O jornal português i não esqueceu que hoje se comemoram os 30 anos da estreia de Alain Prost na categoria máxima do automobilismo, so serviço da McLaren, e decidiu dedicar duas páginas a essa figura, entrevistando-o. Claro, para além de debitar as recordações sobre o fim de semana argentino, a sua carreira também foi referida, desde as suas passagens pela Renault, McLaren, Ferrari e Williams, até sobre a actualidade, nomeadamente o regresso de Schumacher à competição. E obviamente, os episódios que viveu com Ayrton Senna.
Alain Prost: "A minha história e de Senna nunca vai repetir-se"
por Filipe Duarte Santos, Publicado em 13 de Janeiro de 2010
"Ninguém pode falar de Ayrton Senna sem falar no meu nome e ninguém pode falar de Prost sem falar no dele." A regra foi lançada por Alain Prost numa entrevista a uma televisão brasileira, há uns anos. Ainda bem, vamos respeitá-la, apesar de hoje passarem trinta anos da primeira corrida do francês no Mundial de Fórmula 1: Grande Prémio da Argentina, 13 de Janeiro, o pequeno piloto senta-se num McLaren e consegue o sexto lugar e um ponto no dia de estreia. Percebeu-se logo que era rápido, raramente se deixava apanhar. Ao telefone deve ser mais ou menos a mesma coisa - depois do contacto agendado, Prost pára finalmente, atende e cede umas palavras.
Alain Prost, boa tarde.
Podia ter sido bom dia... peço desculpa mas tenho andado bastante ocupado.
Já sabe o motivo desta conversa: os 30 anos da sua estreia no Mundial de Fórmula 1, Grande Prémio da Argentina. Lembra-se?
Claro... por um lado, pensar nisso agora deixa-me um bocado triste, 30 anos é muito tempo! [risos] Por outro, é bom poder falar agora, quer dizer que sobrevivi àqueles tempos. Naquela altura a Fórmula 1 era muito perigosa.
Conseguiu logo fazer um ponto.
É verdade, um ponto. Lembro-me de uma corrida muito dura, o asfalto da pista estava perigoso e causou muitos problemas, houve vários acidentes. Também não me esqueço de que foi extraordinário para mim poder estrear-me na Argentina, um país com uma paixão tão grande pelo automobilismo.
Ficou com a sensação de que ia longe?
Não, nessa corrida não deu para perceber o que valia. Sabia que era um piloto rápido em qualificação mas a prova do meu valor só veio na segunda corrida em Interlagos (GP Brasil): em condições normais bati Patrese e acabei em quinto lugar. Aí mostrei o que podia fazer.
Quem o impressionava na altura?
Encontrei grandes nomes, era uma fase de pessoas com carácter e personalidade... Emerson [Fittipaldi], [Jody] Scheckter, [Gilles] Villeneuve, os franceses [Jacques] Laffite, [René] Arnoux e [Didier] Pironi. Apareci e vi nomes importantes, sei disso, especialmente se tiver em conta que o futuro foi um bocado diferente.
Estreou-se na McLaren mas um ano depois estava na Renault e ganhou a primeira corrida no GP França. Piloto francês, carro francês, solo francês, não podia ser mais perfeito.
Sim, mas mais do que isso, primeiro que tudo pensei em mim, porque era fundamental ganhar a primeira corrida e provar a mim mesmo: "Eu consigo." É preciso ganhar para lá andar.
Faltou-lhe ser campeão na Renault?
Faltou e foi pena. Tivemos potencial mas faltou sempre alguma coisa, em 1981, 82 e 83. Depois, a Renault foi campeã com o Fernando Alonso [2005 e 2006] mas, como sabe, aí já era uma equipa mais inglesa que francesa.
E em 1984 lá foi para a McLaren, onde foi três vezes campeão do mundo.
Apesar de toda a luta e de todas as dificuldades sempre senti a McLaren como a minha família. E olhe que a época de 1989 foi muito dura , decidi sair logo no Verão, apesar de saber que tinha sido ali que tinha encontrado os meus títulos [1985, 1986 e 1989].
Foi o tempo do choque com Senna. Como é que o recebeu na equipa?
Ah... a história de Prost e Senna é demasiado longa para se contar em dois ou três detalhes, não podemos falar disso em dois minutos. No início tivemos uma boa relação, depois distanciámo-nos, mas no final voltámos a falar muito. A história de Prost e Senna nunca mais vai repetir-se na Fórmula 1, tanto pelo nosso pelo carácter como pela forma como estávamos nos nossos carros, em pista, ou como disputámos corridas.
Disse numa entrevista que, perto do final [acidente mortal em Imola, 1994], Senna o abordou muitas vezes preocupado com os problemas de segurança.
Falámos muito disso e falámos da segurança em geral, percebi também a motivação que lhe faltava naquela altura, porque sentia que carro e equipa não estavam bem. E claro, no meio de tudo isso, conheci finalmente o seu lado humano.
Por isso fez questão de ir ao funeral de Senna ao Brasil?
Apesar da rivalidade e de tudo o que possa pensar-se, nunca tive problemas no Brasil ou com os brasileiros. Mesmo assim não sabia se devia ir ao funeral, porque podia ser mal interpretado. Cheguei a falar com uma brasileira, mulher de um conhecido meu, para perceber qual era a sensibilidade deles. Devo ir? Claro que fui, tinha de ir e não me arrependo.
Algumas das conversas que Senna teve consigo tinham que ver com suspeitas de ilegalidade num carro da Benetton, guiado por um rapaz que se chamava Michael Schumacher. Esse rapaz tem 41 anos e está de regresso em 2010, para voltar a ganhar?
Sim, o Schumacher estava a aparecer naquela altura... [Campeão do mundo em 1994.] Agora, tanto tempo depois, volta porque está numa situação perfeita: tem o Ross Brawn a seu lado, tem uma equipa que lhe dará todo o apoio, tudo pode acontecer.
Como vai ser o Mundial?
Já viu como a Formula 1 é extraordinária e tem esta capacidade de se renovar? Regressa um grande nome, o interesse alastra, de repente há uns sete ou oito pilotos em quatro equipas com condições para serem campeões. Alonso, Massa, Hamilton, Button, Schumacher, Rosberg, Vettel... Agora, o Schumacher vai ser competitivo? Claro que isso também vai depender do carro.
No seu regresso, após a paragem em 1993, foi logo campeão na Williams.
Sim, mas foi diferente, no fundo estive apenas seis meses sem competir, não tive problemas físicos. Em princípio, do ponto de vista físico Schumacher estará bem, tem treinado muito e está sempre a testar e a fazer corridas, nem que seja de moto. Mas ainda há outra questão: a motivação. Terá agora a mesma força que teve no início?
Schumacher teria ganho tanto [sete vezes campeão] se tivesse encontrado Prost e Senna na Formula 1?
Não acho. É claro que as comparações só podem fazer-se na mesma altura, com os mesmos carros e as mesmas pistas; teria sucesso mas penso que haveria grandes rivalidades.
Senhor Prost, obrigado pela atenção. Já agora, que tem andado a fazer?
Na verdade, nada que seja muito interessante para vocês [risos].
E os automóveis e as corridas?
Isso agora é passado.
Alain Prost: "A minha história e de Senna nunca vai repetir-se"
por Filipe Duarte Santos, Publicado em 13 de Janeiro de 2010
"Ninguém pode falar de Ayrton Senna sem falar no meu nome e ninguém pode falar de Prost sem falar no dele." A regra foi lançada por Alain Prost numa entrevista a uma televisão brasileira, há uns anos. Ainda bem, vamos respeitá-la, apesar de hoje passarem trinta anos da primeira corrida do francês no Mundial de Fórmula 1: Grande Prémio da Argentina, 13 de Janeiro, o pequeno piloto senta-se num McLaren e consegue o sexto lugar e um ponto no dia de estreia. Percebeu-se logo que era rápido, raramente se deixava apanhar. Ao telefone deve ser mais ou menos a mesma coisa - depois do contacto agendado, Prost pára finalmente, atende e cede umas palavras.
Alain Prost, boa tarde.
Podia ter sido bom dia... peço desculpa mas tenho andado bastante ocupado.
Já sabe o motivo desta conversa: os 30 anos da sua estreia no Mundial de Fórmula 1, Grande Prémio da Argentina. Lembra-se?
Claro... por um lado, pensar nisso agora deixa-me um bocado triste, 30 anos é muito tempo! [risos] Por outro, é bom poder falar agora, quer dizer que sobrevivi àqueles tempos. Naquela altura a Fórmula 1 era muito perigosa.
Conseguiu logo fazer um ponto.
É verdade, um ponto. Lembro-me de uma corrida muito dura, o asfalto da pista estava perigoso e causou muitos problemas, houve vários acidentes. Também não me esqueço de que foi extraordinário para mim poder estrear-me na Argentina, um país com uma paixão tão grande pelo automobilismo.
Ficou com a sensação de que ia longe?
Não, nessa corrida não deu para perceber o que valia. Sabia que era um piloto rápido em qualificação mas a prova do meu valor só veio na segunda corrida em Interlagos (GP Brasil): em condições normais bati Patrese e acabei em quinto lugar. Aí mostrei o que podia fazer.
Quem o impressionava na altura?
Encontrei grandes nomes, era uma fase de pessoas com carácter e personalidade... Emerson [Fittipaldi], [Jody] Scheckter, [Gilles] Villeneuve, os franceses [Jacques] Laffite, [René] Arnoux e [Didier] Pironi. Apareci e vi nomes importantes, sei disso, especialmente se tiver em conta que o futuro foi um bocado diferente.
Estreou-se na McLaren mas um ano depois estava na Renault e ganhou a primeira corrida no GP França. Piloto francês, carro francês, solo francês, não podia ser mais perfeito.
Sim, mas mais do que isso, primeiro que tudo pensei em mim, porque era fundamental ganhar a primeira corrida e provar a mim mesmo: "Eu consigo." É preciso ganhar para lá andar.
Faltou-lhe ser campeão na Renault?
Faltou e foi pena. Tivemos potencial mas faltou sempre alguma coisa, em 1981, 82 e 83. Depois, a Renault foi campeã com o Fernando Alonso [2005 e 2006] mas, como sabe, aí já era uma equipa mais inglesa que francesa.
E em 1984 lá foi para a McLaren, onde foi três vezes campeão do mundo.
Apesar de toda a luta e de todas as dificuldades sempre senti a McLaren como a minha família. E olhe que a época de 1989 foi muito dura , decidi sair logo no Verão, apesar de saber que tinha sido ali que tinha encontrado os meus títulos [1985, 1986 e 1989].
Foi o tempo do choque com Senna. Como é que o recebeu na equipa?
Ah... a história de Prost e Senna é demasiado longa para se contar em dois ou três detalhes, não podemos falar disso em dois minutos. No início tivemos uma boa relação, depois distanciámo-nos, mas no final voltámos a falar muito. A história de Prost e Senna nunca mais vai repetir-se na Fórmula 1, tanto pelo nosso pelo carácter como pela forma como estávamos nos nossos carros, em pista, ou como disputámos corridas.
Disse numa entrevista que, perto do final [acidente mortal em Imola, 1994], Senna o abordou muitas vezes preocupado com os problemas de segurança.
Falámos muito disso e falámos da segurança em geral, percebi também a motivação que lhe faltava naquela altura, porque sentia que carro e equipa não estavam bem. E claro, no meio de tudo isso, conheci finalmente o seu lado humano.
Por isso fez questão de ir ao funeral de Senna ao Brasil?
Apesar da rivalidade e de tudo o que possa pensar-se, nunca tive problemas no Brasil ou com os brasileiros. Mesmo assim não sabia se devia ir ao funeral, porque podia ser mal interpretado. Cheguei a falar com uma brasileira, mulher de um conhecido meu, para perceber qual era a sensibilidade deles. Devo ir? Claro que fui, tinha de ir e não me arrependo.
Algumas das conversas que Senna teve consigo tinham que ver com suspeitas de ilegalidade num carro da Benetton, guiado por um rapaz que se chamava Michael Schumacher. Esse rapaz tem 41 anos e está de regresso em 2010, para voltar a ganhar?
Sim, o Schumacher estava a aparecer naquela altura... [Campeão do mundo em 1994.] Agora, tanto tempo depois, volta porque está numa situação perfeita: tem o Ross Brawn a seu lado, tem uma equipa que lhe dará todo o apoio, tudo pode acontecer.
Como vai ser o Mundial?
Já viu como a Formula 1 é extraordinária e tem esta capacidade de se renovar? Regressa um grande nome, o interesse alastra, de repente há uns sete ou oito pilotos em quatro equipas com condições para serem campeões. Alonso, Massa, Hamilton, Button, Schumacher, Rosberg, Vettel... Agora, o Schumacher vai ser competitivo? Claro que isso também vai depender do carro.
No seu regresso, após a paragem em 1993, foi logo campeão na Williams.
Sim, mas foi diferente, no fundo estive apenas seis meses sem competir, não tive problemas físicos. Em princípio, do ponto de vista físico Schumacher estará bem, tem treinado muito e está sempre a testar e a fazer corridas, nem que seja de moto. Mas ainda há outra questão: a motivação. Terá agora a mesma força que teve no início?
Schumacher teria ganho tanto [sete vezes campeão] se tivesse encontrado Prost e Senna na Formula 1?
Não acho. É claro que as comparações só podem fazer-se na mesma altura, com os mesmos carros e as mesmas pistas; teria sucesso mas penso que haveria grandes rivalidades.
Senhor Prost, obrigado pela atenção. Já agora, que tem andado a fazer?
Na verdade, nada que seja muito interessante para vocês [risos].
E os automóveis e as corridas?
Isso agora é passado.
3 comentários:
Prost sempre soube lidar bem com a imprensa, principalmente a seu favor. Nas entrevistas recentes nota-se que ele não perdeu a forma!
aló:
isso que é entrevistado! o povo se queixa tanto da qualidade da imprensa e esquece que os personajems abordados as veces ficam em lapsus e clichés.... gostei de ver o profesor com respostas tão honestas.
muito legal o comentário dele sobre o lado humano de Senna. acho que são sim dois nomes inseparáveis, e isso não é cliché, é tema pra muito post
Boa entrevista, piloto genial.
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