sexta-feira, 19 de junho de 2015

O dia da Formula Zero


As imagens que ilustram esta postagem são do jornal "A Bola" do dia 20 de junho de 2005. Nesse dia estava a começar um curto período de férias com os meus amigos, colegas de universidade, no Alentejo, e esperava pelo autocarro quando tentava acompanhar, na melhor medida do possível, os desenvolvimentos do GP dos Estados Unidos. Sabia da situação e tinha acompanhado os desenvolvimentos desde que Ralf Schumacher tinha batido no muro na Curva 13 (a curva 1 do Brickyard, para os mais incautos

Ao longo daquela tarde, nas horas anteriores à corrida, sempre pairou no ar as duas chances: que o impensável aconteceria, e que acabaria por haver uma espécie de "acordo de última hora" e que todos iriam correr. Mas quer eu - quer provavelmente a grande maioria dos que seguiam o caso - só acreditou no impossível quando viu os carros a pararem nas boxes após a volta de aquecimento e apenas os seis carros calçados com Bridgestone a alinharem na grelha. Aquela imagem (que depois colocarei noutro post) foi inesquecível para mim.

Não vi a corrida - estava em viagem - e sabia que não iria perder nada. E era verdade: ninguém desistiu, todos levaram os carros até ao fim e os espectadores decidiram sair da pista mais cedo, pois sentiam-se totalmente defraudados com o triste espectáculo.

Se em muitos sítios um pouco por todo o mundo se escreveu sobre a "Formula Zero", aqui em Portugal não deixou de passar a chance de comemorarmos um inédito pódio, mesmo que tenham apenas entrado seis carros na pista para dar aquele triste espectáculo que os fãs viram. Nunca comemorei esse feito, sempre tive sentimentos de repulsa por causa das circunstâncias que rodearam aquele pódio. Mas lembro dos jornais e das televisões a darem conta desse feito, porque quem estudou jornalismo sabe da importância do valor-noticia, onde um deles é a proximidade. E ter um português no pódio de um Grande Prémio de formula 1 conta, independentemente das circunstâncias.

Fiquei com a sensação de que só aqui é que se comemorou o resultado de Indianápolis, e francamente, fugi dessa comemoração, mesmo que os meus amigos soubessem da minha preferência pelo automobilismo. Andei o dia seguinte a explicar o que aconteceu e porque é que não alinhava nas comemorações. E tinha razão: não havia qualquer motivo de comemoração. Quem o fazia, era ou porque desconhecia o automobilismo (a Formula 1 em particular) ou era por um nacionalismo bacoco, como se podia ver na foto da piada da última página do jornal. 

Óbvio que o Tiago Monteiro não teve culpa do que aconteceu, nem os restantes pilotos que tinham pneus Bridgestone calçados naquele dia. E claro, a Formula 1 teve dias assim no passado (as famosas "corridas piratas" de Jarama 1980, Kyalami 1981 e Imola 1982, por exemplo) mas aqui houve mais um exemplo de como a politica da Formula 1 interferiu com as aspirações das equipas, para levar adiante as suas ideias e convições. Se querem saber porque é que temos hoje monopólios no campo do fornecimento de pneus, e provavelmente, teremos enquanto esta geração durar, esta foi a razão.

Mas também houve outra consequência: depois disto, foi aplicada a "sentença de morte" da Formula 1 no "Brickyard". A familia Hulman decidiu expirar o acordo que tinha com Bernie Ecclestone em 2007 e eles não visitaram mais o local. O regresso a paragens americanas apenas aconteceu em 2012, quando foi construido o Circuito das Américas, em Austin, um projeto de raíz feito pela Formula 1 (desenhado por Hermann Tilke), para a Formula 1. De uma certa maneira, a Formula 1 é o que é porque eles querem assim. Qualquer coisa que não concordam, ou do qual eles sairiam desautorizados, preferem dar tristes espectáculos ao mundo, desrespeitando os fãs, só para que eles saiam a ganhar. Nesse dia, os vencedores foram Max Mosley e Bernie Ecclestone, e nós fomos todos perdedores.

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