Há umas semanas, quando andei a escrever sobre Didier Pironi para a revista Speed, descrevi-o como um "Prometeu automobilistico", em que a ambição de um piloto de ser o primeiro francês a vencer o título mundial se tornou na sua perdição. E de como ele se tinha tornado, naquele verão de 1982, no piloto que todos queriam odiar.
Sobre isso era verdade: Pironi mandou às malvas a hierarquia e "traiu" Gilles Villeneuve em Imola, desencadeando uma tempestade de consequências nefastas, e todos o culpavam de "homicidio involuntário" devido ao acidente que tinha vitimado o piloto canadiano na prova seguinte, em Zolder. Mas também, à medida que conheço cada vez mais a sua história, mais começo a pensar que ele também foi uma vitima. De ambições, fugas para a frente e uma tentativa para provar que ainda podia ser competitivo.
A ambição de ser campeão estava lá. E a ambição de querer mostrar que não era um mero capacho, que Enzo Ferrari o tinha contratado da Ligier pela sua agressividade e garra na pista, e não pelo seu cabelo loiro e lindos olhos, para ficar bem na foto ao lado de Gilles Villeneuve. Só que Gilles não era cínico como Didier, e acreditava que todos eram como ele: puros e velozes. E ficou chocado com a falcatrua de Imola, como seria de esperar.
Mas o que poucos sabiam era que Pironi passava por um inferno pessoal. Tinha-se casado em março e três meses depois, em julho, esse casamento estava a desmoronar-se, aplicando ainda mais pressão sobre ele. A sensação de que ele estava isolado de um mundo que cada vez lhe era mais hostil, em vez de lhe trazer compreensão, só piorou as coisas, especialmente quando após o GP britânico, lhe ter dito que "o título era cada vez mais palpável". A ideia - que agora sabemos ser errada - de que estava a ser egocêntrico e insensível não era mais do que uma defesa perante a sua cada vez infernal vida pessoal. Não era uma ambição, mas sim uma fuga.
Os eventos de 8 de agosto de 1982, em Hockenheim não passaram de um mero azar, agravado pela fragilidade do Ferrari 126C2, que três meses antes tinha sido provado de maneira mais gravosa. Ao experimentar um novo tipo de compósitos de chuva da Goodyear, aliado ao tempo, às caracteristicas de Hockenheim e aos carros com efeito-solo, fez com que acabasse a bater na traseira do Renault de Alain Prost e se catapultasse no ar, caindo no solo não com tanto estrondo como foi no caso de Villeneuve, mas o suficiente para destruir as suas pernas.
Pironi andou os quatro anos seguintes numa obsessão para voltar a estar em forma para guiar um Formula 1. Foi operado mais de duas dezenas de vezes, mas para que lhe peagassem essas operações, tinha de dizer à seguradora que não mais iria correr na Formula 1. Recuperou o suficiente para fazer testes num bólido da AGS e outro da Ligier, em meados de 1986. Se ele era capaz de voltar à competição, sou inclinado e pensar que sim, e que se virou para os barcos apenas para satisfazer a seguradora e arranjar dinheiro para pagar as operações, provavelmente para voltar em 1988 ou 1989.
E é engraçado saber que foi um barco que causou o fim dos dois irmãos. Pironi, como é sabido, pilotou o barco "Colibri" com um casco de fibra de carbono, para vencer provas no Mundial de Motonautica, e conseguiu isso, na Noruega. Mostrou que não estava "morto" e que mantinha a competitividade, apesar de ter estado tanto tempo afastado. Mas não teve tempo para mais e a 23 de agosto de 1987, no Needles Trophy, na Ilha de Wight, ele vira-se devido a uma onda. Ele, Bernard Giroux e Jean-Claude Guenard, estavam mortos. Lembro-me desse dia, quando ouvi a noticia da sua morte num domingo à noite, no telejornal.
Acho irónico saber que existem paralelismos entre 1982 e 1987: no primeiro caso, Pironi ia a caminho da glória quando aconteceu o desastre. E no segundo caso, estava a caminho da redenção quando ocorreu a tragédia. Parecia que não queria que ele tivesse um final feliz.
O que não sabia é que alguns meses depois, o seu meio-irmão José Dolhem, tentou reerguer o projeto do Colibri, e que em abril de 1988 ia a caminho de Marselha, para falar com potenciais patrocinadores, quando o avião que pilotava tinha caído na zona de St. Etiénne, acabando por o matar também. No final, Jean-Pierre Jarier pilotou o barco por algumas provas e este acabou num museu no oeste de França. Quanto aos irmãos, estão sepultados lado a lado em Ste. Tropez, no sul do pais.
2 comentários:
Não sabia de muitos desses dados. Engraçado, tanto Didier quanto Gilles passavam por apuros conjugais naquele instante - Joanne não aguentava mais a vida dos trailers e paddocks sujos. Qunato a José Dolhem, é mesmo impressionante a sua morte estar tão ligada á de Pironi.
Foi uma infelicidade para todos aqueles que gostam de F1. Acabados de perder alguém como Gilles e pouco depois, quase campeão, sai de cena, tb de forma trágica, um fantástico piloto. tenho a sensação, embora fosse demasiadamente novo na altura, de que de fato se tratava de um piloto excepcional. A F1 ficou mais pobre depois de 82...
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