É verdade que o Agosto serve para ir à praia e não pensar no automobilismo em geral e na Formula 1 em particular. Mas como amanhã começa o Rali da Alemanha e já sabemos que veremos Sebastien Löeb nas classificativas por mais dois anos - e se calhar, mais dois títulos - é altura de pensar sobre a categoria máxima do automobilismo e dedicar a um desporto favorito, que é expor a excessiva obsessão de Bernie Ecclestone e da FOM pelo dinheiro, a pretexto de despesas das equipas e de um bolo que deve ser alimentado. Quando se sabe que metade desse bolo vai para a firma do Tio Bernie, bem...
Mas a razão pelo qual falo disto tem a ver com as declarações de duas pessoas muito distintas na Formula 1, ambos com funções e historial bastante diferente, mas que alinham no mesmo diapasão: criticam o fato da FIA e da FOM tratarem demasiado mal aquilo que faz prosperar a Formula 1, que são os espectadores. E o primeiro a falar disso foi uma lenda das pistas, o belga Jacky Ickx, vice-campeão do mundo e cinco vezes vencedor das 24 Horas de Le Mans. Entrevistado pelos alemães da Motorsport-Total, colocou o dedo na ferida, afirmando que não são tratados com respeito: "A Fórmula 1 terá bastante mais sucesso se tratar melhor os seus adeptos. Hoje em dia dá a sensação que ninguém se preocupa muito em perguntar o que pretendem os clientes.", afirmou.
O que Ickx falou agora é aquilo que sentimos há anos, quando vemos a Formula 1 a abandonar progressivamente a Europa para passar à Ásia e os países do Golfo Pérsico, endinheirados, é certo, mas cujo impacto em termos de espectadores é menor, para não dizer ínfimo. E quando uso essa última palavra, vêm à cabeça as bancadas vazias de autódromos como Xangai, que são preenchidas pelas autoridades locais com bilhetes oferecidos aos estudantes, como aconteceu em certos anos. E é aqui que entra a segunda declaração desta semana, que vem da Rússia. Oksana Kostachenko é a "manager" de Vitaly Petrov e decidiu colocar outro dedo na ferida em relação à maneira como a FIA trata das coisas... nos países mais novos. É certo que o primeiro Grande Prémio russo só será em 2014, em Sochi, mas já viu os exemplos asiáticos e exprimiu a sua opinião sobre o que pode acontecer no seu pais se nada for feito.
"Apesar de ainda faltarem três anos para o GP da Rússia, estou um pouco preocupada, já que ainda não se começou a sensibilizar o público. A Rússia é um país diferente, com uma cultura diferente e organizar um GP não passa somente por construir um circuito pois há que ir preparando os adeptos. Neste momento, na Rússia, não há imprensa especializada. Por exemplo na Grã-Bretanha existem diversas revistas, mas sem imprensa não é possível criar apetência pela modalidade e se isso não suceder o risco de termos pouca gente no Grande Prémio é grande. Há muito a fazer que não é possível sem a ajuda do governo", referiu em declarações à imprensa local.
É claro que ela fala em coisas como revitalizar o kartismo no seu país, mas também fala de outra coisa interessante, como o fato de não haver imprensa especializada. Jornais e revistas dedicadas ao automobilismo, para atrair a juventude, por exemplo. E os dois, tocando nas devidas feridas, chegam a uma espécie de conclusão coincidente: a ânsia furiosa deste negócio em procurar fontes de receita novas porque as antigas estão a secar está a fazer alienar os adeptos e fãs do automobilismo, que estão situados na Europa. As corridas europeias já não pagam as extravagâncias pedidas por Ecclestone, algo que a Asia está disposta a pagar, mas tirando o Japão, não há espectadores suficientes para encher os novos circuitos, e são os governos locais que passam os cheques. Mas será que os chineses, coreanos e indianos quererão passar cheques de 50 milhões de dólares todos os anos - e a aumentar a cada ano que passa - para toda a eternidade? E quando a bolha rebentar, Ecclestone vai arranjar dinheiro onde?
Eu sei que estou a bater nessa tecla há eras, mas parece que só irá haver ação quando Ecclestone não estar mais entre nós. Se a ideia é de esperar para que a Natureza siga o seu curso, francamente isso é perigoso, pois os seus planos podem ser um pouco mais prolongados daquilo que nós pensamos. O que espero é que a FOTA e a FIA tenham consciência do rumo a que esta Formula 1 está a seguir, e esta voraz procura por dinheiro a qualquer custo, em sítios sem tradição, alienando a sua base tradicional europeia, possa levar, a um médio prazo - cinco anos, provavelmente - a uma situação potencialmente perigosa para a sua existência. E quando digo que andam a dar facadas na galinha dos ovos de ouro, eu baseio-me naquilo que se diz por aí.
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