Há muita gente que acha que a verdadeira personalidade das pessoas se revela quando estão na mó de baixo. Há quem seja como os caranguejos e os caracóis, que recuam para as suas tocas, preparando em silêncio para a próxima jogada, que deixe os seus desabafos para os que lhe são próximos, um pouco para se proteger do desgaste. Outros acham que vocalizar o seu desagrado por alguma coisa é a única maneira de dizer o que sentem, e há outros que preferem culpar outros pelos seus estragos, numa espécie de "eu contra o mundo".
Como é sabido, ninguém ganha sempre, mas também não há eternos perdedores. Há quem ache que o seu ídolo deveria ganhar todos os campeonatos, mais para poder dizer aos seus amigos que está do lado certo e fez bem em apoiá-lo, e diz que o adversário - ou os adversários - são inferiores ao seu ídolo. E tudo o que ele diz está certo, numa lógica de "nós contra eles".
Neste momento, é Lewis Hamilton, mas no passado já foi em tantos outros pilotos. Com a minha infância a ser marcada pelo Ayrton Senna, houve o seu "inimigo" na figura de Alain Prost. Como ambos tinham os seus defeitos - um não tinha paciência, o outro tentava ganhar na secretaria quando não conseguia ganhar na pista - ambos fizeram o seu melhor para marcar toda uma geração. Depois disto tivemos Michael Schumacher, Fernando Alonso e Sebastian Vettel. Agora, é Lewis Hamilton, que esta temporada, depois de vencer as duas últimas, está com problemas sérios.
E este domingo, quando parecia que iria vencer depois de três provas seguidas do seu rival, Nico Rosberg, o motor do seu Mercedes explodiu, deixando-o a pé e a sair de Sepang com um atraso de 23 pontos.
No final da corrida, disse à imprensa o seguinte: "Não quero acreditar quando temos oito carros com motores Mercedes e só no meu é que acontecem estas quebras. Há algo do qual não está a bater certo. A Mercedes já deu 43 motores esta temporada e só comigo é que acontecem os problemas. Não há muito mais que possa fazer. Eu e a minha equipa sabemos que temos o que é preciso para regressar às vitórias, mas sei lá eu que motor vou ter na próxima corrida…", disse à imprensa, nas boxes da Mercedes.
É verdade que Hamilton não está a ter uma grande temporada. Desde que a Formula 1 voltou da sua pausa de verão que ele teve de trocar tudo em Spa-Francochamps, largando do último lugar, mas acabando no terceiro posto. Outras quebras aconteceram nos treinos, nunca na corrida, e a outra vez que desistiu foi quando bateu em Nico Rosberg em Barcelona. Esta foi a sua primeira quebra em muito tempo, quase a lembrar Michael Schumacher no Japão, quase dez anos antes, e que deu o campeonato a Fernando Alonso. Fala-se que houve uma troca de mecânicos, com alguns dos que trabalhavam com Hamilton a migraram para Nico, ajudando a melhorar a sua performance. Daí que se explique o bom inicio do alemão, mas não explica a recuperação de Hamilton a meio da temporada, que acabou no famoso "encontrão" na última volta do GP da Áustria.
Contudo, provavelmente ele pensava que depois do verão, estava tudo resolvido, que o tetra era uma questão de tempo, que se calhar já estava a marcar alguns dias em Las Vegas para comemorar com os seus amigos de Hollywood, pensando que o título seria seu em Austin. Só que as pessoas não ficam paradas e o resultado foi o que vimos nas últimas três corridas. E quando deve ter visto no espelho o pião de Nico, após o toque por parte de Sebastian Vettel, pensou que a sua maré estava de volta. E entende-se a frustração pelo facto de ver visto a esfumar 25 pontos, mas insinuar que na Mercedes, eles querem este ano um alemão a ganhar, é feio. Parece desculpa de mau perdedor, e não pode ser assim.
Como é óbvio, a Mercedes veio logo a público dizer que isso é um disparate, com Paddy Lowe a assegurar que ninguém está a favorecer um piloto em detrimento de outro. “Nenhuma falha é planeada. Damos o nosso melhor e até temos vindo a melhorar a fiabilidade, como provam os nossos resultados. Mas por alguma razão algo tem acontecido com o carro do Lewis. No entanto, não existe nenhum padrão que possa relacionar essas falhas. A Fórmula 1 é um desporto duro e as coisas são assim às vezes”, referiu.
Niki Lauda pediu desculpas pelo sucedido: “Estou realmente aborrecido e desapontado comigo e com a minha organização porque sinto que o deixamos ficar mal. Temos que perceber o que aconteceu. Era um motor praticamente novo e portanto temos que analisar o que conduziu a isto, mas estas coisas podem acontecer. Sinto-me muito triste por ele”, concluiu.
E claro, mais tarde, com a cabeça mais fria, ele retratou-se: “Tenho cem por cento de confiança na equipa. É o meu quarto ano nesta equipa e tenho confiança em todos os que estão na garagem e na fábrica. Sem eles não teria ganho dois campeonatos. Quando disse que alguém não queria que eu ganhasse, estava me referir a ‘alguém superior’, que estava a intervir. Mas ao mesmo tempo sinto-me um privilegiado com a grande oportunidade que tenho de estar nesta grande equipa. Estou eternamente grato”.
O mais engraçado nisto tudo é que Hamilton já recuperou 43 pontos de desvantagem, logo, nada está perdido. Mas na mente dele, como acontece normalmente às pessoas competitivas, onde ele mesmo é o melhor contra "o resto do mundo", pensar que há uma conspiração para o derrubar pode acontecer, quando estás sempre a treinar, quer em termos físicos e mentais, para ser o melhor, é real. Mas a realidade conta outra história: é que por vezes, és superado. Quando ele desabafa ao chegar nas boxes, dizendo "alguém não quer que eu ganhe", se calhar é isso mesmo: é o Destino que conspira contra ele. E é nestes momentos que tens de ver que tipo de pessoa és. Portanto, mas do que dizer às pessoas que há uma força estranha a derrubá-lo, é voltar ao cockpit e superar o mau momento, mais nada. Tudo o resto não só é supérfluo, como também é desnecessário, inútil e venenoso.
Faltam cinco corridas, ainda há tempo para recuperar. E se não der, é melhor olhar e dizer que conseguiu três títulos na sua carreira.
3 comentários:
Realmente faltou a humildade por parte do Lewis Hamilton.
"Há quem ache que o seu ídolo deveria ganhar todos os campeonatos, mais para poder dizer aos seus amigos que está do lado certo e fez bem em apoiá-lo, e diz que o adversário - ou os adversários - são inferiores ao seu ídolo. E tudo o que ele diz está certo, numa lógica de "nós contra eles".
Como detesto esse tipo de gente! Se dependesse desses, a Fórmula 1 já teria perdido o seu 'mojo' há tempos. E é contraditório: são fãs de esportistas sem serem fãs do esporte.
Salve!!!
Acho que depois do que aconteceu hoje, principalmente pela sua força mental, Rosberg está com uma das mãos na taça!!!
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