A noticia do despedimento de Gunther Steiner da Haas foi chocante, para dizer o mínimo. A razão é simples: para além do ado inesperado da coisa, Steiner era uma personagem carismática, especialmente depois da sua passagem pela série "Drive to Survive", uma das séries de maior sucesso da Netflix. Contudo, menos de uma hora depois, as redes sociais estavam cheios de reações ao despedimento de Steiner, e 95 por cento das pessoas que reagiam, diziam o mesmo: que venda a equipa para a Andretti.
Claro, Gene Haas reagiu afirmando que a equipa não está à venda, que não desistiu do projeto. Disse o seguinte à Formula1.com. “Não entrei na Fotmula 1 para vender. Fi-lo porque queria correr. Günther tinha a mesma opinião. Não estamos aqui para ganhar dinheiro, queremos correr e ser competitivos. Se olharmos para qualquer equipa, historicamente, têm tido muitos anos bons e muitos anos maus”.
Na mesma entrevista, Haas desmentiu também a ideia de que não investe no projeto, embora admitisse que tinha de ser mais eficaz com os gastos. “Há a perceção de que gastamos muito menos dinheiro [do que os adversários]; normalmente, estamos a menos de 10 milhões de dólares do limite orçamental”, explicou o norte-americano. “Só acho que não fazemos um bom trabalho ao gastar esse dinheiro. Muitas equipas fizeram investimentos anteriores em infraestruturas, edifícios, equipamentos e pessoal. O nosso modelo consistia em subcontratar muitas dessas coisas. Gastamos muito dinheiro. Não ultrapassamos o limite máximo, mas estamos muito perto dele. Só não acho que estejamos a fazer um bom trabalho ao gastá-lo da forma mais eficaz”, concluiu.
Contudo, quando lês gente como Ben Anderson, no site the-race.com, mostra o estado atual da Formula 1: não querem aventureiros, não querem aventuras. Os tempos de 2010, quando houve 12 equipas na grelha, terminaram. E a Liberty Media, mesmo que tenha conseguido estancar a hemorragia dos orçamentos sem freio, deixaram o recado: nem mais, nem menos que 10 equipas, 20 lugares. A Andretti, se quiser entrar, a condição é esta: compre um lugar de uma das equipas presentes. E agora, o que o mundo da Liberty Media está a dizer a Michael Andretti é: fiquem com a Haas e ele, mais a sua parceira, a Cadillac, são bem-vindos.
O espirito da Haas, quando surgiu em 2014, era este: Steiner foi ter com Gene Haas e afirmou ao que ia. Queria "estabelecer uma equipa de Formula 1 que não se baseasse em investimentos maciços em infraestrutura, mas sim em alianças e na compra de tudo o que era permitido pelas regras da altura. E foi o que aconteceu. Desde então, os regulamentos foram ajustados para impedir que a mesma coisa acontecesse novamente e hoje os carros da Haas são projetados pela própria equipa, reconhecidamente baseada no campus da Ferrari em Maranello. Eles não são funcionários da Ferrari, embora muitos já o tenham sido. Os carros são fabricados pela Dallara e estão equipados com motores e caixas de velocidades da Ferrari, além de certas peças de suspensão e outros mecanismos permitidos. Porém o monocoque e as superfícies aerodinâmicas são projetadas pela Haas, embora utilizando o túnel de vento da Ferrari. Mas ainda assim é uma forma econômica de competir."
Esta explicação não é minha, daí ter colocado entre aspas. Foi feita pelo Joe Saward no seu blog. Mas a ideia era seguir um pouco a então Toro Rosso, mas não na ideia de ser uma "equipa B" da Ferrari, porque agora, como já leram, a própria Formula 1 não deixa mais.
Os resultados da Haas, embora sendo muito melhores que o trio de equipas que entraram em 2010 - Caterham, Hispania e Marussia - não conseguiram alguns resultados que desejariam, provavelmente, ter obtido. Apesar de uma pole-position e duas voltas mais rápidas, nunca subiram a um pódio e em 2021, conseguiram... nenhum ponto, com Serguei Sirotkin e Mick Schumacher aos comandos dos seus carros. A ideia dos críticos parece ter alguma razão: parece que Gene Haas, sempre discreto nos bastidores, tem andado algo forreta em termos de investimento, apenas esperando por receber a sua parte no bolo que a Liberty Media dá às equipas. E mesmo com Steiner a dar a cara, Michael Andretti tem mais mediatismo, por causa do seu palmarés no automobilismo, quer como piloto, quer como dono de equipa.
E eles podem dar-se a esse luxo porque, uma década antes, a Formula 1, ainda com Bernie Ecclestone ao leme, esteve muito próxima de ter uma das grelhas mais pequenas da sua história, pois para além das três que foram embora, teve a Sauber no limiar da sobrevivência, a Renault a correr para salvar a "Lotus", e a Force India, a independente mais eficaz, a colocar em dúvida a sua continuidade por causa do aumento dos custos. Em suma, a Formula 1 estava perto de ser canibalizada.
Agora, as coisas estão salvas. O "cost cap", o controlo de custos, estabilizou os orçamentos, quase todos dão lucros - a Haas tem prejuízos, mas são da ordem dos 10 milhões de dólares por temporada - e a Formula 1, sob gerência da Liberty Media, ganhou um enorme mediatismo, logo, atraiu mais dinheiro e fãs para a competição... e americanizou-a, ao ponto de, de vez em quando, se ouvir que existe o interesse dos sauditas em adquiri-la, e por valores agora considerados "absurdos": 20 mil milhões de dólares. Para terem uma ideia, em 2017, a Liberty pagou oito mil milhões para tirar do controlo de Bernie Ecclestone.
E todo este luxo sobre como é que as equipas devem entrar na Formula 1 é tal que, eles comportam-se como se forem os donos da competição. Desprezar a FIA, que autorizou a entrada da Andretti em 2025, ao ponto de entrarem em conflito com Muhammed ben Sulayem, o seu presidente, é o seu sinal ao mundo afirmando que "querem, podem e mandam", não porque fizeram as regras para que tal acontecesse, mas porque aproveitaram as regras que existiam quando há 20 anos, se elaborou o "acordo dos cem anos", entre FOM e FIA (obrigado, Bernie e Max!). E agora, se a aposta de Las Vegas der muito certo - é a única corrida que a Liberty paga do seu bolso - então, os últimos laços com a FIA podem ser cortados e eles farão o que quiserem com ela. Até vender para os sauditas. E afirmar quantas equipas é que deixam correr.
E claro, nenhuma delas é dona no seu lugar. Nem Ferrari ou McLaren, as mais antigas do pelotão.
Portanto, no final do dia, o conselho está dado: gostamos dos esforços, mas achamos que, se queremos uma equipa americana, Andretti soa melhor que Haas, e sem Steiner, venda a equipa por um bom preço. De preferência, antes do final da temporada. Os outros fazem isso e não dói muito. Afinal de contas, esta é a nova Formula 1.