quinta-feira, 28 de julho de 2022

A imagem do dia


Ontem, tarde da noite, fui dar uma olhada no Instagram e me disseram que o Sebastian Vettel, sempre avesso a redes sociais, tinha criado uma conta por ali. A notícia tinha-se espalhado e decidi seguir. Pus-me à conversa com um amigo meu e ele falou sobre a chance de ele anunciar a sua retirada. Todos já tinham ideia de que ele ia-se embora, mas pensávamos que diria isso mais tarde, depois das férias, por exemplo.  

Afinal, ele criou a conta para algumas horas mais tarde sentar-se numa cadeira de plástico e anunciar a sua retirada da Formula 1. Provavelmente com mais de 300 corridas no bolso, quatro títulos mundiais, 52 vitórias na sua carreira, 122 pódios, 57 pole-positions e 38 voltas mais rápidas. E foi um dos poucos pilotos a dar a primeira vitória a mais de uma equipa: à Toro Rosso, em 2008, e à Red Bull, no ano seguinte.  

Tive o privilégio de trabalhar com muitas pessoas fantásticas na Fórmula 1 nos últimos 15 anos – há muitos para mencionar e agradecer”, disse, na sua mensagem.

A decisão de me retirar foi difícil para mim e passei muito tempo a pensar nisso; no final do ano quero ter mais tempo para refletir sobre o que focarei a seguir; está muito claro para mim que, sendo pai, quero passar mais tempo com minha família.

Mas hoje não se trata de dizer adeus. Em vez disso, trata-se de agradecer – a todos – principalmente aos fãs, cujo, sem apoio apaixonado, a Fórmula 1 não poderia existir”.

Essa é a parte do piloto que a certa altura marcou uma era na Formula 1. Entre 2010 e 2013, era dominador, contra todo um pelotão cheio de excelentes pilotos que iam desde Lewis Hamilton, Kimi Raikkonen e Fernando Alonso, até gente como Michael Schumacher, Nico Rosberg, Mark Webber e Felipe Massa, que reparavam no piloto que tinha um grande carro por trás. E mesmo quando dominava, havia os que aceitavam muito mal esse domínio. Um bom exemplo que retive na memória foi no GP da Índia de 2012, quando Alonso, no seu duelo com o alemão, disse que era o que era "por causa de Adrian Newey", ou seja, era mais o carro que o piloto. Mas isso aconteceu sempre, não foi só naquele momento.

Nestes anos todos, sempre o admirei por causa da sua humanidade. É ultra-protetor da família - há muitas poucas fotos da sua mulher, quase nenhumas dos seus descendentes e qualquer foto caseira.

Aliás, ele disse a seguinte frase na mensagem de despedida: "Quantos Sebs existem?"

"Minha cor preferida é o azul, sou curioso, fascinado por pessoas inteligentes, tolerante, impaciente, gosto de chocolate, do cheiro de pão quente e de fazer as pessoas rirem." Isso não me lembro de ouvir de muito piloto, obcecado, desenhado para ganhar e mais nada. Bem vistas as coisas, desses pilotos que tem redes sociais, quase ninguém fala dos seus gostos pessoais. Mostram mais os carros que têm, casa, barcos e pouco mais. Ao mostrar, escondem-se. Que paradoxo!

Agora, recentemente, ele começou a olhar para o mundo à volta e reparou que passa por uma transformação do qual não poderá ficar indiferente. Não sei se foi por causa da pandemia que o fez olhar para esse mundo à volta. Não faço ideia se os eventos do Canadá, em 2019, e a sua ira por uma decisão que achou injusta, o fez quebrar algo dentro dele, na sua maneira competitiva, e achou que a partir dali, não conseguiria mais nada e se calhar, o sol se punha na sua carreira. Eu disse na altura que, se estivesse a calçar os seus sapatos, iria a Maranello no dia seguinte e apresentaria a minha demissão como piloto. Mas creio que ele deveria ter visto algo mais, ou se calhar teria a esperança de que as coisas iriam dar a volta, quer ali, quer depois, quando assinou pela Aston Martin.

Felizmente, pude ver a carreira dele do princípio ao fim. Do "puto maravilha" de Monza, com uma das vitórias mais improváveis da história da Formula 1, e que quase tirou um título a Lewis Hamilton, em Interlagos, até a alguém que decidiu montar uma corrida de karts na Arábia Saudita para garotas, no sentido de defender os direitos das mulheres naquele país, e o protetor dos pilotos mais novos, como o Mick Schumacher, da mesma maneira que o pai, Michael, o olhava embevecido, quando entregava troféus de vencedor no kart. 

Em suma, hoje soube que o piloto mais humano que já vi na Formula 1 iria pendurar o capacete. Agora iremos saber o que fará depois.    

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