segunda-feira, 29 de dezembro de 2025

As imagens do dia










Agora que teremos o Dakar à porta, hoje decidi falar sobre o homem por trás da ideia. E ele foi mais do que um mero fundador, acreditem. 

A 11 de janeiro de 1977, um motociclista perdeu-se no meio do deserto, mais concretamente, no Tchigai Plateau, no leste da Argélia. Ele acionou os meios de socorro, mas à medida que demoravam para o salvar, ele convenceu-se que esses socorros poderiam chegar demasiado tarde. Pensou seriamente na ideia, caso chagasse ao limite: se expusesse o seu pescoço ao calor de 45 graus do deserto do Sahara, a sua língua iria inchar tempo suficiente para morrer sufocado. Contudo, depois de três dias de caminhada, ele é salvo "in extremis" pelo avião de Jean-Michel Sinet, que estava ao serviço do organizador do "rally-raid", Jean-Claude Bernard

Depois de recuperado, disse: "É uma experiência que não desejo nem ao meu pior inimigo, mas não me arrependo". O nome da pessoa salva? Thierry Sabine. Dois anos depois, iria organizar o primeiro Dakar. 

Thierry Sabine nasce a 13 de junho de 1949 em Boulogne-Billancourt, em Paris. Filho de um dentista, Gilbert Sabine - que depois irá ajudar na organização da prova fundada pelo seu filho - ele começa a correr em ralis, em 1969, num Alpine A110. Mas a sua paixão são as motos, apesar de participar em carros - em 1975, chega a correr nas 24 Horas de Le Mans, num Porsche 911. 

Entre corridas, ele exercia a função de relações públicas e assessor de imprensa. Um dia, ele é contactado pela autarquia de Le Toucquet, estancia balnear do Canal da Mancha, e lhe pergunta sobre se tinha sugestões para reavivar a cidade durante os meses de inverno. A sua solução? Um enduro. 

O "Enduro de Le Touquet" é basicamente, um percurso na praia, onde os pilotos partem em linha e percorrem as primeiras centenas de metros à beira do mar, antes de penetrarem nas dunas e dão uma volta, num circuito de quinze quilómetros. A primeira edição acontece a 16 de fevereiro de 1975 e torna-se num êxito absoluto: 286 concorrentes, todos em cima de uma moto, e quase todos amadores. A inspiração para este Enduro é basicamente... Steve McQueen. Mais concretamente a sua paixão pelas motos, que passou para filme, de seu nome "On Any Given Sunday". 

Com a experiência do Le Touquet, em 1977, participa no "raid" Abidjan-Nice, numa moto, e tem a sua experiência-limite. No regresso à França, começa a pensar na ideia de colocar gente aventureira no meio do deserto, para passar a experiência a outros, e assim, atrair gente para a travessia no deserto. No dia a seguir ao Natal de 1978, com a Torre Eiffel como pano de fundo, 170 viaturas, entre carros, motos, buggys e camiões, partem rumo a Dakar, onde chegarão a 14 de janeiro de 1979. Torna-se um êxito, e Sabine diz logo o que se trata: "Um desafio para os que partem, um sonho para os que ficam". 

O percurso é simples: de Paris até Marselha (ou Toulon ou outro porto importante no Mediterrâneo), embarcam de "ferry" para Argel, e dali, percorrem o deserto, rumo, primeiro, para o sul, depois para o Oeste, atravessando o Mali, o Niger, a Mauritânia, e por fim, o Senegal, acabando no Oceano Atlântico, passando pelo Lago Rosa. 

Como não há classificações separadas para carros, motos ou camiões, o vencedor é uma moto, guiada por Cyril Neveu

Nos anos seguintes, é um sucesso tremendo. Os inscritos aumentam, as equipas de fábrica participam, com os profissionais a entrarem nisto a sério, mas os amadores não são enxotados de lado, bem pelo contrário: todos eram bem-vindos. E todos tinham de ser salvos, caso se perdessem. Foi o que aconteceu em 1982, quando o Peugeot 504 que levava Mark Thatcher, o filho de Margaret Thatcher, então primeira-ministra do Reino Unido, e piloto amador, perdeu-se na Argélia, e foi salvo quando foi avistado por um Hércules C-130 da Força Aérea Argelina.

No ano seguinte, ainda mais drama houve, quando 40 pilotos se perderam no enorme deserto do Teneré, depois de uma tempestade de areia. Pegou no seu helicóptero e nos quatro dias seguintes, localizou-os, um a um, e os ajudou a guiar rumo ao caminho indicado, sem perdas. Tempos depois, um dos concorrentes falou sobre os seus esforços de resgate da seguinte maneira:

"Temos sempre a impressão que o Thierry Sabine é Deus que cuida das ovelhas do seu rebanho no alto do seu helicóptero, descendo sobre nós para ajudar aqueles que se perderam no caminho".

Em 1986, o percurso do Dakar partia de Paris no dia de Ano Novo, e acabava a 22 de janeiro em Dakar. Iam até Sète, em França, e desembarcavam em Argel, onde partiriam para etapas no Niger, Mali, Guiné-Conakri, Mauritânia, para, por fim, chegarem à meta, no Senegal. Muitos e muitos inscritos: 486, divididos entre 282 motos, 131 carros e 71 camiões. 

Os favoritos? A Porsche, que metia uma equipa oficial, com 959, guiados pelo veterano Jacky Ickx, vencedor do rali em 1981. Ano Novo, competição nova e Sabine, então com 35 anos, a zelar pelo bom rumo dos concorrentes, no alto do seu helicóptero.

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