Os anúncios aconteceram agora mesmo, portanto isto pode estar a ser escrito a quente. A mim, ganhasse quem quer que fosse, não me aqueceria nem arrefeceria, caso os favoritos fossem as nações mais "óbvias", mas o facto da FIFA ter escolhido a Rússia para o Mundial de 2018 e o Qatar para o de 2022 merece atenção para o tipo de pessoas que estão à frente do organismo máximo do futebol, e os critérios que devem ter usado para escolher localizações tão... exóticas.
Para começar, vou um pouco atrás no tempo: Quando João Havelange decidiu concorrer para o cargo de presidente da FIFA, em 1974, aproveitou bem a expansão da FIFA às novas nações que tinham surgido nos últimos 15 anos para prometer que caso fosse eleito, iria transformar o futebol num desporto verdadeiramente mundial. E quando chegou ao poder, cumpriu: o futebol conheceu uma expansão memorável, saindo do eixo euro-sul americano para se tornar num desporto verdadeiramente mundial. Em 1994, acontecia o primeiro mundial nos Estados Unidos, o primeiro fora desse eixo e o primeiro num país onde o futebol não era o primeiro desporto. Aliás, em 1994, os Estados Unidos não tinham uma Liga de futebol organizada, pois a MLS (Major League Soccer) só arrancou em 1996...
Com o tempo, a expansão foi maior. Coreia e Japão, em 2002 e a Africa do Sul, em 2010 foram as mais recentes escolhas do organismo máximo do futebol mundial, e mesmo a estrutura dos mundiais foi totalmente modificada. Agora são 32 as selecções que entram na fase final do Campeonato do Mundo, contra as 16 que participavam no já distante ano de 1974, boa parte delas europeias, com Africa, Asia e Oceania a disputarem, por vezes, para uma vaga. Agora, Africa tem cinco vagas e a Asia tem quatro, e estão mais ou menos em pé de igualdade com a América do Sul e Europa.
Agora, para o presente: Joseph Blatter é a continuidade das politicas de João Havelange. Foi seu vice-presidente na parte final do mandado do brasileiro e pretende ficar por lá tanto tempo como ele, tentando implementar a mesma agenda, ou seja, expandir o futebol pelos quatro cantos do mundo. E a escolha de localizações "exóticas" para os Mundiais de 2018 e 2022 tem de ser visto nesse campo.
Mas... ninguém acredita muito nisso, principalmente depois de sabermos dos escândalos das últimas semanas em relação a certos membros do Comitê Executivo da FIFA, que disseram perante câmaras escondidas da BBC o preço do seu voto. A FIFA pode ter agido rapidamente e suspenso essas pessoas, e abriu um inquérito que encerrou rapidamente, para dizer que nada de anormal foi descoberto. Claro, agora toda a gente vai questionar a independência e a idoneidade desse comité, bem como o inquérito em si.
Se formos ver a tendência da FIFA desde o final da década de 80, é sempre de expansão: Estados Unidos, Coreia e Japão, Africa do Sul, Brasil, Russia, Qatar... tirando o clássico brasileiro, diremos que são países ricos ou em expansão, e tirando a Rússia - que é a herdeira da União Soviética - sem qualquer tradição no futebol. Até o caso qatari ganha raias de escândalo. Afinal de contas, falamos de um país com uma superfície de... 11.437 quilómetros quadrados, um décimo da superfície do Uruguai, o pais mais pequeno que já acolheu o Mundial, no já distante ano de 1930. Como irão caber 32 selecções num pais tão pequeno e que em Junho tem uma média de temperatura de 45 graus Celsius?
Por muito que a FIFA jure a pés juntos que a Russia e o Qatar sejam os melhores, dá a impressão que foram compradas ao melhor preço. Que a sua politica de expansão, "a bem do futebol mundial" não foi mais do que uma corrida para saber quem ganha mais. Perferem que os paises gastem imenso dinheiro, em orçamentos que inevitavelmente irão derrapar duas ou três vezes mais do que o esperado, e que garantem a qualificação a selecções que vão para lá fazer figura de "corpo presente". A não ser que a federação do Qatar já tenha uma parte do seu orçamento destinado a "nacionalizar" os futebolistas ganeses, nigerianos, brasileiros ou outros nos sub-18 e sub-20 para poderem jogar esses Mundiais... o que o dinheiro não fará, hein?
Claro, muitos vão falar em "mau perder" e de "arrogância de primeiro mundo", blá, blá, blá, mas... pouca gente compreende a razão pelo qual a FIFA fez tais escolhas. Com elas, afirmou que não quer ser conservadora nem poupada, mas com as revelações das últimas semanas, demonstrou que não é uma organização de fiar. Para mim não me admiraria, porque falamos de uma organização avessa à mudança, não é?
E claro, contam que toda a gente esqueça disto nos dias seguintes... pode ser que aconteça, pelo menos até que uma Wikileaks quaisquer nos mostre os bastidores destas escolhas.
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