segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015

Os desportistas da "SwissLeaks"

As exigências de transparência, que a cada ano que passa, são cada vez mais audíveis. E ao ver que, com a crise de 2008 e as exigências de que os países compram planos de austeridade, as pessoas querem que todos cumpram a lei. E quando se diz para cumprir a lei, significa que têm de pagar os seus impostos, por exemplo.

Só que estes tempos estão a demonstrar que os mais ricos fazem de tudo para não pagar, sejam empresas, sejam indivíduos. No final do ano passado, falou-se do "LuxLeaks", onde se descobriu que o governo luxemburguês deu incentivos às empresas para fugirem aos impostos, fazendo com que pagassem um minimo fiscal, arrecadando milhares de milhões de euros de receitas. E a pessoa que fez isso foi o atual presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker. Apesar da tentativa de moção de censura, em Bruxelas, ele ficou no poder.

Contudo, agora, a denuncia é outra. E este vêm da Suiça, outro paraíso fiscal, mas que ultimamente está a ser pressionado por vários estados para acabar com a sacralidade do sigilo bancário. Especialmente dos Estados Unidos, que ameaçou vetar a atividade dos seus bancos (Credit Suisse, UBS, entre outros) no seu país. Só que se há denuncias de estados, outras vezes são funcionários de bancos que denunciam essas más práticas às autoridades tributárias de outros países. E o mais recente caso - já chamado de "SwissLeaks" - têm a ver com um balcão do banco HSBC (Hong Kong and Shanghai Bank) em Genebra, que ajudou a desviar para outros paraísos fiscais centenas de milhares dos seus clientes, vindos dos quatro cantos do mundo, através de lavagens de dinheiro.

Estes dados dizem respeito apenas ao horizonte temporal entre Novembro de 2006 e Março de 2007, e foram fornecidos por um informático, Hervé Falciani, então trabalhador do banco em Genebra, ao Governo francês em 2008, que deu início a uma investigação. O jornal francês "Le Monde" teve acesso a parte da documentação e partilhou-a com o ICIJ e com jornalistas de mais de 40 países. 

Porque é que falo disso? É que entre as centenas de milhares desses clientes endinheirados, há dezenas de desportistas, e alguns do automobilismo. Michael Schumacher, Fernando Alonso, Heiki Kovalainen, o motociclista Valentino Rossi e o dirigente Flávio Briatore são alguns dos visados no esquema. Claro, abrir uma conta num paraíso fiscal não é crime - e sejamos honestos, qualquer um que tivesse uma fortuna nas suas mãos, faria o mesmo - mas temos de ver que muitas dessas fortunas são obtidas de modo ilícito. Sejam políticos que recebem dinheiro vindo de fundos duvidosos, ditadores que saqueiam os tesouros públicos para seu próprio proveito, traficantes de armas e drogas, são muitos desses exemplos.

Apesar de tudo, a própria investigação ressalva: “Não é nossa intenção sugerir ou indicar que quaisquer pessoas, companhias ou outras entidades incluídas neste aplicativo interativo quebraram a lei ou agiram de maneira imprópria”. Basicamente, o que querem afirmar é que a HSBC agiu de forma anti-ética.

Indo para os casos em particular, pode-se dizer que algumas situações já vinham do passado. Por exemplo, Valentino Rossi teve problemas com o governo italiano em 2008, quando morava em terras inglesas, e as autoridades tributárias reclamavam uma divida de 19 milhões de euros. Posteriormente, chegaram a acordo. Já Alonso, que na altura vivia em terras suíças, agora voltou a Oviedo e paga os impostos como cidadão espanhol. "Estou feliz por pagar o dinheiro. Não estou pobre, só menos rico”, falou.

Já Briatore tinha as suas empresas em domicilio fiscal suíço, tendo em 2008 sendo o titular ou tendo ligações a 38 contas ao todo, com o montante combinado de 73 milhões de dólares. O seu advogado já disse que todas elas são legitimas, vindas de negócios legítimos, e que não deve nada às autoridades fiscais do seu país. No caso de Schumacher, os valores não são referidos, e ele é residente em terras suíças há mais de 15 anos.

Sobre isto, a filial suíça do banco britânico garantiu, nesta segunda-feira, que promoveu uma "transformação radical" das práticas da instituição, após os "incumprimentos verificados em 2007", para evitar casos de fraude fiscal e de branqueamento de capitais. "O HSBC (Suíça) levou a cabo uma transformação radical em 2008 para evitar que os seus serviços sejam utilizados para defraudar o fisco ou para lavagem de dinheiro", disse o director-geral da filial, Franco Morra, num comunicado enviado à AFP.

Essas revelações relativas a práticas do passado, devem lembrar que o velho modelo de negócios do banco privado suíço já não é aceitável”, adiantou. O HSBC Suíça “não está interessado em estabelecer relações comerciais com clientes ou potenciais clientes que não respeitam as nossas exigências em relação à criminalidade financeira”, concluiu.

Contudo, alguns países exigem mais informações sobre a atividade dos seus concidadãos nesse banco. Um deles, a Bélgica, já pondera emitir mandatos de detenção aos seus diretores, pela demora em fornecer informações pedidas há cerca de três meses, e dos quais ainda não obtiveram resposta.

Em suma, não se pode dizer que estes desportistas fizeram algo ilegal, apesar de haver casos nebulosos. Mas vê-los no meio de familiares de ditadores africanos, traficantes de armas ou construtores civis que sobrefaturaram as obras não é lá uma grande companhia. E de uma certa forma, a fama de sigilo nas contas vinda das terras helvéticas começa a esboroar-se. Quer seja através de ações de outras nações, quer seja através de pessoas que "colocam a boca no trombone". A evasão fiscal é um assunto sério.

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