terça-feira, 29 de novembro de 2011

Para Graham Hill

Caro Graham:

Falhamos por muito pouco. Eu vim a este mundo oito meses depois de você se ter ido embora de repente, sem se despedir de ninguém, numa noite de nevoeiro, a bordo do avião que você pilotava, num campo de golfe no norte de Londres, e trazendo consigo boa parte da sua equipa: o seu jovem e talentoso piloto, Tony Brise, o seu projetista Andy Smallman e alguns mecânicos. E o seu carro já demonstrava potencial, depois de uma primeira época algo interessante nas pistas. Tinha um bom patrocinio e pilotos talentosos. Hoje em dia há quem diga que Brise poderia ter sido campeão do mundo, caso tivesse tido mais tempo... o seu companheiro de equipa por algumas corridas, o Alan Jones, conseguiu através do Frank Williams.

Para a história ficou-me um exemplo de persistência e versatilidade, mais do que resistência. Achou por bem querer continuar a sua carreira automobilística muito para além do razoável, numa altura em que morrer num carro era bastante mais fácil do que agora, os tempos em que vivo. Correu todo o tipo de carros e conseguiu vencer em quase todos os locais míticos. Ganhou em Le Mans, com um Matra - e até testou um dos seus carros de Formula 1! - ganhou em Indianápolis, não com o Colin Chapman, e ganhou cinco vezes no Mónaco, dois dos quais nos carros dele. Coroaram-lhe como o "rei", antes de um novo candidato ter aparecido. Escuso de o apresentar, pois lá onde quer que esteja, já se devem ter cruzado. E provavelmente deve ter falado bem do seu filho Damon.

Querer correr até à idade de Juan Manuel Fangio até pode ser o sonho de muita gente, mas acho que - na minha opinião e critica puramente pessoal - que exagerou. Deve ter sido um pouco penoso ver os seus fãs a reclamarem do fato de você não ter abandonado depois do seu acidente em Watkins Glen, apesar de eu mesmo ter compreendido vê-lo a entrar num dos Lotus do Rob Walker para demonstrar que ainda continuava em forma. Mas não mais venceu corridas, não é verdade?

Contudo, eu admiro a sua parte final da sua carreira por ter feito algo que, na minha opinião, poderia ter feito um ou dois anos antes: montar a sua equipa. Fê-lo em 1972, depois daquele anãozinho novato, o Bernie Ecclestone o ter corrido da Brabham. Demorou a erguer a sua estrutura, mas já ia no bom caminho, digo eu. Mas acharia que era escusado ter corrido ao lado de pilotos vinte anos mais novos do que você, por exemplo. Perdia parte da piada vê-lo ao lado de um Niki Lauda ou de Jody Scheckter, que eram vinte anos mais novos do que você! Ainda bem que teve tempo para consciencializar que o seu tempo chegara ao fim, e que seria mais útil estar à frente da sua equipa.

Curiosamente, nos meus dias há pilotos que tem a sua idade e estão a cometer os mesmos erros que você. Não é só porque eles queiram, é também porque as suas equipas também acham que o melhor é ter alguém experiente do que um jovem ainda com borbulhas na cara e que acha que os carros é só acelerar. E como você, alguns desses "velhotes" são campeões do mundo... parece que estou a ver: a história repete-se, será que vai ser como farsa?

Perdoe-me o meu desabafo, caro Graham. Decerto que você deve estar a sorrir ao ver como andam as coisas por aqui. Não se importa que diga que estou ansioso para que a Natureza cumpra o seu papel e se livre do anãozinho o mais depressa possivel. Como dizia um dos seus recém-chegados, o Steve Jobs, que a morte tem o papel de fazer sair o velho e trazer o novo. Nestas nossas bandas, tenho a sensação de que a Formula 1 precisa de uma certa maneira, novas ideias, novas caras e um novo papel. Ver isto como uma espécie de "feira de vaidades" onde as equipas estão dependentes dos petrodólares, onde as boxes mais parecem hospitais do que oficinas, onde se dá mais importância ao VIP qualquer do que um ex-piloto de Formula 1 que ainda anda por aqui - ainda bem que nos deixaram muitos exemplares, e agradeço por isso - por vezes cansa-me e entristece-me.

Mais uma vez, queira perdoar-me por qualquer desabafo que tenha consigo. Não é culpa sua, apenas é alguém que gosta do automobilismo e olha muitas vezes no passado e pergunta-se onde é que eles cortaram para a direita no cruzamento, quando deveriam ter cruzado para a esquerda. Havia coisas que eram inevitáveis, e fizeram muito bem, mas há ali certas coisas do qual se perdeu - digo eu - alguma da alma. Enfim, onde quer que esteja, espero que estejam todos a dar-se bem.

Caso os veja, dê um abraço ao Jim, ao Jochen e ao Colin, e diga a ele que, apesar dos dramas, confusões e coisas que tais, a sua marca continua forte, como sempre. Apesar de ser mais nome do que outra coisa, digo eu... ah! e já me ia esquecendo: dê outro ao Tony, da minha parte.

Um abraço, de um seu fã, e espero que um dia, nós nos possamos conhecer.

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