sexta-feira, 22 de julho de 2022

A imagem do dia


Em 1964, como acontece hoje, o Rally de Monte Carlo era uma verdadeira aventura para todos os pilotos. Realizado desde 1911, acontecia em janeiro e debaixo de neve, em estradas dos Alpes franceses, era o palco ideal para que diferentes fabricantes de automóveis vindos de todo o mundo usavam para apresentar seus modelos. Consequentemente, veículos de diferentes classes e desempenho competiam uns contra os outros.  

Uma dessas marcas era a BMC, British Motor Corporation, que desde 1959 fabricava o Mini, um carrinho idealizado por Alec Issigonis para a estrada, com um motor pequeno e economicamente eficiente. O carro era um sucesso de vendas, mas em 1961, John Cooper, da marca que tinha construído e competido vitoriosamente na Formula 1, com Jack Brabham, achou que o carro tinha potencial vencedor e decidiu preparar esse carro ágil com um motor mais potente e alimentado, de um litro, suficiente para ficar a par de carros mais potentes.

Em 1964, a Mini alinhou com três carros para a prova, a contar para o Europeu de ralis. Dois deles seriam conduzidos por finlandeses, Raulo Aaltonen e Timo Makinen, e o terceiro seria guiado pelo norte-irlandês Paddy Hopkirk, navegado por Henry Liddon. Partindo de diversos pontos da Europa - Hopkirk e os seus companheiros largaram de Minsk, na então União Soviética - chegavam aos Alpes onde cumpriam uma série de especiais culminando com uma passagem por Monte Carlo, no percurso que a Formula 1 faria na primavera. O Mini Cooper já era um carro ágil e começava a ter resultados nas pistas, mas ainda não tinha tido a vitória neste rali. 

O rali foi um duelo entre Hopkirk e o mais potente Ford Falcon guiado pelo sueco Bo Ljungfeldt. No final, decidiu-se no Col de Turini, no dia seguinte à queda de neve no local, onde as condições requeriam mais cautela. Com um carro pequeno, mas ágil, o Mini conseguiu a vantagem decisiva para triunfar, algo improvável pelo seu tamanho, mas todos entenderam que os vencedores não se mediam aos palmos.  

Anos depois, Hopkirk falou sobre o carro e aquilo que gostava dele: 

"O Mini era um automóvel muito avançado. Sua tração dianteira e o motor transversal na frente apresentavam vantagens significativas, assim como o fato de que o carro era pequeno, já que as estradas tinham muitas curvas e eram estreitas".

O primeiro triunfo da Mini em Monte Carlo, e o facto de o vencedor ser britânico catapultou-o para a fama. O primeiro-ministro de então, Alec Douglas-Home, e os membros dos The Beatles mandaram-lhe telegramas de parabéns, a cidade de Belfast deu-lhe as chaves da cidade, e apareceu na televisão com o seu carro, o número 37 na carenagem e a sua matrícula, o 37 FJB, tinha entrado na imaginação dos britânicos. 

Mas por essa altura, Hopkirk, então com 30 anos, já tinha uma carreira de piloto de ralis atrás de si. Começara nos "hillclimbs" em 1953 num Fusca, depois de algum tempo a trabalhar nas oficinas da marca alemã, apaixonado pelo automobilismo. Os ralis surgiram em 1955, primeiro pela Triumph, depois, para a Hillman, em 1959. Ganhara o Circuit of Ireland em 1961 e 1962, mas mudara-se para a BMC em 1963, após ter experimentado um Austin-Healey guiado por Pat Moss, a irmã de Stirling Moss. Os Minis surgiram mais tarde, e ele tinha sido terceiro no Tour de France Automoblie desse ano, atrás apenas de dois Jaguares de 3.8 litros.

Depois de Monte Carlo, o seu maior feito não foi uma vitória. Foi um gesto solidário para salvar vidas. Em 1968, no Londres-Sydney, na penúltima etapa do rali, Hopkirk liderava quando assistiu à sua frente ao acidente que envolveu o Citroen DS guiado por Lucien Bianchi e navegado por Jean-Claude Ogier. Ele e o seu navegador, Tony Nash, tinham visto a colisão com outro carro, e correram para os destroços para tirar os passageiros, antes do carro começasse a pegar fogo. O gesto custou-lhes a liderança e a vitória no rali - acabaram em segundo, atrás do vencedor, o escocês Andrew Cowan - mas o gesto valeu-lhes um prémio de fair-play. 

Hopkirk retirou-se no final de 1970, montou um negócio de acessórios para automóveis com o seu nome e tornou-se dirigente do British Racing Drivers Club. Ajudou em 2011 no projeto da Mini quando regressaram ao WRC, pouco depois de ter entrado no Rally Hall of Fame, na Finlândia, ao lado de Makinen, Aaltonen e o sueco Erik Carlsson.

Paddy Hopkirk morreu esta quinta-feira, aos 89 anos. Ars longa, vita brevis

1 comentário:

MNorkus disse...

Além desta vitória, este carro ganhou minha paixão quando assisti ao filme Um Golpe a Italiana, um épico inesquecível. Um charme de veículo. Se eu encontrasse um desses a venda faria o possível para compra-lo. Maurício Norkus, Recreio, Rio de Janeiro