segunda-feira, 5 de outubro de 2015

A imagem do dia

Deve ser uma coincidência hoje, mas do sitio onde escrevo isto, lá fora está uma tempestade. Como era o tempo em Suzuka há um ano, onde se temia a passagem de um furacão pela zona, que se situa no centro do Japão. Ainda lembro perfeitamente dos meus receios, da conversa que houve durante a semana sobre o adiamento ou adiantamento da corrida por causa desse mesmo furacão, mas que a FIA, a FOM atiraram as culpas para a organização japonesa, que não queria adiar porque nos bilhetes estavam escritos os horários dos comboios que os adeptos tinham de apanhar após a corrida.

De improvisação, os japoneses fogem dela. E da culpa, já conhecem o resto.

Temi uma farsa de meia dúzia de voltas (e escrevi isso na altura), metade dos pontos e final da história. Um ano depois, em reflexão, se calhar teria sido melhor assim, mas só falamos dessa forma porque a tragédia aconteceu. E o meu maior choque nem foi a cor da bandeira, ou a curva onde aconteceu, ou o tarde da corrida. Foi ver aquele trator no meio de uma escapatória asfaltada, num circuito como aquele, num país como aquele. E mesmo que haja um azar no meio daquilo tudo, continuo a dizer que o trator foi o meu maior choque, num país estupidamente organizado como o Japão. Se sabemos que no Mónaco há gruas para tirar os carros da pista - e espaço naquele sitio é mais raro que os metais preciosos - porque é que tal não acontecia? Mas aconteceu.

Jules Bianchi demorou nove meses e meio para morrer. De outubro de 2014 a julho de 2015, soubemos que o piloto francês, filho de Phillipe, neto de Mauro e Lucien, tinha tido uma lesão grave do qual poderia não ter volta. E apesar de ter falado dos casos de sucesso, como Richard Hammond e Roberto Guerrero, sabia que seria uma questão de tempo até saber se ele reagia ou não. Não reagiu, e nunca saiu do estado onde estava.

Quando se foi, a 17 de julho, escrevi que o contador tinha voltado ao zero, mas que não houve o choque de outros casos como Henry Surtees, Dan Wheldon ou mais recentemente, Justin Wilson.  Houve sempre uma esperança do qual o seu final significou o seu fim. Mas lembram-nos sempre que a ideia da "morte zero" é um mito que se vendeu muito nos últimos tempos e que recentemente estes incidentes nos fazem acordar de uma ilusão. E quando acordamos dessas ilusões, discutimos soluções para ela, nem que seja para quebrar tradições.

Mas neste dia chuvoso, recordamos que o tempo voa a Terra deu a sua volta completa ao Sol. E também um piloto do qual tinhamos esperança de ver fazer coisas boas, e que tudo desapareceu numa tarde de tempestade.  

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