Há dois dias falei de um caso semelhante ao que sucedeu a Jules Bianchi, quando Richard Hammond, um dos apresentadores do Top Gear, sofreu um acidente grave em 2006, resultado de um furo a alta velocidade e capotou a mais de 400 km/hora. O apresentador teve em coma por duas semanas, mas recuperou dos ferimentos sem sequelas de maior.
Contudo, o Bernardo Miguel Matias, da Autosport portuguesa, falava-me de outro caso, que aconteceu há 27 anos, a do colombiano Roberto Guerrero, ex-piloto de formula 1 e com uma carreira bem longa na CART e na Indy Racing League, até com uma pole-position em Indianápolis. Piloto veloz, Guerrero, atualmente com 55 anos (nasceu a 15 de novembro de 1958 em Medellin), esteve à beira da morte em 1987, quando sofreu um acidente grave no circuito de Indianápolis, durante um teste com o seu carro de então, um March inscrito pela Vince Granatelli Racing.
Naquele ano, Guerrero era candidato ao título, depois de vitórias em Phoenix e Mid-Ohio, e um segundo lugar nas 500 Milhas de Indianápolis. Contudo, dias depois da sua segunda vitória da temporada, estava a testar na Indianapolis Motor Speedway quando perdeu o controle do seu carro, batendo na parede e um dos seus pneus atingiu-o fortemente na cabeça.
Uma testemunha desse acidente foi o Dr. Steve Olvey, que durante muitos anos foi o médico oficial da CART e da Indianápolis Motor Speedway, e lidou com muitos acidente traumáticos e mortais - o caso de Gordon Smiley foi um deles - e no seu livro "Rapid Response: My Inside Story as a Motor Racing Lifesaver" deu o testemunho do que foi esse dia de outono no "Brickyard". A versão original, em inglês - e que descobri no Facebook do Bernardo - pode ser lida neste link.
"No outono de 1987, eu estava a cortar o cabelo numa bela tarde ensolarada, em Indianápolis. A meio, recebi uma mensagem de emergência no meu pager. A notícia não era boa. Roberto Guerrero, o melhor piloto colombiano da altura, havia batido fortemente no muro ao testar pneus para a Goodyear no Indianapolis Motor Speedway. Médicos no local tinham relatado um ferimento grave na cabeça, e o paciente estava em coma profundo. Guerrero era incapaz de respirar por si mesmo e foi para o Hospital Metodista com ventilação assistida.
Eu pulei da cadeira com apenas metade de um corte de cabelo e corri para o hospital. Quando cheguei à sala de emergência, fui recebido pelo Dr. Bock, que estava de plantão naquele dia. Mike Turner, um excelente cirurgião neuro-traumatico, estava também presente. Ambos me informaram que o ferimento na cabeça parecia muito grave. A tomografia computadorizada da cabeça de Guerrero não revelou nada que os cirurgiões pudessem corrigir. Infelizmente, ele tinha mostrado um cérebro muito inchado, com uma grave lesão axonal difusa, ou LAD. Basicamente, o cérebro tinha sofrido uma lesão extensa de corte para as fibras nervosas, fazendo com que todo o sistema nervoso central tivesse entrado em curto-circuito. Não poderia ser reparado cirurgicamente. Guerrero foi transferido da sala de emergência para a unidade de cuidados intensivos.
A causa desta lesão é geralmente devido a um acidente de automóvel. As forças desse acidente, se forem suficientemente graves, fazem com que a cabeça rode violentamente. Uma lesão grave destas pode ocorrer sem que a cabeça entre em contacto com qualquer objeto. As fibras nervosas dentro do cérebro e do tronco cerebral são danificados graças a este efeito. Um capacete oferece praticamente nenhuma proteção para este tipo de lesão. A taxa de mortalidade na população geral em 1987 era de mais de 80%, e o único tratamento existene naquel altura era - e ainda é - cuidados de suporte. O uso criterioso de medicamentos para ajudar a remover o excesso de água no cérebro, e para controlar o aumento da pressão que se desenvolve no interior do crânio, são as únicas modalidades de terapia." começa por contar o Dr. Steve Olvey.
Ele depois contou que experimentaram uma terapia nova, que consistia numa enorme quantidade de barbituricos, quase numa intensidade tóxica. Tinham havido experiências anteriores, com resultados incertos, e quer ele, quer o Dr. Turner, foram ter com a mulher de Guerrero para lhe pedir a autorização para efetual esse tratamento experimental. Assim que foi concedida essa autorização, eles o fizeram, numa altura em que a sua pressão intracraniana era de 60, quando o normal é de 15. Após terem colocado a dose máxima recomendada, a pressão não diminuiu. Nas sete horas seguintes, aplicaram doses tóxicas ao doente, mesmo apesar das criticas por parte do pessoal médico sobre esta experimentação. Contudo, deu resultado: a pressão diminuiu e três semanas depois, Guerrero acordava do coma.
"Quando Guerrero falou pela primeira vez, ele falou em espanhol, sua língua nativa. Ele disse a Kati que a amava. Ele progrediu firmemente e por fim, estava pronto para uma reabilitação longa e difícil. Estimulado por Kati e pelo seu filho Marco, levou a sério. Ele foi um dos primeiros pacientes a receber o que chamamos de reabilitação cognitiva. Esta forma de exercícios de reabilitação assistida por computador, é usado para trazer as habilidades de memória visual e do motor de uma pessoa de volta à linha de base através do "biofeedback". Era muito parecido com jogar uma série complicada de videojogos. A ideia era que Guerrero passasse cinco horas por dia a fazer estes exercícios. Na realidade, ficava por nove horas. Durante este período, ele também re-aprendia a andar e a falar inglês."
(...) Como resultado dos seus esforços, da sua determinação e do seu profundo afeto, Guerrero estava dirigindo o carro da família dois meses depois e jogava golfe ao fim de três. A sua recuperação surpreendeu toda a gente."
Em abril de 1988, Guerrero pediu autorização para voltar a correr. Ele passou por uma bateria de exames extremamente rigorosa, longa e complexa, do qual resultou negativo, ou seja, estava apto a correr dentro de um carro de corridas. Repetiu essa dose na UCLA, em Los Angeles, e os resultados foram os mesmos. a sua primeira corrida foi na oval de Phoenix, onde conseguiu um grande resultado, terminando no segundo lugar. A sua carreira durou mais alguns anos, com o seu maior feito a acontecer em 1992, quando fez a pole-position nas 500 Milhas de Indianápolis, na velocidade mas alta até então... para depois se despistar na volta de aquecimento, num dos acidentes mais bizarros da história. Mas sem ferimentos.
Hoje em dia, depois de encerrar a sua carreira em 2003, com passagem pela IRL, Guerrero vive em San Juan Captristano, na California com a sua mulher e dois filhos.
"No outono de 1987, eu estava a cortar o cabelo numa bela tarde ensolarada, em Indianápolis. A meio, recebi uma mensagem de emergência no meu pager. A notícia não era boa. Roberto Guerrero, o melhor piloto colombiano da altura, havia batido fortemente no muro ao testar pneus para a Goodyear no Indianapolis Motor Speedway. Médicos no local tinham relatado um ferimento grave na cabeça, e o paciente estava em coma profundo. Guerrero era incapaz de respirar por si mesmo e foi para o Hospital Metodista com ventilação assistida.
Eu pulei da cadeira com apenas metade de um corte de cabelo e corri para o hospital. Quando cheguei à sala de emergência, fui recebido pelo Dr. Bock, que estava de plantão naquele dia. Mike Turner, um excelente cirurgião neuro-traumatico, estava também presente. Ambos me informaram que o ferimento na cabeça parecia muito grave. A tomografia computadorizada da cabeça de Guerrero não revelou nada que os cirurgiões pudessem corrigir. Infelizmente, ele tinha mostrado um cérebro muito inchado, com uma grave lesão axonal difusa, ou LAD. Basicamente, o cérebro tinha sofrido uma lesão extensa de corte para as fibras nervosas, fazendo com que todo o sistema nervoso central tivesse entrado em curto-circuito. Não poderia ser reparado cirurgicamente. Guerrero foi transferido da sala de emergência para a unidade de cuidados intensivos.
A causa desta lesão é geralmente devido a um acidente de automóvel. As forças desse acidente, se forem suficientemente graves, fazem com que a cabeça rode violentamente. Uma lesão grave destas pode ocorrer sem que a cabeça entre em contacto com qualquer objeto. As fibras nervosas dentro do cérebro e do tronco cerebral são danificados graças a este efeito. Um capacete oferece praticamente nenhuma proteção para este tipo de lesão. A taxa de mortalidade na população geral em 1987 era de mais de 80%, e o único tratamento existene naquel altura era - e ainda é - cuidados de suporte. O uso criterioso de medicamentos para ajudar a remover o excesso de água no cérebro, e para controlar o aumento da pressão que se desenvolve no interior do crânio, são as únicas modalidades de terapia." começa por contar o Dr. Steve Olvey.
Ele depois contou que experimentaram uma terapia nova, que consistia numa enorme quantidade de barbituricos, quase numa intensidade tóxica. Tinham havido experiências anteriores, com resultados incertos, e quer ele, quer o Dr. Turner, foram ter com a mulher de Guerrero para lhe pedir a autorização para efetual esse tratamento experimental. Assim que foi concedida essa autorização, eles o fizeram, numa altura em que a sua pressão intracraniana era de 60, quando o normal é de 15. Após terem colocado a dose máxima recomendada, a pressão não diminuiu. Nas sete horas seguintes, aplicaram doses tóxicas ao doente, mesmo apesar das criticas por parte do pessoal médico sobre esta experimentação. Contudo, deu resultado: a pressão diminuiu e três semanas depois, Guerrero acordava do coma.
"Quando Guerrero falou pela primeira vez, ele falou em espanhol, sua língua nativa. Ele disse a Kati que a amava. Ele progrediu firmemente e por fim, estava pronto para uma reabilitação longa e difícil. Estimulado por Kati e pelo seu filho Marco, levou a sério. Ele foi um dos primeiros pacientes a receber o que chamamos de reabilitação cognitiva. Esta forma de exercícios de reabilitação assistida por computador, é usado para trazer as habilidades de memória visual e do motor de uma pessoa de volta à linha de base através do "biofeedback". Era muito parecido com jogar uma série complicada de videojogos. A ideia era que Guerrero passasse cinco horas por dia a fazer estes exercícios. Na realidade, ficava por nove horas. Durante este período, ele também re-aprendia a andar e a falar inglês."
(...) Como resultado dos seus esforços, da sua determinação e do seu profundo afeto, Guerrero estava dirigindo o carro da família dois meses depois e jogava golfe ao fim de três. A sua recuperação surpreendeu toda a gente."
Em abril de 1988, Guerrero pediu autorização para voltar a correr. Ele passou por uma bateria de exames extremamente rigorosa, longa e complexa, do qual resultou negativo, ou seja, estava apto a correr dentro de um carro de corridas. Repetiu essa dose na UCLA, em Los Angeles, e os resultados foram os mesmos. a sua primeira corrida foi na oval de Phoenix, onde conseguiu um grande resultado, terminando no segundo lugar. A sua carreira durou mais alguns anos, com o seu maior feito a acontecer em 1992, quando fez a pole-position nas 500 Milhas de Indianápolis, na velocidade mas alta até então... para depois se despistar na volta de aquecimento, num dos acidentes mais bizarros da história. Mas sem ferimentos.
Hoje em dia, depois de encerrar a sua carreira em 2003, com passagem pela IRL, Guerrero vive em San Juan Captristano, na California com a sua mulher e dois filhos.
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