quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

Considerações politico-automobilísticas em dia de aniversário

Oito anos. Parece que foi o ano passado, não foi. Mas não. O tempo passa e no meu caso em particular, só vejo isso a partir dos cabelos que tenho andado a perder na minha cabeça. Os óculos vão e vêm, mas o que ainda tenho em cima são preciosos, pois se caírem, não irão voltar. A não ser que tenha dinheiro para os reimplantar. E creio que isso ainda é mais caro do que uma mulher querer ter peitos maiores, por exemplo...

Vivemos tempos interessantes. Há categorias que vivem uma reavivar, como a Endurance, e em contraste, a categoria principal, como a Formula 1, está a passar por uma crise. Os avisos de que "o rei vai nu" não faltam, mas a classe dirigente, desde o "chefão" Bernie Ecclestone até às equipas mais poderosas, não querem ouvir os avisos e preferem focar-se em assuntos secundários e quase inuteis como... o ronco dos motores. Quando querem conversar sobre isso, tenho a sensação de que vivem numa bolha, com os seus "problemas de rico", nos seus privilégios, pensando em soluções que vão até ao contrário dos interesses dos fãs, por exemplo. Quem é que gasta centenas de euros para ver um Grande Prémio nos confins do mundo, em bancadas quase vazias (o contraste mais chocante podem ver na Ásia) quando em contraste, uma corrida de Endurance, com bilhetes a um preço básico, arriscam a encher autódromos por esse mundo fora? 

No passado sábado, escrevi este desabafo na página do blog no Facebook:

"Coisas interessantes vindas da Formula 1: 

- A Ferrari, sem mexer um pintelho, ganha por ano um bónus de cem milhões de dólares da FOM, dados pelo Bernie Ecclestone. A razão? Idade. Está lá desde os primórdios do tempo. 

- Para além disso, Red Bull, McLaren, Williams e Mercedes também ganham bonus mais pequenos, totalizando 225 milhões de euros ainda antes de colocarem os parafusos nos carros deste ano. 

- Em contraste, Force India está com 50 milhões de euros de dívida e há dúvidas sobre a sua participação no GP da Austrália. (Sei, a partir de leituras dos insiders e conversas com pessoal no meio, que há salários em atraso, que vão entre um a três meses. Para não falar do chassis que "terceirizou" e agora está refém até que eles paguem o que devem.) 

- A Sauber, para conseguir participar este ano, pediu 40 milhões dos seus pilotos, mais o dinheiro da FIA pelo seu décimo lugar no Mundial de Marcas. Com esse dinheiro, pagou boa parte das dívidas e chegou a congelar o desenvolvimento do seu C34. 

- A Lotus têm 50 milhões vindos da Venezuela, mas mesmo assim não serve para abater as dividas passadas. A sorte deles é que têm um ou outro patrono que injeta dinheiro na equipa para o fazer continuar. Agora, têm motor Mercedes, mas perdeu patrocinadores para a Williams. 

Com isto tudo, eles [o Grupo de Estratégia] recusaram a entrada da Marussia em 2015 com o carro antigo, dizendo que o carro novo iria estrear a meio do ano. Contavam com os 40 milhões vindos da FOM para desenvolver o carro, embora já tenham vendido algumas instalações para a Haas, por exemplo. 

Agora, tenho uma pergunta: quantos carros teremos em Melbourne? Suspeito que teremos 16, mas posso estar errado. Em contraste, a Endurance terá o dobro de carros na pista, onde dos quais na categoria LMP1. A Formula 1 caminha alegremente para a implosão."

São os tempos que vivemos, de uma certa forma. O mais interessante é que tenho aquele instinto de que estamos à beira de uma revolução, de que aquilo que temos como certo, amanhã desaparecerá. Já falei disso há uns tempos: grande maioria dos protagonistas da Formula 1 têm mais de 65 anos e não vão andar por aqui por muito tempo. Bernie Ecclestone é o mais óbvio: se estiver vivo no final de outubro, terá 85 anos de idade.

Em contraste, todos nós ainda falamos da máquina que a Nissan colocará no Mundial de Endurance. O seu carro de motor à frente e tração dianteira será das maiores inovações desde que a Tyrrell meteu duas rodas na frente do seu modelo P34, há quase 40 anos. A Endurance deixa espaço nos seus regulamentos para que se "pense fora da caixa", e foi por isso que num passado recente adotou o conceito do Deltawing, tão criticado pelos "puristas". Apesar de vermos esse carro apenas nas corridas americanas, estou a ver o dia em que ele ganhará uma corrida.

Mas o que mais me impressiona é ver onze carros na categoria LMP1. Para além das quatro marcas (Audi, Porsche, Toyota e Nissan) teremos a Rebellion e a Kolles. apesar dos suiços não poderem estar em Silverstone por causa da mudança de motor, isso não os impede de andarem por Le Mans em junho, que é o mais importante. A a cada ano que passa, a clássica de La Sarthe torna-se crescenteente numa grande corrida e torna-se em algo mais apetecível para máquinas e pilotos. E mesmo os privados, que vão para a LMP2, acrescentam algo ao pelotão, em vez de ser o contrário. E há marcas que reavivaram através da construção de chassis, como a francesa Ligier.

E ainda falta a Formula E. Não queria dizer nada sobre ela porque queria ver com os meus próprios olhos sobre o que era isto e como é que iria ser, porque... foram apenas quatro provas que se realizaram até agora. Contudo, aquilo que vi, ele demonstra o enorme potencial que isto têm para alavancar não só a competição, como também a industria em si.

Eu sei que os carros são todos iguais, mas sei também quanto è que as equipas estão a gastar nesta primeira temporada: 350 mil euros. Apesar de ser tudo igual (chassis, unidades de energia, baterias pneus) é super-barato, em contraste com a Formula 1. Claro que com isso, as corridas são muito bem disputadas, e o vencedor é incerto - tivemos quatro em quatro corridas - mas as implicações para o futuro são enormes.

Como na Endurance, a partir da próxima temporada, os carros podem ser mexidos. O chassis será diferente, as baterias serão diferentes, as unidades de energia também. As sementes para uma "corrida às armas" estão implementadas, e qualquer ideia nova será bem recebida. Jean Todt e Alejandro Agag querem que isto tenha uma grande evolução, para que os grandes beneficiados sejam os construtores de carros elétricos. Aquilo que falta é ter uma bateria tão boa como os depósitos de gasolina dos carros, e o preço delas diminuir o suficiente para que a quota se alargue dos atuais um por cento para algo bem maior. O próprio Agag deseja que daqui a cinco anos, as baterias durem o dobro de tempo e façam uma corrida inteira. Seria bem interessante se tal coisa acontecesse.

Em jeito de conclusão sobre este campo, escrevi o seguinte na página do blog no Facebook:

"Ao contrário dos "profetas da desgraça", a Formula E têm tudo para dar certo. Os construtores estão interessados, as cidades estão interessadas, os pilotos querem correr aqui. Agora temos a Renault (e.dams) e a Audi (Abt) envolvidas, mas sei que no futuro outros aparecerão. Muitos reclamam do barulho, mas estou me marimbando. (...)"

Vistas as coisas, continuam a existir dezenas de razões para seguir o automobilismo. Se algumas categorias vivem uma decadência do qual não se consegue disfarçar, noutras, as expectativas são muito altas. Eu, ao contrário de muitos que conheci por aqui, sou um automobilista, não vejo as coisas como uma monocultura, do qual sem uma categoria, isto não têm interesse. Desde o inicio dos meus tempos que sei que o automobilismo não é só a Formula 1, e sei que este continuará se ele desaparecer ou for condenado à irrelevância. Já houve coisas assim no passado, noutras categorias, e a vida continua.

E é isso que me faz continuar por aqui. Continuar enquanto puder, enquanto estiver vivo. É por isso que neste dia de aniversário, digo: viva o automobilismo. Viva!

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