A qualificação do GP da Hungria de 1989, que aconteceu faz agora 35 anos, ocorria numa altura bem interessante na Formula 1 e no mundo. Com a competição a acolher um novo regulamento de motores, atmosféricos e de 3,5 litros, depois de largarem os Turbos, e com o pelotão mais alargado de sempre, com quase duas dezenas de equipas e 38 carros, iam no meio do verão para a Hungria, que tecnicamente ainda estava no outro lado da Cortina de Ferro, mas eles mesmos tinham já cortado o arame farpado que separava ambos os blocos, e tinha causado um êxodo entre os alemães do leste, que nos seus Trabants e Wartburgs, tinham fugido primeiro para a Checoslováquia, e depois, para a Hungria, antes de atravessarem a fronteira para a Áustria, e depois, para a Alemanha Ocidental.
Mesmo a própria Hungria tinha decidido que ficar no bloco oriental era inútil e decidiu fazer reformas democráticas, como tinha feito a Polónia, em junho. E outros sabiam que os seus dias estavam contados, porque a União Soviética, sobre Mikhail Gorbatchov, tinha de se reformar, para não morrer. Ou se calhar, teria chegado tarde demais, até para se reformar.
Mas ainda estamos em agosto de 1989. Outras tempestades existiam mais perto. Como a tempestade entre Ayrton Senna e Alain Prost, que destruía a McLaren por dentro, mas não impediria de fazer aquela equipa vencedora, graças aos bons chassis e os motores Honda de 10 cilindros.
E era isso que se via na primeira linha da grelha... mais ou menos. Ali, o melhor tinha sido Riccardo Patrese, que mostrava ao mundo que o motor Renault de 10 cilindros poderia ser um bom rival para os Honda. Afinal de contas, era a segunda pole da temporada para o veterano piloto italiano. Senna era segundo, mas logo a seguir, uma pequena equipa comemorava a sua melhor posição de sempre pelo seu piloto. Era a Dallara, graças a outro italiano, Alex Caffi, que tinha superado, entre muitos outros, Thierry Boutsen, no seu Williams, o segundo McLaren de Alain Prost, e os Ferrari de Gerhard Berger e Nigel Mansell.
Na realidade, Dallara era o nome do chassis, não da equipa. O seu nome era Scuderia Itália, e vale a pena contar a sua história. E o homem por trás dela, Beppe Lucchini.
Nascido em 1952 em Brascia, fundou a Scuderia Itália em 1983, aos 31 anos, e depois de ter feito uma licenciatura na Universidade de Pavia. Chamado inicialmente de Brixia Motor Sport, começou nos ralis, apesar de Lucchini ter feito corridas de montanha num Osella. Andou em Alfas Romeo, Lancia - um 037 - em 1987, decidiu ir para o Mundial de Turismos com um 75, antes de dar o passo mais ousado: a Formula 1. Decidiu fazer um protocolo com a Dallara, para construir um carro a partir de um Formula 3000, e contratou um talentoso jovem piloto, então com 23 anos, Alessandro Caffi.
A primeira corrida deles, em Jacarépaguá, foi num Formula 3000 modificado, porque o chassis não estava pronto a tempo. Projetado por Sergio Rinland, e com um motor Ford Cosworth atmosférico com os novos regulamentos dos 3.5 litros, o carro ficou pronto para correr em Imola, e até ao final da temporada, não conseguiu qualquer ponto, embora tenha ficado à beira no Estoril, quando acabou em sétimo.
Na temporada seguinte, constratou um segundo piloto, o seu compatriota Andrea de Cesaris. O modelo 189 tinha sido desenhado por Mário Tolentino, ex-Alfa Romeo, as coisas correram bem desde o inicio, mas a má sorte, e alguma alta de noção os impediu de marcar mais pontos que conseguiram. Dois exemplos tinham o nome de De Cesaris: no Mónaco e em Phoenix, duas corridas citadinas.
Na primeira, ele ia a caminho de um nom resultado quando chegou ao gancho do Hotel Loews, e deu de caras com o Lotus de Nelson Piquet, no qual dava... uma volta de avanço. Só que nesse momento, o brasileiro enganchou no seu carro que tirou a chance de conseguir os primeiros pontos da equipa. Acabaria por ser Caffi que conseguiu, com um quarto lugar. Mas duas corridas depois, era Caffi que ia a caminho de um possível pódio numa corrida de sobrevivência debaixo do calor de junho no Arizona, quando ia dobrar... De Cesaris. E em vez da solidariedade entre companheiros de equipa... ele empurrou-o contra a parede! Ele justificou que não o tinha visto, mas a sua reputação fora para o fundo da tabela... até à corrida seguinte, no Canadá, quando deu o primeiro pódio da equipa, um terceiro lugar. Caffi foi sexto. Com oito pontos, eles eram nessa altura quintos no campeonato!
Não tinham mais pontuado até à Hungria, mas ali, aquele terceiro lugar na qualificação tinha sido um milagre, mais que os talentos de Caffi, que certamente tinha. Aos 25 anos, parecia que poderia conseguir algo histórico. Afinal de contas, aquela pista era travada, os Pirelli sacavam alguns milagres para eles, principalmente no calor... tudo iria correr bem no dia seguinte.
O resultado final é que... não. Eles ainda não sabiam que não pontuariam mais no campeonato, mas aqueles oito pontos que tinham iriam ser históricos na Scuderia Itália. Eles iriam continuar até 1993, quando fundiram com a Minardi, mas aqueles eram os seus melhores dias na Formula 1.