"Penso que nos próximos anos a Europa vai passar a ter só cinco corridas. A Europa está acabada! Será um bom local para fazer turismo, mas a Europa é uma coisa do passado. Tem sido a casa espiritual da Fórmula 1, mas..."
Bernie Ecclestone ao jornal espanhol Marca, 30 de novembro.
Normalmente não ligo nenhuma a Bernie Ecclestone e às suas declarações, porque sei perfeitamente que não são para serem levadas a sério, mas mesmo nada a sério. Já faz isso há mais de 40 anos e a história prova que só diz isso para fazer manchetes de jornais. Aliás, acho que daria para outro livro sobre ele. Reparem: se algum dia ele falar à imprensa que "vamos ao Bahrein custe o que custar", então ele não sabe, ou oculta, o facto de que, por exemplo, as autioridades americanas e britânicas desaconselharem os seus cidadãos a irem para o pequeno emirado no Golfo. E para além disso, as seguradoras simplesmente o encostariam à parede, ameaçando cancelar os seguros dele mesmo, da Formula 1, das equipas, dos pilotos, etc...
Logo, as suas declarações não seriam dignas de comentários meus, mesmo estes sobre o "fim da Europa". Mas como nas lendas, há um fundo de verdade nos disparates de Ecclestone. Primeiro, por causa da situação que se vive na União Europeia, e segundo, por causa da fome do octogenário britânico por circuitos mais exóticos e de organizadores papalvos que estejam dispostos a dar aviões cheios de dinheiro ao "anãozinho tenebroso", em troca das suas exigências cada vaz mais loucas.
Hoje em dia, quase ninguém paga os trinta ou mais milhões de euros por ano que ele exige na Europa. Lugares como Spa-Francochamps, Nurburgring, Hockenheim, etc, têm constantes prejuízos na organização dos Grandes Prémios de Formula 1, não porque hajam menos gente, mas porque os bilhetes são caros e Ecclestone, através da sua FOM, qual sanguessuga de dinheiro, aumenta cada vez mais as exigências. É certo que em cada contrato, ele exigem um aumento de dez a quinze por cento do valor inicial. Se um circuito ou um país lhe pague inicialmente vinte milhões, no final de cinco anos poderá acabar a pagar 50 por cento mais, por causa dos dez por cento de aumento por ano.
A sorte da Europa é que ele exige pagamento em dólares, que está num valor mais baixo do que o euro, a moeda do qual espanhois, italianos, alemães e belgas pagam. Os britânicos pagam em libras, uma moeda ainda mais valorizada do que o euro e o dólar. Mas a Europa vive tempos díficeis, como é sabido. O crescimento estagnou ou diminuiu - ou seja, recessão - a União Europeia vive uma crise por causa da sua moeda, e que, num extremo, poderá acelerar o seu fim, caso o euro se desmembre, e no final, temos países que tem de recorrer à ajuda do Fundo monetário Internacional (FMI) e do Banco Central Europeu (BCE). Grécia, Irlanda e Portugal já recorrem à ajuda, mas em breve se fala da Itália e da Espanha, com imensa gente a dizer que caso ambas peçam ajuda ao mesmo tempo, será o fim da Europa tal como a conhecemos.
De uma certa maneira, entendo o espírito do Bernie. "A Europa já deu o que tinha a dar, vou manter um esqueleto para dizer que a Formula 1 tem raízes europeias e não perder o público europeu", deve pensar. Uma corrida em Silverstone, uma em Monza, outra em Espanha, uma na Alemanha e a do Mónaco, e está ótimo. E claro, pode exigir as suas somas brutais do costume para uma corrida no México, Africa do Sul, Cazaquistão, Angola, Arabia Saudita... enfim, em todos os sitios onde haja uma autoridade suficientemente irresponsável para rebentar 150 a 200 milhões de euros para construir um circuito desenhado pelo arquitecto do costume, Hermann Tilke, e essas autoridades pagaram 50 milhões de dólares por ano, não se importando se no final do contrato estarem a pagar cem milhões. Afinal de contas, cinquenta por cento entram nos cofres do anãozinho...
Vão me perguntar se acham que isto é o futuro. Até pode ser. Mas Ecclestone não viverá para sempre, nem a crise é eterna. As coisas acalmarão um dia e o anãozinho tem um AVC no meio de uma pista qualquer e vai ter com o Capeta, que o mandará para a sua ala VIP, ao lado dos bigodes do Estaline, Hitler ou do Saddam. E provavelmente, algum bom senso chegará à Formula 1, embora tenha a impressão que quando ele morrer, a FOTA atirar-se-á aos direitos comerciais, qual pitbull a um osso de dinossaurio. Essa é talvez a minha nuvemzinha negra em relação ao futuro da Formula 1...
P.S: Ao mesmo tempo que escrevia este artigo, o jornalista britânico Joe Saward também dava as suas impressões sobre as declarações do Bernie Ecclestone. Mais objetivo e mais especifico do que eu, explica no seu post também explica o que é que a frase dele significa e porque é que, provavelmente, essa história das cinco corridas pode nunca passar do "soundbyte do dia". Numa palavra: contratos...
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