Muitos de vocês devem ter lido "O Arquipélago do Gulag". Provavelmente também leram "Um Dia na Vida de Ivan Denisovich", falando da vida de um prisioneiro na União Soviética de Estaline. Esses livros foram escritos por Alexander Solzentihsyn, o homem que contou ao Ocidente aquilo que se passava dentro da União Soviética, do Estado dentro do Estado, da realidade por detrás dos feitos de Estaline. Devido a isso se tornou num notado dissidente, e ganhou o Prémio Nobel em 1970. Por causa disso, exilou-se nos Estados Unidos em 1974, para voltar vinte anos depois, após o colapso da União Soviética. Morreu este Domingo, aos 89 anos, vítima de insuficiência cardíaca.
Nasceu a 11 de Dezembro de 1918 em Kislovodsk, perto do Cáucaso. Nunca conheceu o pai, um oficial do exército impérial, que morreu antes de ele nascer, logo, foi educado pela mãe, que era proprietária de uma fazenda, confiscada pelas autoridades soviéticas. No inicio dos anos 40, estuda matematica na Universidade de Rostov, ao mesmo tempo que tira cursos de correspondência em História, Literatura e Filosofia na Universidade de Moscovo.
Quando a União Soviética entra na II Guerra Mundial, torna-se comandante numa divisão de Artilheria, mas perto do final da guerra, é denunciado por ter criticado numa carta, a maneira como Estaline conduzia a guerra. Interrogado pela então NKVD (depois KGB) na temerosa prisão de Lubianka, foi condenado a oito anos de prisão num campo de trabalho, sendo depois exilado para as estepes do Cazaquistão. As suas experiências nesse campos de prisioneiros tornaram-se na base dos seus livros mais aclamados: O "Arquipélago do Gulag" e "Um Dia na Vida de Ivan Denisovich".
Quando foi para o Cazaquistão, tornou-se professor, escrevendo secretamente à noite as suas vivências. Em 1960, quando ele tinha 42 anos, apoximou-se de Alexander Tvardkovsky, (1910-71) o editor do jornal literário Novy Mir, o mais importante do país, e entregou o manuscrito de "Um dia..." Publicado em 1962, com a aprovação oficial do próprio Nikita Kruschev, foi um grande sucesso.
Contudo, dois anos mais tarde, Kruschev foi deposto, os seus sucessores passaram para um comunismo mais ortodoxo e repressor. Solzenthisyn queria publicar "O Pavilhão dos Cancerosos", onde falava nas suas experiências num hospital, quando lhe detectaram um cancro no inicio dos anos 50, pouco depois de sair do "gulag", mas a União de Escritores Soviéticos, a entidade oficial que aprovava (ou não) os livros recomendados, negou a sua publicação, caso não eliminasse as partes "anti-soviéticas". Solzenithsyn, que por esta altura já tinha abandonado o Marxismo como ideologia e se aproximara dos ideiais de infância (crescera educado pelos valores da Igreja Ortodoxa), recusou, e os seus problemas com o poder soviético começaram.
Primeiro, foi incomodado, e depois teve que ficar em prisão domiciliária. Entretanto, quer o "O Pavilhão...", quer depois "O Primeiro Circulo" (1968) foram publicados no Ocidente, depois de serem levados clandestinamente da União Soviética, garantindo sucessos literários e fazenco conhecer o seu nome no Ocidente. E em 1970, o Comité Nobel, querendo marca uma posição politica, concedeu-lhe o Nobel da Literatura.
Isso enfureceu Brezhnhev e o Politburo. Não se deslocou à Suécia, por recear que eles não o autorizassem a regressar ao seu país. Nessa altura, ele trabalhava ferverosamente na sua maior obra: "O Arquipélago do Gulag". Publicado no Ocidente em 1973, e circulado clandestinamente na União Soviética, isto enfureceu tremendamente o poder comunista, que o expulsou do país em Fevereiro de 1974, juntamente com a sua segunda mulher e os filhos ainda pequenos. Primeiro, exilou-se na Alemanha e na Suiça, e depois foi viver para os Estados Unidos.
Lá, onde foi recebido com toda a pompa e circunstância, aproveitou para criticar a sociedade ocidental, especialmente a sua vida rápida e os habitos de consumo. Ficou nos Estados Unidos até 1994, mas quatro anos antes, com o advento da "perestroika", o governo soviético, agora liderado por Mikhail Gorbachov, restaurou a sua cidadania russa. Quando voltou, depois de empreeender uma longa jornada pelo Trans-Siberiano, a partir de Vladivostok, criticou os oligarcas russos e apoiou a defesa intransigente dos valores mais tradicionais da Mãe-Russia, tendo apoiado a segunda Guerra na Tchechénia, e mais tarde as politicas do presidente Vladimir Putin. Posições essas que valeram criticas por parte de muitos dos seus conterrâneos escritores, que o acusavam de ainda ter uma mentalidade arcaica, ainda do tempo dos Czares.
Agora, foi-se, ficam os seus livros como testemunho. Ars lunga, vita brevis.
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