segunda-feira, 10 de junho de 2019

A imagem do dia

Ainda é cedo para dizer se isto é a imagem do ano, mas que é a imagem do fim de semana que passou, lá isso é. Sebastian Vettel é o vencedor moral do GP do Canadá, e acabou na frente da corrida, que não foi para ele por causa da decisão dos comissários da Formula 1 em o penalizar por causa de um erro que cometeu, quando estava a aguentar os ataques de Lewis Hamilton.

O problema não foi o erro que cometeu. O problema foi que ele voltou para a pista ainda na primeira posição. Noutros tempos, seria uma manobra elogiada pela coragem do piloto, que dominou a máquina contra o desastre iminente, e tinha salvado a vitória das garras da derrota ou algo assim. Agora, o que os comissários queriam era que ele cedesse o lugar para o segundo classificado, ou então que batesse. Como nada disso aconteceu, decidiram penalizar o piloto em cinco segundos. Ele, que se defendeu, nem colocou o adversário em perigo, nem ele reclamou da manobra.

A atitude dele não é a de mau perder. É a de alguém que afirma ter roubado uma vitória que anda à procura desde o inicio do ano, e não alcança. Não é só o carro que não funciona, é quando tem uma chance ou quando é melhor que os Mercedes dominadores, aparece algo, seja o azar ou o "comissário maldoso" que impede que a Ferrari seja o triunfador. 

Poucas horas depois, ao ver as reações nas redes sociais, poucos defendem a decisão dos comissários. Li Alex Wurz, Nigel Mansell, Mark Webber, Mário Andretti, Pedro de la Rosa, Jenson Button, e todos foram unânimes: defendem Vettel da decisão dos comissários. Porque já fizeram coisas dessas nos tempos deles. É a velha frase do Ayrton Senna no GP da Austrália de 1990, quando justificou a batida no Alain Prost: se não lutas pela nesga, não és piloto. Aqui não foi lutar por nesgas, foi defender uma posição depois de um erro. E nem houve toque, como fez Michael Schumacher em Adelaide, em 1994.

Eis a ironia: Vettel lutava por uma posição. Exatamente o tipo de manobra que aplaudiriam se fosse o Senna, ou se calhar o Hamilton.

O problema é outro, e vai para além de lutas entre pilotos e entre equipas. Uma certa Formula 1 é mesquinha. Sempre houve mesquinhez, é uma característica humana, bem seja dita. Só que nestes dias, no final de segunda década do século XXI, é uma onde santifica e beija os pés de Lewis Hamilton, que já é o maior de todos os tempos, e deseja que fique com todos os recordes, etc. Mas também têm ódio ao Vettel. E já vem desde os seus tempos na Red Bull. Lembro bem em 2012, quando durante boa parte da temporada europeia, nos pódios, havia imensa gente que apupava o alemão quando cantava o hino alemão, ou quando ele falava à imprensa. E agora, há quem aplauda quando ele erra, ou quando desiste. E conheço pessoas que sei que vão comemorar quando abandonar a Ferrari e a Formula 1.

E ao ver esta imagem, essa gente usou e vai usar frases simples e feitas nas redes sociais, o grande megafone dos nossos dias:

"Vettel é um chorão"
"Vettel não sabe perder"
"Vettel é um fraco"
"O que é que ele ainda está a fazer na Ferrari? Deveriam despedi-lo já!"
"Vettel é um fracasso"
"Leclerc deveria ser primeiro piloto já!"

Coisas assim. Nem falo do outro lado, basta ir buscar suplelativos.

Até digo isto: se fosse Ayrton Senna a carregar aquele sinal, seria visto como um herói, um rebelde, e já estariam a fazer as medidas para que se erguesse uma estátua dele num canto qualquer deste planeta. Como é o Vettel, é Lúcifer encarnado. Por outras palavras: dois pesos, duas medidas. 

Mas depois esquecem-se do "quadro grande", e quando falo disso, alguns torcem o nariz por menosprezo. Primeiro que tudo, umas declarações do Vettel no pódio:

"Merecíamos ter vencido hoje e esta é a opinião das pessoas por aqui. É estranho agora. Este tipo de decisões não estão a popularizar o nosso desporto, as pessoas querem ver-nos correr e estávamos a correr.", afirmou.

E é isso mesmo que quero falar. A Formula 1 não está sozinha, não vive sozinha numa torre de marfim. Não pode ter decisões destas e dizer que não há alternativas, porque começa a haver. Este final de prova na secretaria é dificil de explicar para os fãs atuais. E como eles irão buscar novos fãs? Não defendo a lei da selva, mas um conjunto de regras simples e gerais, dos quais em situações como estas haja a figura do "in dubio pro reo", que a intervenção seja a excepção e não a regra. Se é para intervir para todas as situações como aquela, então qualquer dia, tem de ser a torre de controlo a ditar as ultrapassagens entre piloto A e B. É assim que queremos que a Formula 1, e o automobilismo em geral seja definido? E que ideia passamos para fora, para o adepto comum?

Parecendo que não, estas decisões não passam de "tiros nos pés". E qualquer coisa que a Formula 1 faça a partir de agora, pode fazer com que o fã decida e diga "vou mas é ver outra categoria".

E no meio do ruído, passou despercebido um tweet do Lucas di Grassi. Entre uma frase a dizer: "make racing great again!", ele afirmava deixar o desenvolvimento deste tipo de coisas para o pessoal da Roborace, a competição no qual ele está envolvido. E parecendo que não, todas estas más decisões só podem dar razão para estas novas categorias.   

Em jeito de conclusão: isto vai dar pano para mangas. Só que isso não deveria ser a Formula 1. Mas é.

1 comentário:

Ismael disse...

É aterrador.
Este fim de semana não vi.
E só posso dizer: ainda bem que não vi. Felizmente que não vi.