quer por razões politicas, a categoria máxima do automobilismo, e dali ganhar centenas de milhões de euros vindas dos fãs, dos patrocinadores e outras entidades. Só que passados mais de dez anos, estes três circuitos estão fora do calendário da Formula 1, e tirando eventos locais, não receberam mais eventos significativos dos mundiais da FIA, como por exemplo, a Endurance, os GT’s ou outros. Em suma, são elefantes brancos, edifícios inúteis que correm o risco de serem abandonados à sua sorte.

As razões pra isso são diversas. As más localizações, no caso coreano, ou os problemas políticos, no caso turco, e os referentes ao financiamento e aos impostos, no caso indiano, explicam porque é que Bernie Ecclestone quis sair fora dali o mais depressa possível, pois as autoridades locais não quiseram ir ao ritmo dele. E passados três ou quatro anos, os contratos são rasgados, os prejuízos são elevados e ninguém quer pagar isso. Um bom exemplo foi no final da semana passada, quando a FOM mandou uma carta aos organizadores do GP coreano, exigindo cerca de 86 milhões de dólares de compensações pelos prejuízos causados pelo cancelamento do GP coreano de 2015, quando na realidade, a sua colocação no calendário é das coisas mais inexplicáveis até ao momento, pois toda a gente sabia que tal aventura era impraticável.

No passado dia 16, o sitio Motorsport.com falou que o equivalente coreano ao Tribunal de Contas está a investigar se houve má apropriação de dinheiros públicos na construção do circuito, inaugurado em 2010. Ativistas locais querem saber porque é que o projeto foi construído tão longe dos centros urbanos do país (o circuito situa-se perto de uma vila piscatória na província de South Jeolla, com escassas unidades hoteleiras e a maior parte delas são… motéis) e se não houve uma tentativa de desvio de fundos, através de superfaturações por parte das construtoras. O inquérito vai já a meio, mas ativistas locais não querem deixar morrer o caso.

No caso indiano, desde o inicio que a empreitada foi um pesadelo. Construido no sul da capital, Nova Delhi, o empreendimento, construído pelo Jaypee Group, custou à volta de 150 milhões de dólares e desde o inicio que se enredou nas burocracias indianas, conhecidas por serem mesquinhas e corruptas. Primeiro, as autoridades queriam colocar o Grande Prémio como entretenimento, e como tal, obrigada a pagar os impostos referentes. No caso em particular, eles teriam de pagar 1/20 anos dos lucros totais… de toda a temporada de Formula 1, e não do Grande Prémio em si. Para piorar as coisas, a burocracia dos vistos, entre outras coisas, é lendariamente lenta e sujeita a corrupção. Em muitos aspectos, fala-se que foi por causa disso que Ecclestone, a FOM e todo o pelotão da Formula 1 rapidamente se desinteressou pelo subcontinente indiano. (...)

O assunto dos circuitos deixados ao abandono, como um dos legados desta Formula 1 atual, é um assunto recorrente, dadas as dificuldades que vivem as equipas neste momento, e as polémicas subjacentes às suspeitas sobre desvio de fundos, e o facto de terem usado as táticas erradas na busca por novos mercados e novos públicos na Ásia, do qual as autoridades locais estão a pagar bem caro.

Falei sobre este assunto no passado dia 10, por aqui, mas a cada dia que passa, surgem novos desenvolvimentos sobre estes casos, que, aliados aos problemas de má distribuição dos dinheiros entre as equipas, coloca a formula 1 numa situação periclitante, do qual está mouca aos constantes avisos de que "o rei vai nu" e do qual arricamos a ver dezasseis carros à partida da corrida de Melbourne.

GP Memória - Austrália 2005

Depois de mais uma temporada de domínio, esperava-se que em 2005, as coisas iriam continuar na mesma na Ferrari, apesar de alguns dos seus membros mais importantes estarem a pensar na reforma. Jean Todt, Ross Brawn e Rory Bryne pensavam já que tinham completado o circulo e já achavam que era tempo de dar lugar aos outros. Mas isso não iria acontecer agora, tanto que na equipa que se ganhava, não iria mexer: Michael Schumacher e Rubens Barrichello iriam ser os seus pilotos pela sexta temporada consecutiva.

Já a concorrência tinha de trabalhar no duro para os apanhar, senão superar. A Renault tinha mantido a dupla de 2004, com Giancarlo Fisichella como piloto, mas as atenções estavam viradas para o espanhol Fernando Alonso, que aos 23 anos era considerado como uma das esperanças de vitória na Formula 1, e claro, motivo de loucura na sua Espanha natal. Na Williams, a dupla de pilotos tinha sido totalmente removida, com Ralf Schumacher e Juan Pablo Montoya a serem substituídos por Mark Webber - vindo da Jaguar - e Nick Heidfeld, que no ano anterior tinha estado na Jordan.

Na McLaren, com Kimi Raikkonen no lugar, o seu novo companheiro de equipa iria ser Montoya. Mas o problema continuava a ser o carro, pois no ano anterior, as coisas tinham sido bem más com o modelo MP4-19 e a sua versão B, onde só tinham vencido uma corrida com Raikkonen.

A Totoya tinha decidido apostar alto, depois de três anos frustrantes. Gastou dinheiro para ter dois bons pilotos, o italiano Jarno Trulli - que estava lá desde o final de 2004 - e o alemão Ralf Schumacher, que tinha vindo da Williams. O TF105, o novo modelo da marca japonesa, era desenhado por Mike Gascoyne e esperava que fosse bem melhor do que os que tinham sido desenhados antes.

No final de 2004, a Ford decidiu retirar-se de cena da Formula 1 e venceu a sua equipa, conhecida como Jaguar. Dietrich Matechitz, multimilionário austríaco e dono da marca de bebidas Red Bull, decidiu que era a chance de ter adquirir a sua própria equipa e fê-la, rebatizando com a sua marca. Em termos de pilotos, Mateschitz decidiu ir buscar o veterano escocês David Coulthard e colocou um dos seus pilotos da "cantera", o austriaco Christian Klien, que no ano anterior estava na Jaguar. Mas um terceiro piloto espreita a oportunidade, já que Vitantonio Liuzzi também foi integrado na equipa, e foi-lhe prometido que iria andar no carro ao longo da nova temporada.

Também em 2004, a Jordan estava nas suas últimas penas. Eddie Jordan, cansado de treze anos de trabalho pela sua marca, decidiu vender a equipa ao Midland Group, por 60 milhões de dólares, depois de arranjar um negócio com a Toyota para fornecer os seus motores. Apesar da mudança de proprietário implicar uma mudança de nome, as coisas só iriam acontecer em 2006, o que implicaria que nesse ano, e pela última vez, o nome Jordan iria ser dito. A dupla de pilotos iria ser constituída por dois estreantes, o português Tiago Monteiro e o indiano Narain Karthikeyan, e neste último, era uma estreia absoluta: nunca um indiano tinha guiado um Formula 1.

Na BAR-Honda, as expectativas eram altas, depois da excelente temporada que tinham feito em 2004, com Jenson Button a ser vice-campeão do mundo e Takuma Sato a fazer a melhor temporada de sempre, culminado com um pódio em Indianápolis. Já na Sauber, a equipa contava com o regressado Jacques Villeneuve e o jovem brasileiro Felipe Massa. Para finalizar, a Minardi iria colocar nos seus carros o holandês Cristijan Albers e o austriaco Patrick Freisacher.

A FIA, então liderada por Max Mosley, tinha colocado algumas alterações ao regulamento que tinham causado polémica. O primeiro deles tinha a ver com os pneus, onde foi proibida a troca de pneus, destinado a que eles tivessem de aguentar toda a corrida, algo que não acontecia por causa do reabastecimento. Que se manteve...

Outro regulamento polémico do qual a Formula 1 contava era em relação aos tempos da qualificação, que era polémico. A FIA tinha decidido juntar os tempos da Q1 e da Q2 e fazer deles um composto, do qual contaria a soma de ambos os tempos para fazer a pole-position e os restantes lugares da grelha de partida.

No final desse aglomerado de tempos, o poleman era... Giancarlo Fisichella, no seu Renault, que conseguiu uma distancia de quase três segundos sobre Jarno Trulli, no seu Toyota. Mark Webber era o terceiro, no seu Williams, com Jacques Villeneuve a seu lado, no seu Sauber. David Coulthard e Christian Klien monopolizavam a terceira fila, com os seus Red Bull, enquanto que Nick Heidfeld era o sétimo, no segundo Williams, seguido pelo BAR-Honda de Jenson Button. Os McLaren-Mercedes de Juan Pablo Montoya e Kimi Raikkonen fechavam o "top ten", na frente do Ferrari de Rubens Barrichello.

Quatro pilotos não tiraram qualquer tempo: Michael Schumacher, Felipe Massa, Takuma Sato e o Minardi de Christijan Albers.

A corrida teve uma falsa partida, quando o carro de Kimi Raikkonen ficou parado na grelha, reduzindo a corrida em uma volta. Na segunda partida, Fisichella manteve a liderança, com Trulli atrás e coultard no terceiro posto, enquanto que os que estavam na parte de trás do pelotão tentavam recuperar posições. Cedo, o Red Bull do escocês começou a ser o "tampão" do resto do pelotão, aguentando os ataques dos Williams de Webber e Heidfeld. Webber tentou passar Coulthard na 15ª volta, mas a tentativa foi abortada.

Após a primeira passagem para reabastecimento, Fisichella manteve a liderança, enquanto que Trulli se atrasava devido a um pneu esvaziado. Em contraste, Alonso e Barrichello subiam lugares atrás de lugares, com o brasileiro a ser quarto após a primeira passagem pelas boxes, seguido pelo piloto espanhol. por essa altura, Ralf Schumacher perdia tempo nas boxes por causa de um problema com o seu elemento de segurança, atrasando-se na classificação.

Na volta 42, houve o omento da corrida quando Michael Schumacher e Nick Heidfeld colidiram um com o outro. O acidente ocorreu na curva 3, após a reentrada do alemão da Williams na pista, e o da Ferrari não o viu nos seus espelhos quando ele estava a ultrapassá-lo, e ambos colidiram, saindo da pista. Heidfeld ficou ali, mas Schumacher voltou à pista, apenas para desistir no final dessa volta.

Na parte final, Alonso chegou-se a Barrichello pelo segundo lugar, pressionando-o, mas o brasileiro conseguiu resistir aos ataques dele. Mas na frente, de forma imperial, Giancarlo Fisichella vencia a corrida com cinco segundos de vantagem sobre Barrichello, com Fernando Alonso a ser o terceiro classificado. Nos restantes lugares pontuáveis ficaram o Red Bull de David Coulthard, o Williams de Mark Webber, o  McLaren de Juan Pablo Montoya, o segundo Red Bull de Christian Klien e o segundo McLaren de Kimi Raikkonen. 

Vimeo Movie Presentation: Grupo B, um filme


No fim de semana em que o WRC volta à acção com o rali do México, soube-se através do espanhol Diário Motor que há uma curta-metragem de 28 minutos sobre a competição de seu nome "Grupo B", realizado por Nick Rowland e que terá Richard Madden (o Robb Stark do Game of Thrones) como protagonista principal.

A permissa é simples: um piloto, Shane Hunter, um piloto de ralis dos tempos do Grupo B, tenta voltar à competição depois de um acidente, num MG4 Metro. As cenas de condução estão asseguradas pelo britânico David Higgins, que é seis vezes campeão americano de ralis. Segundo o realizador, a ideia é de o mostrar nos vários festivais de cinema um pouco por todo o mundo, antes de tentar a sua sorte nos BAFTA ou nos Oscares de 2016.

Até lá, poderemos ver aqui o trailer do filme.

quinta-feira, 5 de março de 2015

A foto do dia (II)

Como alguém já me falou, é a imagem de um dos momentos mais marcantes da história do automobilismo. É um "memento mori", pois este piloto acabou de morrer, vitima de um extintor, trazido às pressas por um comissário de pista de 19 anos, que provavelmente no momento em que esta foto foi tirada, já jazia no chão, morto, irreconhecível pelo choque com o Shadow de Tom Pryce.

Vi esta imagem pela primeira vez há muitos anos, num livro chamado "F1 Autobiography". A imagem impressiona, mais de dez anos após ter visto pela primeira vez. E ao longo deste tempo, à medida que sabia mais pormenores desta história, não conseguia pensar nas ironias que aconteceram naquele dia e naquele momento. De como Hans-Joachim Stuck esteve a milimetros de ter sido o infeliz contemplado e como descobriram quem tinha sido o infeliz quando viram quem faltava, na contagem dos comissários.

Sobre o assunto, escrevi há quatro anos neste mesmo espaço. E de lá, tiro este excerto, vindo de um mecânico da Tyrrell, Trevor Price:

"Lembro-me perfeitamente do pequeno fogo que vinha do outro carro [de Renzo Zorzi] e depois do carro de Pryce a entrar na reta. De repente notei que o motor tinha deixado de acelerar mais cedo do que o previsto e algo a levantar-se momentaneamente para o ar quando o seu carro lá passou, que depois viemos a ver que era o infeliz comissário de pista".

Mas se vão perguntar se a corrida foi interrompida, a resposta é... não. Esqueçam isso, em 1977, se a pista estava livre, a corrida continuava. Outros tempos...


Formula 1 em Cartoons - Uma situação chocante (Pilotoons)

Eis o que o Bruno Mantovani pensa sobre o que aconteceu no caso do Fernando Alonso, nos testes em Barcelona. Um carro... chocante, segundo ele.

A pista perfeita de Martin Brundle


Esta vi hoje no WTF1.co.uk. Toda a gente pensa na "pista perfeita", mas parece que com um armazém bem grande e a ajuda de um piloto, tudo é possível. Graças ao Scaletrix, Martin Brundle - que como sabem, é comentador da Sky Sports de Formula 1 - decidiu desenhar uma pista que incorporava os vinte traçados do mundial de Formula 1 deste ano, e o resultado é este: uma pista monstruosa, de 177 peças, 44 curvas e medindo cerca de 45 metros de comprimento. 

Provavelmente, se fosse real, esta pista mediria uns bons 25 quilómetros no mínimo, não acham?

A foto do dia

Esta imagem espectacular aconteceu esta tarde no circuito de Jerez. O carro que não se consegue identificar nesta foto é o DAMS do britânico Dean Stoneman, ue sofreu um forte acidente na curva 7 do circuito andaluz, depois de perder o controlo do seu carro da World Series by Renault (WSR). O golpe de vento fez com que batesse fortemente num dos muros de proteção, mas o ricochete foi de tal forma violento que ainda bateu no outro lado da pista, antes de parar.

Stoneman foi para o centro médico do circuito, por precaução, mas já se encontra bem. E a equipa até afirma que o carro é recuperável para correr amanhã, caso queiram.

Formula 1 em Cartoons: O que aconteceu em Barcelona? (Riko)

O Frederico Ricciardi, mais conhecido por "Riko", fez um cartoon onde abordou o misterioso acidente de Fernando Alonso em Barcelona, onde coloca três hipóteses sobre o que aconteceu e as suas consequências. 

Três hipóteses sobre o mistério Fernando Alonso:

1 - ... levou o choque e não consegue se lembrar como se conduzir um Formula 1.

"Lindo! E o que eu faço com isso? Dirigo a 300 km/hora? Vocês são loucos!"

2 - ... uma rajada de vento jogou-o contra a parede e ainda não recuperou.

3 - ... é esperto!

"... Faça uma coisa, Kevin. Senta tu no carro (... correr com ele, ui!) que eu fico aqui a ver se está bom".

quarta-feira, 4 de março de 2015

A foto do dia (II)

José Carlos Pace, em Kyalami, no ano de 1975, disparando na frente da concorrência no inicio do GP da África do Sul desse ano. No inicio dessa temporada, Pace estava disparado no campeonato, depois da vitória em Interlagos, em paragens sul-africanas, ele tinha feito a sua primeira pole-position da sua carreira.

Contudo, nessa corrida em paragens sul-africanas, Pace sofreu algo do qual contado agora, seria incrível: um molho de chaves. Aparentemente, um mecânico deixou cair um molho de chaves dentro do Brabham do piloto brasileiro, e este ficou atrás do pedal do acelerador, impedindo-o de o carregar até ao fundo.

Na corrida, sempre que o piloto brasileiro premia o pedal até ao fundo, havia algo que o impedia de fazer, e isso impediu de manter a liderança. No final, acabou no quarto posto, numa corrida ganha pelo Tyrrell de Jody Scheckter. A diferença entre o vencedor e ele foi de meros 17 segundos. Não sei se isso é verdade - Pace fez a volta mais rápida na corrida - mas de onde li, parece que a história é bem plausível.

Na realidade, a temporada de 1975 acabou por ser a melhor do piloto brasileiro. A vitoria de Interlagos apareceu com mais dois pódios, um terceiro lugar no Mónaco e um segundo posto em Silverstone. Mas o carro nem sempre foi fiável nesse ano, e acabou no sexto lugar da geral, com 24 pontos. Pensava-se que faria melhor, mas o motor Alfa Romeo flat-12 era grande e guloso, e ele sofreu bastante. O segundo lugar na Argentina, no inicio de 1977, com a versão B do BT45 deu-lhe esperanças, mas infelizmente, não houve tempo. O seu substituito, Hans-Joachim Stuck, ainda ajudou a equipa a conseguir doze pontos e dois terceiros lugares, os melhores de sempre para o alto alemão. O que demonstrava o potencial para regressar à ribalta.

A foto do dia

Jim Clark em esforço, algures em 1963, com o modelo 25 da Lotus. Caso estivesse vivo, Jim Clark faria hoje 79 anos de idade. Quarenta e seis anos depois da sua morte, o piloto escocês ainda é considerado como um dos melhores de sempre, a par de Juan Manuel Fangio, Jackie Stewart, Ayrton Senna e Michael Schumacher. Para não falar de Tazio Nuvolari.

Clark, timido por natureza, sempre afirmou que era fazendeiro, sempre foi fiel à Lotus e a Colin Chapman. Foram raras as vezes que correu por outra marca ao longo da sua carreira, e na Formula 1, sempre correu pela marca oficial. Pouca gente sabe disto, mas para além das 25 vitórias oficiais, ainda teve mais 19 vitórias em corridas extra-campeonato, entre os quais no GP da Africa do Sul de 1961, o GP do México de 1962 e o GP de Espanha de 1967, tudo provas de ensaio antes de serem recebidos no calendário oficial.

E se todos conhecem os feitos dele nas 500 Milhas de Indianápolis, onde foi o vencedor em 1965, ou na Tasman Series, onde foi tricampeão em 1965, 67 e 68, mas pouca gente sabe que ele participou em três edições das 24 Horas de Le Mans, e essas foram as raras vezes em que participou por outra equipa. Em 1960, ao serviço da Aston Martin, alinhou com Roy Salvadori e alcançou o terceiro lugar na corrida, antes de desistir na edição do ano seguinte, onde alinhou com Ron Flockhart. Clark nunca gostou de correr em La Sarthe, e o desinteresse da Lotus nessa competição impediu de conseguir mais e melhor por lá.

O seu estilo de condução, suave e consistente, era caso de admiração por muita gente, incluindo um conterrâneo seu, Jackie Stewart. Sobre ele, o tricampeão escocês disse certo dia: "Tinha [um estilo de condução] tão suave, tão limpo. Nunca lutou contra os carros que guiava, amansava-o para que ele fizesse como ele queria".

Apesar de ter vivido um tempo onde as transmissões televisivas eram escassas, todos os que o viram correr disseram que foi o melhor da sua geração. Mas para ele, que corria por obrigação, mais por gozo, nunca entendeu bem como é que ele poderia ser mais veloz do que os outros. E se calhar esse deverá ter sido o seu segredo para o sucesso: nunca guiou pensando que poderia ser o melhor.

Noticias: Manor-Marussia confirma que vai correr em Melbourne

A Manor-Marussia confirmou esta tarde na sua página do Facebook que estará presente em Melbourne, depois de ter anunciado a sua estrutura diretiva e o seu carro com as especificações de 2015 já ter ido para a FIA no sentido de se sujeito ao obrigatório "crash-test". De acordo com o site Motorsport, a equipa nomeou Justin King como seu diretor interino, o milionário Sean Fitzpatrick como o seu investidor, para alem de John Booth e Graeme Lowdon como diretores desportivos.

"A equipa tem vindo a preparar os carros com os quais ele vai começar a temporada de 2015 e que cumprem integralmente os novos regulamentos. Mais tarde na temporada, irá introduzir um novo carro, com especificações de 2015, de acordo com os projetos iniciados no ano passado", disse a equipa no seu comunicado oficial, divulgado na sua página de Facebook. Caso passe no "crash-test", o carro que será apresentado vai ser uma versão B do chassis de 2014.

John Booth aproveitou para agradecer a todas as entidades do automobilismo que ajudaram a que a Manor-Marussia regressasse às pistas nesta temporada. "Eu quero agradecer a todas as equipes, a FIA, Formula One Management, aos nossos fornecedores e funcionários e, claro, todos os fãs pelo apoio que temos recebido ao longo dos últimos seis meses. Tem sido um período desafiador para todos nós, nós viemos intensamente e agora só queremos correr novamente", começou por afirmar.

"Com a formidável nova liderança empresarial de Stephen Fitzpatrick e a presença e conselhos de Justin King, agora estamos num ótimo lugar à frente da nova temporada. Este é um momento fantástico e muito gratificante para todos os envolvidos", concluiu.

Esta noticia aparece duas semanas depois da Manor-Marussia ter saído da administração de falência que tinha sido colocada no final do ano passado pelos donos da Marussia.

Quando ao novo investidor, Sean Fitzpatrick é o fundador e dono da firma de energia OVO. Um "petrolhead", esteve no passado ano e meio à procura de uma equipa interessante onde pudesse investir. Depois de ter andado pela Formula E, andou depois pela Caterham, demonstrando algum interesse na aquisição da equipa, mas no final, virou-se para a Manor-Marussia, onde decidiu ajudar a tirar a equipa da situação de falência. Aparentemente, poderá investir cerca de 40 milhões de libras na competição, o que supera ligeiramente os 35 milhões de libras que a equipa receberá por ter acabado o campeonato de 2014 na nona posição.

Em termos de pilotos, com Will Stevens confirmado para correr, daqui a poucos dias será conhecido o segundo piloto da marca.

O elogio de Gary Hartstein à decisão de Fernando Alonso

É óbvio que acerca dos eventos do teste de há semana e meia em Barcelona, e da decisão de Fernando Alonso de não correr em Melbourne tem elementos de suspeita, do qual falei abertamente ontem. Mas hoje andei a ler o post que o dr. Gary Hartstein sobre este assunto, e a opinião de médico neurologista é bem mais interessante do que cuspir no ar e pensar em suposições. Contudo, o facto de falar deste lado não invalida o outro: como disse ontem, não foi o (alegado) choque elétrico que causou a contusão. Foi o impacto do carro no muro que resultou nessa batida com a cabeça.

Sem ele falar do choque, elogiou a atitude que foi tomada ao não deixar o piloto espanhol correr em Melbourne. ele afirmou que foi "uma vitória para a Formula 1" e que a decisão de não guiar na Austrália "foi uma prova de inteligência, maturidade e compreensão". É que uma boa razão para tal coisa têm a ver com o SSI, ou seja "Sindroma do Segundo Impacto". Os médicos afirmam que os pilotos não devem ir imediatamente correr após um impacto destes - pelo menos, menos de um mês após esse trauma - pois podem correr o risco de um segundo trauma, e esse poderá ser bem mais devastador.

E isto fez-me lembrar uma matéria do ano passado na "Road & Track" sobre as contusões no automobilismo, nomeadamente na NASCAR, e sobre uma doença chamada ETC, ou Encefalopatia Traumática Crónica, que aparece em força nos jogadores de futebol americano mais tarde nas suas carreiras, e que leva a demência e uma morte prematura, e que já existe entre os veteranos do automobilismo. Caso não tenham lido na altura, coloco aqui a matéria dividida em duas partes.

A conclusão a que Hartstein chega é que Alonso estará bem o suficiente para correr em Sepang, a 24 de março, isto se não surgirem complicações. E aí, ele acha que poderá haver algo mais do que aquilo que a McLaren anda a dizer. Mas nesse campo, é Woking que têm de dizer realmente o que se passou. E quanto a nós, é acalmarmos e deixarmos que os especialistas resolvam o assunto e não ir buscar "teorias da conspiração". O mundo é mesmo assim: complexo e confuso. 

terça-feira, 3 de março de 2015

A entrevista a Gerard Ducarouge (parte 4)

(continuação do capitulo anterior)

Na quarta e última parte desta entrevista a Gerard Ducarouge, feita em 2012 pelo jornalista francês Jean-Paul Orjebin, o projetista fala dos seus tempos na Lotus, da relação dificil que teve com Nelson Piquet, na parte final da sua carreira, com passagens pela Larrousse e Ligier, do seu projeto da Renault Espace, em conjunto com a Matra, e para o fim, deixou uma história que aconteeu em meados dos anos 80, quando Enzo Ferrari tentou convencê-lo a se juntar na Scuderia, provavelmente com Ayrton Senna, que acabou por recusar, após uma discussão tipica de um filme.

JPO - Passamos rapidamente pelo período do Senna, porque acho que sua evocação lhe faz sofrer.

GD - Sim, passemos. Ayrton queria que o seguisse na McLaren. Fui sériamente abordado muito a sério no ano anterior por Ron Denis, mas não aceitei a oferta. Quando Ayrton deixou a Lotus, eu escrevi-lhe uma carta na qual eu lhe disse que estava arrependido de não ter conseguido ter feito um carro para que fosse campeão do mundo, e eu não poderia segui-lo, porque eu tinha um contrato que eu queria cumprir. Conclui dizendo que eu tinha certeza que iria ser várias vezes campeão do mundo. Só um jornalista conseguiu ler esta carta - eu ainda não sei como ele fez isso - foi o Johnny Rives!

JPO - Você teve o Nelson Piquet, que o substituiu.

GD - Foi muito complicado, porque já não havia o Ayrton e era do conhecimento de todos que Nelson não poderia enquadrá-lo. No dia em que chegou, quando foi para o meu escritório, viu as imagens na parede que era tradicionalmente feitos pelo Peter Warr, uma foto dos vencedores das corridas, em Donington, e então tinha sete. Piquet olhou para eles e disse: "Gerard, se você quer que a gente trabalhe em conjunto, vocês devem tirar tudo isso."

Ele odiava Senna, então tudo o que pode estar relacionado com o passado da Lotus o irritava. Você pode imaginar a atmosfera desde o início da nossa colaboração. Eu não aceitei os seus caprichos.

Mais tarde, no estúdio, eu mostro-lhe um carro completo para que ele possa determinar uma primeira onda de ajustes para sua posição de condução, como o pedal, volante, etc. Eu cometi o erro de dizer-lhe que era o 'muleto' do Ayrton, e ele saiu como dali disparado dizendo que ele não dirigia um carro que tinha sido usado por Senna ... achei que estávamos nos divertindo com tal caráter. Houve uma grande disputa entre os dois pilotos após o artigo de Nelson na imprensa sensacionalista no Rio durante os testes de inverno.

Foi um pouco patético, mas na verdade era que Nelson tinha sido um terrível acidente em Monza e que o retorno tinha sido difícil. Muitas vezes ele ouvia a voz de um treinador, uma espécie de guru que o deveria ajudar, foi um pouco especial. Mas o pior é que ele ainda estava longe de seu desempenho, não era muito mais rápido do que o Satoru Nakajima. Era muito difícil de se comunicar com ele e falar sobre os aspectos técnicos, às vezes simplesmente ele ia dormir no motorhome. Os resultados foram naturalmente ruins, e, portanto, não estávamos em nosso lugar em termos de performance. Pela primeira vez, eu pensei que o final do meu contrato seria bem-vindo, eu realmente não sentia mais motivado para continuar porque a atmosfera sofreu muito com a falta de resultados. Tinha a certeza de sair rapidamernte dali e encontrar um novo desafio.

JPO - Isso foi a Larrousse?

GD - Exato. Larrousse com um chassis Lola. Quando descobri o chassis Lola como tinha sido planejado pelo Gérard Larousse, eu achei que não estava ao meu gosto. Então eu fiquei de novo em Inglaterra para tentar fazer novamente e, se fosse necessário, iniciar a partir do zero. Isto é o que fizemos na Lola com [Chris] Murphy, um designer de Lola que ia no jogo e era muito mais amigável. Um francês, super, também tinha vindo para nos ajudar.

A fábrica fechava pelas 17/18 horas e [os funcionários] não eram autorizados a permanecer no local após esse tempo. Com a ajuda do Murphy, facilmente evitávamos os sistemas de alarme para que pudessemos trabalhar durante as noites, que eram frequentemente muito curtas. Felizmente, durante este período eu estava hospedado num mau "Bed & Breakfast", meu quarto tinha um pouco mais do que 9 ou 10 m², era realmente patético. Às vezes, na cama, antes de dormir, eu estava realmente querendo saber o que eu estava ali a fazer. (Não havia uma única sala disponível no único hotel digno do nome da cidade).

Eu ainda assumi a liderança junto da Lola. Eu podia ver como eles trabalhavam. Com seu sucesso e o número de carros que vendiam nos EUA, incluindo a Indy, o que eles estavam a fazer era realmente a grande produção, com objetivos comerciais óbvios. Eu tive que lutar com eles para os nossos triângulos [de suspensão] eram feitos de aço 15CDV6, muito poderoso, mas de um aço muito caro, é verdade o preço era triplicado, mas por razões de segurança, parecia indispensável. Além das principais equipes da Fórmula 1 teve, finalmente, usar antes de irmos para o carbono.

Nosso propulsor Lamborghini V12 era um motor, leve, mas frágil. Mauro Forghieri tinha feito um ótimo trabalho com sua equipa, mas ele deveria ter tido, pelo menos, mais um ano de desenvolvimento, para não conhecer esses problemas iniciais. Lembro-me de ter feito uma boa corrida, foi no Japão, onde Aguri Suzuki teve um belo 3º lugar.

Eu gostei de trabalhar com Mauro, ele sabe tanto! Mas trabalhar num motor é super difícil, ele tinha um V12, pequeno e bonito o suficiente para ver, mas faltou-lhe tempo para trabalhar na fiabilidade. Deve ser dito que, apesar da amizade que tínhamos um pelo outro, quando o motor tinha problemas persistentes, a atmosfera torna-se tensa, e isso modifica alguns relacionamentos.

JPO - E para a surpresa de muitos, volta para a Ligier, a sua casa inicial...

GD - Eu cedi porque eu gosto de Guy, mas já era muito complicado. Tinha acontecido o período Cyril de Rouvre, que acabou na prisão, e com a chegada de Briatore e pelo meio o Tom Walkinshaw, tudo o que um conjunto de coisas que foi que eu não estava confortável, além do trauma do acidente fatal de Ayrton... eu realmente tinha alcançado o pleno na Formula 1. Muito provavelmente era hora de virar a última página de um período de 31 anos ao mais alto nível.

15 dias após a minha saída da Ligier, recebo um telefonema da Matra, a dizer, "estamos na penúria, prometemos fazer-lhes um Renault Espace F1 e não avançamos muito, seria bom se fosse você porque você conhece bem o motor Renault F1 e a caixa de velocidades são do Williams FW14". Assim, arranco para Paris. Era uma nova aventura, houve, naturalmente, ainda muito trabalho antes de correr. Como de costume, nós estávamos em uma corrida e Renault alegou que era seu ofício.

Finalmente, o Espace F1 foi um grande sucesso e foi muito bem sucedido. Entretanto, estava preocupado, eu pensei que havia um risco de problemas de fiabilidade com equipamentos de Formula 1, perderíamos rodas, teriamos quebras de suspensões, por isso estavamos a arriscar com suspensões de Williams F1, um motor Renault F1 V10 de 850 cavalos, uma caixa de velocidades sequencial da Williams, com discos de embreagem de carbono gêmeas, em suma todos os ingredientes de um corpo de carro de Fórmula 1, com menos de um 1500 kg, em vez dos 550 kg usados para um carro de Formula 1. Por incrível que pareça, não tivemos problemas durante toda a semana de testes!

No Espace F1, no circuito de Ricard, Alain Prost aterrorizou muitos VIPs. Eles não estavam todos tão valentes depois dos seus dois passeios de pé em baixo dentro do monstro, do qual saiam num estado terrível. Eu nunca entrei, eu estava com medo, pois sabia que o Alain não teria reduzido a sua margem de segurança de 315 kmh, que era a velocidade que chegava antes da curva Signes... não é para mim, era muito perigoso!

Depois deste sucesso mediático da Renault/Matra, eu me lembro muito bem do Guédon Philippe, que era o chefe da Matra Auto, que me disse: "Gérard, você conhece o mundo, seria bom que tentássemos contratos internacionais." Foi criado um pequeno Departamento para o Desenvolvimento Internacional e eu levei a minha mala para navegar nos países asiáticos e sul-americanos. 

Tivemos alguns grandes sucessos, particularmente na Malásia, onde o grupo Petronas passou por nós controle mil táxis a GPL, concebidos com base no Espace e com reservatórios de carbono para armazenar o gás natural a 250 bar sob o chassis. Era alta tecnologia. Não foi um exercício de estilo, muito bem sucedido depois de tudo, mas um desafio técnico que o perigo da utilização de gás natural a alta pressão tornou complicado. A colaboração com um grande grupo indonésio foi assinado pelo próprio J-L Lagardère para a fabricação de aproximadamente 100.000 Espace por ano. Os edifícios e as equipas estavam prontos quando uma súbita crise financeira nos países asiáticos destruiu completamente este projeto enorme.

JPO - Durante este longo período na Formula 1 você foi abordado por um número de equipas, mas nunca pela Ferrari, é incrível.

GD - Mesmo assim eu fui contactado, mas mantive esses encontros com Enzo Ferrari para mim. As únicas pessoas que sabiam eram Marco Piccinini, que estava presente, e o Ayrton. A primeira reunião teve lugar no escritório de Enzo Ferrari em Maranello, e uma segunda, mais incrível, mais incrível foi realizada na sua casa em Modena. Este, eu não consigo esquecer, esta é uma história real, um filme à italiana!

 Foi durante o meu tempo Lotus, eu estava na minha pequena casa, em Norwich, numa manhã de domingo, à volta das oito horas. O telefone toca, eu tinha acabado de sair da minha cama. Do outro lado, alguém no telefone com sotaque italiano: "Olá. É o Marco Piccinini". Perguntava-me o que ele fazia para me chamar a casa num domingo. "Gerard, devo dizer-lhe que no aeroporto de Norwich está um jato da Aeroleasing à sua espera, porque o Ingeniere quer vê-lo esta tarde, em Modena".

Eu realmente pensava que era uma brincadeira, mas Marco insistiu muito, eu pensei que ainda tinha de ir ver se era verdade, mas o aeroporto não era longe, eu estava pronto, levei 20 minutos a chegar lá de carro. Depois que eu cheguei ao aeroporto, que estava deserto, como o normal nos pequenos aeroportos provinciais num domingo de manhã. De fato, havia muitos Aeroleasing Jet na pista, e uma jovem se aproximou de mim no corredor, ela esperava-me.

Após 10 minutos de vôo, Marco Picccinini me ligou para me agradecer e, especialmente, para explicar como as coisas iam acontecer quando eu chegasse no aeroporto de Bolonha. Uma pessoa iria esperar-me que eu descesse da aeronave e guiaria-me diretamente para um carro, num pequeno estacionamento de aviação privado, não havia alfândegas, era tudo muito discreto.

Tudo correu como o planejado e, neste famoso carro ao lado do motorista, uma pessoa respondia por walkie-talkie. Eu não entendia o que estavam a dizer, mas eu estava lá e estava tudo OK. Marco tinha me disse para ir para a casa de Enzo Ferrari, e as precauções devem ser respeitadas, mas que aquilo beirava um pouco a paranóia, era demais para mim. Numa portagem na auto-estrada, mudamos de carro, em caso tivessemos sido seguidos. Em Modena, um grande portão tinha sido aberto na nossa chegada e entramos quase sem parar a um pátio, as portas fecharam-se imediatamente atrás de nós. Eu tive o privilégio de estar em Enzo Ferrari. Marco estava lá e foi rápido para se desculpar por todos esses movimentos que eram justificados pelo fato de que o engenheiro era muito vigiado. Eu me encontrei em um grande escritório muito escuro onde o Enzo estava esperando, Marco me fez sentar no lado direito, perto do escritório e deixou-o em pé dois ou três metros atrás de mim. A atmosfera era incrível!

Fiquei muito impressionado. Com o episódio da estrada do aeroporto, percebi que tudo o que me tinha levado era muito especial. A atmosfera fechada, muito escura, que havia nesta sala, Marco de pé atrás de mim e Enzo atrás de sua mesa grande com óculos escuros, literalmente me congelou. Eu vivi lá um momento indefinível. Era uma atmosfera, devo admitir, muito solene, quase opressiva.

Em seguida, iniciamos um diálogo, em italiano, mas surreal, Enzo Ferrari, com um sorriso e uma voz suave: "O pequeno, eu quero você na Ferrari"

E eu: "É impossível, Marco sabe, eu estou na Lotus com o Ayrton" 

Ferrari: "Mas eu quero Ayrton também". 

"Mas eu assinei um contrato..."  

Ferrari: "Não importa, vamos pagar o que for preciso, precisamos de advogados."

Ele tinha rosa post-its na qual escreveu valores em dólares e ele deslizou sobre a mesa em minha direção para me ver bem e ele me disse: "Olha pequeno, olha", então ele continuou a insistir o quanto ele queria que viesse e juntasse à Scuderia.

Fingi não ver e eu empurrei seu papel de forma muito lenta. Certamente ele compreendeu de que eu recusei as suas propostas, ele retomou outro post-it com uma soma maior. Eu nunca irei dizer o dinheiro que eu estava ler, era uma loucura. A entrevista durou um tempo, ele insistiu tanto no assunto que se tornou quase insuportável. Eu tinha um grande respeito por ele e a situação era difícil para mim. Eu não sabia o que dizer para sair dali, e em seguida, tão seriamente quanto possível, disse: "Obrigado por apresentar a sua proposta, é uma grande honra para mim, mas eu não posso deixar a Lotus." Eles me levaram de volta para Bolonha e o avião descolou para Norwich. Mas que história!

Houve uma sequela que teve lugar em Brands Hatch, numa noite no motorhome da Ferrari onde levei Ayrton, ele e eu viviamos um grande momento. Ao vivo, de microfone aberto, uma chamada telefônica entre Enzo Ferrari e Marco Piccinini, onde o engenheiro disse a Marco tudo o que ele pensava dele por não ter convencido a que eu fizesse parte da Scuderia. Ele podia ser violento e eu admito que eu não estava muito orgulhoso de ter sido responsável por esse puxão de orelhas memorável.

JPO - Você manteve objectos, documentos, memórias daqueles anos?

GD - Não, quase nada, eu destruí através dos anos nos trituradores.

O que realmente aconteceu em Barcelona, Fernando Alonso e McLaren?

Sobre as teorias da conspiração, lembro sempre de uma frase dita por alguém - que se varreu da minha memória - sobre as pessoas que que não acreditam que Lee Harvey Oswald matou John Kennedy, há 51 anos, em Dallas: "Ninguém quer acreditar que um homem genial foi abatido por um merdas com muita sorte". As pessoas não querem acreditar na versão oficial porque um dia, no passado, esses oficiais já mentiram. E com essa falha na mente, a confiança já foi há muito para o caixote do lixo da História e parte sempre do principio de que eles mentem, mesmo nas vezes em que dizem a verdade.

Dito isto, quero dizer uma coisa, que já disse ao longo do tempo: a Formula 1 é dos desportos mais opacos que podem imaginar. Os acordos não são divulgados, as contas são raramente divulgadas, excepto aqueles que têm as suas participações na Bolsa, e sempre que se encontra algo do qual é descortinado pelos especialistas financeiros, há sempre a chance de que a complexidade destas instituições fazem com que haja algo que escape às autoridades tributárias, apenas poe simples ganância das pessoas envolvidas, por exemplo. Para não falar das espionagens industriais, outra razão óbvia por o segredo ser constante na área.

Dito isto, vamos ao assunto que interessa: o que aconteceu a Fernando Alonso a 22 de fevereiro em Barcelona? Recebeu um choque elétrico antes de bater no muro de proteção do circuito de Montemeló ou o choque em si causou-lhe um impacto forte na sua cabeça - de cerca de 30 G's - que o deixou contundido e o fez ficar por dois dias no hospital? A McLaren e Alonso disse que foi a batida na cabeça, mas ninguém quer acreditar nisso. Muitos juram a pés juntos que o acidente tem todos os elementos de um choque causado por uma das novas unidades elétricas instaladas no MP4-30, o MPG-U.

Se hoje, quando a McLaren anunciou que Alonso não irá a Melbourne porque os médicos não deixam que ele corra tão cedo para recuperar da pancada da cabeça, a Sky Tv italiana afirma - também hoje - que na realidade, ele sofreu um choque nas costas antes de sofrer o acidente e bater no muro. E disse isso a pessoas próximas dele. Eu francamente, gostaria de acreditar na versão oficial, mas todas as pessoas com quem tenho andado a falar não acreditam em uma unica palavra vinda de Woking. Porquê?

A minha impressão - e não pretendo ser muito especulativo - é que no meio de tanta experimentação, deixaram negligenciar a segurança, neste caso, da tal MPG-U, que não sendo o KERS (Sistema de Recuperação de Energia Cinetica, em português) é um sistema eletrico e como tal, não foram feitas as devidas proteções. Provavelmente por negligência. Uma coisa é certa: o tal sistema foi retirado do carro para o resto dos testes, por precaução. E sim, sofreu um choque antes de bater no muro. Ou seja, a McLaren escondeu a verdadeira razão do acidente.

Claro, isso não invalida uma contusão cerebral. O impacto de um carro contra o muro, mesmo a baixa velocidade, pode causar danos físicos. Falou-se que o choque de Alonso com o muto teve um impacto de 30 G's, e o facto de não se lembrar nada da batida, sofrido uma amnésia e falar em italiano, pensando que ainda estava na Ferrari, poderá significar alguma coisa. Portanto, os que pensam que a contusão é uma desculpa, pode ser verdadeira. E não precisa de andar a 300 km/hora para ter lesões, especialmente num impacto lateral...

Mas qual é a ideia de esconder e não ser transparente? Talvez seja para não dizer que estão a ir longe demais na experimentação de novas tecnologias no MP4-30. Ou então até pode ser por pura politica da empresa, que num mundo da Formula 1 onde todos se escondem de todos e odeiam ser escrutinados, temos situações como estas. E a partir de agora, haverá uma enorme desconfiança - já havia antes, diga-se - em tudo o que se diga sobre situações como esta, quer na McLaren, quer nas outras equipas, ou até na FIA e entre os dirigentes da CVC Capital Partners, os que recebem o dinheiro que Bernie Ecclestone saca da Formula 1 um pouco por todo o mundo.

Simona e o regresso do automobilismo à Suiça

Esta semana, soube de algo muito interessante, mas no meio da história e das "estórias" sobre o estado de saúde de Fernando Alonso, passou despercebido: a Suiça vai levantar a proibição das corridas de automóveis no seu país, uma lei com 60 anos. Contudo, tem um "catch": é apenas aos carros elétricos.

Tudo isto acontece numa altura em que Simona de Silvestro fez por estes dias uma demonstração com o carro da Formula E nas ruas de Genebra (e do qual falo disso no Motordrome Brasil) apoiado por dois dos patrocinadores da competição - por sinal, também suíços - e na semana em que abre portas o Salão Automóvel de Genebra.

A lei foi proposta por um deputado federal, Fathi Derder, e implica o levantamento apenas aos automóveis elétricos, o que poderá dizer que dentro em breve, poderá haver corridas nas ruas de Genebra, Berna ou Zurique, dado que os automóveis elétricos pouco ou (quase nenhum) barulho fazem. A lei foi aprovada para apreciação no Conselho Federal suiço e caso seja aprovada, abrirá caminho a algo que não existe desde 1954. Mas apenas aos carros elétricos...

Interessante também foi ver De Silvestro a bordo daquele carro. Não só para promover a competição, mas também poderá ser um sinal de que a Formula E poderá querer os seus serviços. É que as próximas duas corridas são nos Estados Unidos, lugar onde competiu nas últimas temporadas, ao serviço da IndyCar, e depois da sua tentativa falhada de ser terceira piloto da Sauber, a piloto de 26 anos tenta novo regresso à competição. E acho que dar um volante a ela nas duas corridas americanas seria uma oportunidade bem interessante, pois ela é mais veloz do que as outras duas mulheres, a britânica Katherine Legge e a italiana Michela Cerutti.

Veremos como é que isto acabará. Mas parece que a Formula E está a marcar pontos até em sitios inesperados...

Noticias: Alonso falha Melbourne

A McLaren anunciou esta manhã que Fernando Alonso não alinhará na corrida de Melbourne, sendo substituído pelo dinamarquês Kevin Magnussen. A noticia é o culminar de uma série de dúvidas sobre o real estado de saúde do piloto espanhol, depois do seu acidente a meio do mês passado, durante os testes coletivos em Barcelona.

"A fim de limitar os fatores de risco ambientais, especificamente, os médicos aconselharam que ele não deve competir no Grande Prêmio da Austrália", começa por afirmar o comunicado oficial da McLaren, publicado na Autosport britânica.

"Os médicos de Fernando recomendaram que, na sequência do choque que sofreu num acidente de testes a 22 de fevereiro ele deve procurar limitar, tanto quanto é possível, quaisquer fatores de risco ambientais que poderiam resultar em outro choque tão prematuramente após a sua anterior".

"[Todas estas precauções são] para minimizar as chances de síndrome do impacto em segundo lugar, como é procedimento médico normal quando o tratamento de atletas após o choque", continua.

A equipa acredita que Alonso estará em forma o suficiente para poder alinhar na segunda corrida da temporada, na Malásia, a 28 de março.

"Os médicos de Fernando reconhecem que ele se sente em forma e que se considera apto para correr. E, sendo esse o caso, eles são confortáveis com o fato de que ele já recomeçou os seus treinos físicos, com vista à preparação para um regresso ao cockpit de seu carro para o GP da Malásia."

"Na verdade, os médicos são favoráveis a essa ideia, pois estão satisfeitos com o facto de que ele não sofreu qualquer dano grave durante o seu acidente a 22 de fevereiro", concluiu.

Recorde-se que Fernando Alonso teve um acidente há pouco mais de uma semana, tendo ficado no hospital de Barcelona durante três dias e agora está a recuperar em casa, na cidade de Oviedo. Segundo noticias circuladas ontem, o piloto de 33 anos, bicampeão do mundo em 2005 e 2006, teve uma amnésia e saiu do carro a falar italiano, julgando ainda que estava na Ferrari...

segunda-feira, 2 de março de 2015

A foto do dia

Os comissários de pista tentam tirar o suiço Marc Surer dos destroços do seu ATS nos treinos do GP da África do Sul de 1980, em Kyalami. Surer tinha ambas as pernas fraturadas devido ao seu acidente na curva Crawthorne, numa altura em que o sempre volátil Gunther Schmid tinha reduzido as operações da marca para um carro e despedido o holandês Jan Lammers. Mas com este infortúnio, o holandês é novamente admitido - e iria fazer um espetacular quarto lugar nos treinos da corrida seguinte, em Long Beach.

Mas o mais doido nesse acidente foi que os fãs quiserem ficar com relíquias do carro acidentado. Retirado Surer dos destroços, houve quem ficou com pedaços do carro "para mais tarde recordar" e o bólido regressou às boxes com peças a menos, o que não deve ter agradado muito aos mecânicos da equipa alemã.

Mas esse foi um fim de semana complicado em termos de acidentes. Alain Prost, ainda no seu terceiro GP da sua carreira, fraturou um dos pulsos depois de bater também na qualificação com o seu McLaren, e iria faltar a corrida seguinte, em Long Beach.

Quanto à corrida, foi "só" Turbos, com René Arnoux a conseguir a sua segunda vitória consecutiva, na frente dos dois Ligier de Jacques Laffite e Didier Pironi.  

A entrevista a Gerard Ducarouge (parte 3)

(continuação do capitulo anterior)

Na terceira parte da entrevista a Gerard Ducarouge, feita por Jean-Paul Orjebin, feita em 2012, ele fala sobre as suas passagens pela Alfa Romeo e pela Lotus, assim como alguns dos episódios que marcaram a sua carreira, como por exemplo, os atritos entre ele e Carlo Chiti, e o trabalho louco que teve para construir um carro como o 94T, em meados de 1983, seis meses depois da morte de Colin Chapman.

JPO - Após 6 anos de Ligier, você sai e junta-se a Chiti na Alfa. Você gosta de conviver com personagens difíceis, ao que parece.

GD - Guy Ligier poderia ser de uma bondade e generosidade excepcional, mas nem sempre é fácil. Quando ele começava a gritar, sua comitiva ficava apavorada. De qualquer forma eu tenho dele um grande carinho. Fizemos juntos a primeira vitória de um F1 100% francesa, com um carro francês e piloto francês, Jacques Laffite, e logo de seguida, um monte de bons resultados, mas nós éramos poucos, e o orçamento era apertado, tivemos que trabalhar muito duro.

Despedi-me da Ligier após uma situação um tanto curiosa. Eu vim para casa a partir de Silverstone, foi um domingo, uma vez que o GP foi realizado no sábado [GP da Grã-Bretanha de 1981], eu vou ter com Guy ao Chateau des Brosses. Quando eu chego, eu cruzo com Jean-Pierre Paoli, que tava de saída, e fiquei um pouco surpreso ao vê-lo ali. Então, no início de nossa conversa com Guy, eu imediatamente senti que havia uma confusão, ele falou no estilo, 'nós temos que falar, você deve alterar a organização', etc. Eu percebi que eu não tinha mais lugar por ali. Senti-me mal, pois em Silverstone as coisas correram bem, e Jacques tinha sido terceiro. Eu sabia que estávamos evoluindo, recebemos uma modificação que nos permitiu ter umas saias super eficientes com um elastômero especial. Em Zeltweg, onde existe um monte de apoio aerodinâmico, eu sabia que poderia surpreender a todos. E Jacques venceu em Zeltweg. Eu falo com Guy muitas vezes, e sei que o prazer [das vitórias] é compartilhado e isso é ótimo.

De qualquer forma, depois da grande decepção para deixar uma equipa que eu gostei muito de lá estar, é Alfa Romeo que estava a pedir-me para ir a Milão e trabalhar com eles, eu aceitei. Soube depois disso que foi Mario Andretti, que sugeriu o meu nome a Massacesi, o presidente do Grupo, e à Autodelta, o departamento de corridas da Alfa.

Eles estavam baseados em Settimo Milanese, na periferia de Milão, perto do Estádio San Siro. Na fábrica eles estavam a preparar os motores GTV e onde havia um cantinho bem rançoso reservado à Formula 1. Carlo Chiti, teoricamente, mandava naquilo. A lua de mel não durou muito tempo. Eu gosto de trabalhar num local limpo e organizado, e nesse lugar, Chiti armazenava todo o seu lixo, peças, carrocerias, etc. Havia coisas que ele tinha mantido desde o início de sua carreira! Era uma verdadeira bagunça que enchia uma grande área de cerca de 500m², que consegui transformar num workshop de Formula 1. Depois de mover essas antiguidades de lá, a nossa relação estava seriamente degradada.

Ele reinava como mestre e senhor da Autodelta desde a sua criação, mas a gestão do grupo começou a recuperar o controle do departamento de competição. Por isso, foi um pouco complicado para mim ter como patrono Chiti diáriamente, e se encontrava-me ocasionalmente e muito em segredo com o chefe do grupo, o dottore Massacesi. Havia também um diretor da Autodelta que controlava mais ou menos o Chiti. Foi ele quem me deu a luz verde para criar a oficina Formula 1. Chiti, é claro, não gostou.


Andávamos em briga constante. Felizmente consegui atrair para o meu lado a maioria do pessoal da Formula 1, particularmente no departamento de pesquisa onde o trabalho no projeto de futuro modelo de Formula 1, o 182, progrediu muito bem. Era muito importante, tinha o apoio incondicional de Mario Andretti, que estava recebendo pouco mais do que resultados respeitáveis ​​com o 179, que tinha conseguido corrigir um pouco. Apesar disso, tive de enfrentar uma greve geral, porque eu decidi criar um espaço reservado quando decidimos construir o corpo do novo 182. Eu fiz isso para que praticamente ninguém pudesse ver ou saber o que estava acontecendo por trás daquelas paredes e, claro, não corria o risco de que termos uma foto-espia que é tirada e é encontrada por acaso numa das revistas da especialidade!

Todos esses problemas secundários não me impediam de tentar fazer um bom chassis de Formula1. Nos nossos primeiros testes em Paul Ricard, Giacomelli quebrou o recorde do circuito (com o motor Alfa V12 atmosférico), e isso significava que o carro era bem-nascido, e confirmou sua boa forma depois.

O que foi menos divertido é que sofria ataques na imprensa italiana sobre a minha pessoa. Quando digo imprensa italiana, gostaria de salientar que era a "Rombo". Chiti perguntava ao seu amigo Sabbatini, o diretor de Rombo, para "alinhar", tanto quanto possível no seu lado e escrever porcaria, no estilo do "Duce Rosso", etc. Eu não podia fazer muito contra o jornalista, porque na Itália, pelo menos na altura, não poderia acusar uma pessoa por difamação. Eu levei um advogado e quando soubemos que a Rombo era distribuída em algumas livrarias francesas, sobretudo em Nice, montamos uma pasta.

Um dia, em Monza, vejo o Sabbatini, eu explico olhos nos olhos como eu estava cansado dos seus artigos, mostro-lhe o arquivo que tinha preparado e avisei que o negócio poderia custar-lhe alguns bilhões de liras, se continuasse a escrever aquelas coisas sobre mim. Ele leu rapidamente o registro e estava muito assustado. Pediu-me desculpas e prometeu-me iria parar, ele me disse que tinha sido feito a mando de Chiti, que lhe pediu para escrever esta porcaria sobre mim no jornal.

Na terça-feira após essa reunião, no dia em que saiam os semanalmente, eu ia à meia-noite - como acontecia todas as semanas - para a Estação Central de Milão e comprar os semanários Autosprint e Rombo. Da Rombo havia quatro páginas elogiosas para mim! Era assim a minha vida... em Milão.

JPO - E o episódio do extintor de incêndio vazio, o que aconteceu realmente?

GD - No GP da França, em Ricard, o De Cesaris tinha tido o melhor tempo nos treinos de sexta-feira. Eu estava na caravana, quando o Chiti vem para avisar que havia uma inspecção técnica no carro, eu não fui ter com eles porque sabia que isso era normal. Chiti insistiu comigo para que eu estivesse presente. Quando os comissários verificaram o carro, eles encontraram o extintor vazio! De Cesaris foi sancionado e desclassificado. Eu nunca soube quem tinha feito o trabalho, mas eu não tinha nenhuma dúvida a respeito de quem tinha ordenado. Na verdade, Chiti não suportava que o carro pudesse ter um bom desempenho quando perdeu o controle da equipa, isso aconteceu na altura em que a Scuderia era supervisionado por Pavanello e companhia. E isso foi demais para mim, isso marcou o final da minha aventura em Milanese.

JPO - Acaba por ir para a Lotus. Seis meses após a morte de Chapman, devia ser intimidante para suceder a uma personalidade dessas...

GD - Em primeiro lugar, ninguém pode imaginar ser capaz de substituir um homem como Colin Chapman. Mas, antes de falar sobre a minha aventura inglesa, devo primeiro contar uma história para explicar que a minha entrada na Lotus foi contemplada por algum tempo. Chapman, poucos meses antes de sua morte, quase me sequestrou em Ricard e conseguiu me convencer a ir com ele no seu avião particular para ir a Inglaterra e visitar a Team Lotus. Pousando na sua pista e visitar o seu castelo. Já era tarde, era quase noite, e foi surreal, eu me senti como se existissem fantasmas por toda parte. Era impressionante o salão do castelo de Ketteringham!


Ele mostrou-me o seu estúdio, onde estavam armazenados todos os seus Formula 1. Foi ótimo, mas havia tantos lugares que eu me perguntava como eles poderiam mover todos aqueles carros. Num dos pilares, pendurado numa corda, eu vejo uma espécie de notebook com um monte de coisas escritas. Era o que se poderia chamar a lista de queixas onde, de forma anônima, poderiam escrever uma idéia, uma queixa ou um julgamento, falando livremente, um conceito tipicamente britânico. Ao folhear o livro, vejo coisas como "Mansell faria melhor em ir pescar", ou "Nigel não levanta o seu rabo gordo", ninguém parecia ser poupado, até mesmo a direção da equipe, exceto Chapman. 


De repente, eu leio uma coisa inimaginável para mim, "Escreva ao Mitterrand para libertar o G. Ducarouge." Lia-o neste livro, eu pensei, 'neste canto remoto da Inglaterra, muito britânico, o francês deve ser detestado'. Estava em Norwich, Inglaterra profunda, e ligeiramente perdido. Eu mal imaginei um "froggie" na Lotus... essa pessoa deveria ser logo abatida.

Chapman preparou um gabinete para mim e me mostrou, tentando convencer-me a assinar. Eu não estava pronto, recusei a proposta. E, no entanto, poucos meses após a morte de Colin, eu me encontro na Lotus, neste imenso escritório, com grandes janelas e com vista para um lindo jardim de rosas. Mobiliário antigo, mas com todo o direito em sentar nele. Era soberbo, mas as instalações não eram especialmente adequados para a Formula 1.

Um dia antes de trabalhar, Peter Warr me mostrou o Formula 1 com a qual eles estavam a correr nessa temporada, o 93T. Eu disse-lhe logo de imediato: "Este carro, como está concebido, não é facilmente modificável, não é nada do que eu esperaria de um Formula 1, com um motor pequeno em um escudo monstruoso, etc". Então eu disse a Peter que não sabia se tinha um grande orçamento, mas de qualquer maneira, eu consideraria praticamente fazer tudo de novo. Pedi para ver o pequeno quadro do carro anterior, o 91. Ele me levou para o quarto que servia como um museu, Madame Chapman, e vejo que, nessa base em que quadro minúsculo poderia certamente fazer algo muito rapidamente. Eu já podia ver mentalmente onde eu estava a colocar o radiador, o pequeno tanque de combustível, porque nessa temporada poderia reabastecer. Tivemos que refazer todas as suspensões e suas conexões no chassis de carbono, que fixa a ligação ao pequeno Renault V6. Tudo isso foi um enorme trabalho, quase impensável, mas sabia que na base dessa estrutura pequena, senti que ele iria me agradar. Eu também sabia que o orçamento iria explodir, iriamos trabalhar dia e noite e teríamos subcontratados que, nessa emergência, nos cobrariam o dobro ou o triplo pelas peças.

Tivemos um mês e meio, nós tivemos que ter o carro pronto antes do GP da Grã-Bretanha, os americanos, que patrocinavam a Imperial Tobacco, faziam questão que tivessmos bons resultados no GP da Inglaterra, pois começavam a ficar nervosos por ver a Lotus na parte de trás da grelha.

Eu tive uma reunião na manhã seguinte, e eu disse a toda a equipa que tínhamos que fazer tudo isso, tivemos uma enorme programa para reconstruir completamente o carro e quem não quisesse, estava livre de sair de imediato. Eu não os culpo, porque seria um trabalho extremamente difícil e sem nenhuma garantia de resultados. Silêncio de morte na sala, ninguém se levantou e, na manhã seguinte começamos o trabalho. Eles começaram a trabalhar como selvagens, eles realmente me impressionaram. As esposas iam à fábrica para trazer o tipico peixe padrão e batatas fritas e galões de chá para os maridos, para que perdessem o tempo mínimo possível. Eles estavam curiosos para ver como é que o "froggie" que falamos anteriormente estava fazendo os seus maridos trabalhar que nem escravos.

Sabia que alguns dos funcionários tinham conhecimento das intenções de Chapman em ter-me entre a sua equipa. Bob Dance, um mecânico-chefe impressionante, sabia que ele tinha falado com os outros; não podemos esquecer que tudo isso acontece apenas seis meses após a morte dele. Todos eles tinham o mais profundo respeito por ele. Além disso, era plenamente justificado, Chapman para todos eles, era o Sr. Fórmula 1, mas ele tinha um temperamento ruim, picava toda a gente, mas era um tipo excepcional. Para toda a eternidade, foi Chapman que marcou a Formula 1. Ele não ganhou sete títulos de campeão do mundo por acaso.

Conseguimos cumprir o nosso desafio louco, 30 dias após a minha chegada, com dois 94T em Silverstone, para o GP. Elio de Angelis foi apenas fez uma volta em Donington, e Nigel Mansell, por causa de um problema elétrico, nao conseguiu fazer qualquer volta, logo... zero km. No primeiro teste oficial: o melhor tempo... Elio de Angelis! Ninguém conseguia acreditar no paddock, inclusive eu mesmo! Que alegria para toda a equipa!

Nigel, que não tinha rodado no seu 94T, estava longe no ranking, mas na verdade era quase feliz como Elio. Ele acabou por parar na terceira volta da corrida por uma quebra no turbo e Mansell, que estava mostrar que o seu carro não era um táxi, fez uma corrida memorável do 21º lugar no grelha para o quarto lugar, lutando com Arnoux que fez o seu melhor para ficar com lugar no pódio. Mansell foi a estrela desta corrida. Não tenho palavras suficientemente fortes para descrever a atmosfera em torno da Team Lotus... que tinha ressuscitado.

Na Lotus, eu certamente experimentei o período mais louco da Formula 1. Em 1979-1980, a F1 teve um desempenho incrível com a chegada das saias laterais. Os valores da aceleração lateral já andavam à volta dos 4 G's algumas curvas. Era perigoso o suficiente para caso prendesse uma saia, ou deslizasse mal, o piloto poderia ter um acidente muito grave devido à súbita perda de aderência. Sabíamos que fazíamos, era quente, mas tivemos que mudar... Então chegamos a ter de tirar a potência nos pequenos motores turbo de 1,5 litros, [pois tinhamos] mais de 1300 CV na qualificação. 

Nós tínhamos a pressão das mais altas em termos de desempenho dos turbos, pois estavam a se aproximar dos 5 bares. Estávamos todos  a cair no irracional, os gases eram perigosos de manusear, você tinha que usar uma máscara e proteger suas mãos. Foi uma guerra em relação ao desempenho. Como se isso não fosse suficiente, começamos a esfriar o combustível para a corrida, para valores de -15, -20 ° para aumentar a sua quantidade no tanque, tinhas a possibilidade de utilizar mais. Às vezes, por causa do bloqueio das bombas de gasolina ou pior, você podia danificar o chassis devido à expansão da gasolina.

Para fazer um teste, o suficiente para o Ayrton era ter um Lotus 97, com 5 bares de pressão com brilhante V6 Renault para uma volta, porque os pneus de qualificação duravam isso e novos turbos especialmente feitos para a qualificação. Para fazer a segunda rodada da qualificação, você só tinha que mudar os turbos  - que chegam às boxes a mais de 1000 graus, pneus, gasolina pura para uma mini-loucura... tivemos 9 poles com o Ayrton!

(continua)