terça-feira, 15 de abril de 2008

O homem do dia - Harvey Postlethwaite

Não é todos os dias que escrevo sobre alguém que não é nem piloto nem director de equipa. Hoje decidi escrever sobre um projectista, que durante os anos 70 e 80 criou alguns dos chassis mais memoráveis da história da competição. Trabalhou em equipas míticas como a Tyrrell e a Ferrari, e acabou a sua vida numa pista, a ver uma tentativa da Honda a regressar à competição. Hoje falo de Harvey Postlethwaite.


Nascido a 4 de Março de 1944 em Inglaterra, frequentou a Universidade de Birmingham para tirar o curso de Engenharia Mecânica. Após acabar o curso, foi trabalhar para a gigante inglês da quimica ICI, mas a sua paixão pelo automobilismo fez com que trocasse esse emprego pela recém-criada March, em 1970.

Trabalhando a principio em desenhar e desenvolver chassis de Formula 2 e Formula 3, um dos seus clientes era um excêntrico Duque chamado Alexander Hesketh. Em 1973, compraram um chassis March e tentaram convencer Postlethwaite a juntar-se para desenvolvê-lo às suas custas. Para ele, foi uma maravilha: o próprio era considerado pelos pares como "excêntrico". Anos depois, Postlethwaite disse que "o pessoal da Hesketh foram os unicos que me colocavam bêbado..."

A primeira criação de Postlethwaite foi o Hesketh 308, onde durante duas temporadas (1974-75) deu os melhores resultados à sua equipa e ao seu piloto-estrela, James Hunt: a vitória em Zandvoort e o quarto lugar na classificação de pilotos, bem como o sexto lugar no campeonato de construtores.

Contudo, no final de 1975, Hesketh estava sem dinheiro e retirou-se da competição. Postlethwaite foi então ter com outro milionário apixonado pela Formula 1: o canadiano Walter Wolf. Wolf comprara a Williams e iria correr na temporada de 1976 sobre o nome Wolf-Williams. Sem resultados aparentes, preparou-se para a temporada de 1977 com o primeiro chassis da marca, o Wolf WR1, com o sul-africano Jody Scheckter como unico piloto. O carro estreou-se no GP da Argentina... e ganhou!

O WR1 teve outras variantes ao longo das temporadas de 1977 e 78, onde ganhou mais suas vezes (Monaco e Canadá 77) e deu o vice-campeonato a Scheckter, e o quarto lugar no mundial de Construtores. Ele ficou na equipa até ao final de 1979, quando foi comprada... pela Fittipaldi. Em 1980, ajudou a Fittipaldi a desenhar o F8, mas este não teve grandes resultados. Por essa altura, Postlethwaite tinha na sua equipa outro jovem engenheiro, então com 22 anos, recém saido da universidade: Adrian Newey.

Em 1981, Postlethwaite teve o melhor convite que alguém poderia ter: trabalhar na Ferrari. Quando lá chegou, não foi a tempo de desenhar o chassis 126 C1, considerado um mau carro, mas que deu duas vitórias a Gilles Villeneuve (mais pelo talento dele e pelo potente motor do que pelo chassis). Mas em 1982, o 126C2 era um carro radicalmente oposto, e logo foi considerado como um vencedor.

Mas a época foi tragica para os lados de Maranello. Apesar de terem ganho três corridas (San Marino, Holanda e Alemanha), a equipa perdeu Gilles Villeneuve em Zolder e viu Didier Pironi acabar a sua carreira no "warm up" do GP da Alemanha, que horas mais tarde seria ganha pelo seu companheiro Patrick Tambay. No final do ano, ganharam o título de construtores, mas o vice-campeonato de pilotos tinha sido muito pouco para as aspirações da Scuderia.

Em 1983, à vista de novos regulamentos (o efeito-solo tinha sido banido), Postlethwaite cria o 126C3, e continua a ser um chassis vencedor. Ganha quatro corridas nessa época (3 com René Arnoux, 1 com Patrick Tambay), e alcança de novo o título de construtores, mas falha o campeonato de pilotos, com Arnoux a ser terceiro na classificação geral.

Em 1984, apresentou uma nova evolução, o 126 C4, desta vez com Michele Alboreto ao voltante, mas numa temporada onde o McLaren MP4/2 era o rei, somente ganhou uma corrida. No ano seguinte, desenha um chassis novo, o 156/85, onde consegue ganhar duas corridas, com Alboreto ao voltante. Contudo, o melhor que conseguiram em termos de classificação foram o vice-campeonato de pilotos, e o vice-campeonato de construtores.

Em 1986, desenha o F1/86, mas o carro é pouco competitivo, e não consegue ganhar corridas. No ano seguinte, o F1/87 melhora no final do campeonato, dando duas vitórias a Gerhard Berger, mas no final do ano, Ferrari substitui-o por John Barnard. Assim sendo, ruma para a Tyrrell, uma equipa mais calma do que a hieraquizada e burocrática Ferrari.

Quando lá chegou, as performances da Tyrrell melhoraram bastante. Em 1989, desenha o chassis 018, que às mãos de Michele Alboreto e do novato Jean Alesi, obtiveram dois pódios e uma memorável batalha com Ayrton Senna nas ruas de Phoenix, na prova inaugural da temporada de 1990.

Por essa altura, Postlethwaite trabalhava num chassis que iria revolucionar a Formula 1: o Tyrrel 019. Inspirado no avião Junkers Ju 87 (conhecido como Stuka), Poselwaithe criou uma asa dianteira elevada ao centro. Para respeitar o regulamento respeitante ao efeito-solo, havia uma placa que era estendida até à zona das rodas dianteiras, servindo como plataforma. Por causa das forças que conseguia em pista, o carro tinha uma asa traseira mais pequena do que o normal.

Quando foi estreado, muitos duvidavam da sua solidez, mas Postlethwaite provou o contrário, ao colocar-se em cima da estrutura! A impressão que o conceito causou foi tão forte que continua até aos dias de hoje a ser usado nos diversos chassis que compõem o actual pelotão da Formula 1. Apesar do projecto 019 só ter proporcionado à equipa um pódio.

No final de 1991, transfere-se para a Sauber, que preparava a sua entrada na Formula 1 na temporada de 1993. Com a ajuda de um jovem protegido, então com 28 anos, chamado Mike Gascoygne, projectou o Sauber C12, o primeiro chassis de Formula 1, que deu alguns bons resultados na época de 1993, com Karl Wendlinger e J.J. Letho ao voltante. Mas no inicio de 1993, sai da Sauber para voltar a ser director técnico da Ferrari, nesta altura numa situação muito difícil. Contudo, pouco ou nada fez, e para piorar as coisas, a sua aversão à burocracia e as intrigas politicas no seio da Scuderia fizeram com que voltasse, ainda em 1993, para a Tyrrell, onde ficaria até à compra da empresa pela British American Tobacco, em 1998.

Aí, sai da equipa e é atraído pela Honda, que projectava um regresso à Formula 1 como um todo: chassis e motor. Pediram à Dallara para que construisse um chassis e contrataram o holandês Jos Verstappen para ser o piloto de testes da marca. A 15 de Abril de 1999, estavam em Barcelona, a testar novas soluções para o chassis. Postlethwaite estava lá quando teve dores no peito e desmaiou, vítima de um ataque cardíaco fatal. Tinha 55 anos.

No final, o legado de Postletwaite é grande. A par com Gordon Murray e John Barnard, muitas das inovações aerodinâmicas dos anos 70, 80 e 90 têm as suas penas. Foi ele que acolheu alguns dos projectistas mais famosos da actualidade, como Adrian Newey, que depois da Fittipaldi, trabalhou na March, Williams, McLaren e agora na Red Bull; e Mike Gascoygne, que após a Sauber, foi para a Jordan, Spyker e agora está na Force India. Agora que se pode ver as suas criações com alguma distância, o impacto que ele teve na Formula 1 pode ser comparável, provavelmente, a um Colin Chapman.

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