Ao visitar na semana passada o blogue Volta Rápida, do Paulo Abreu, deparei com uma entrevista que a revista brasileira "Quatro Rodas" fez em fevereiro de 1977 a Bernie Ecclestone, então patrão da Brabham e a dar os primeiros passos na sua associação dos Construtores, que passaria à história como FOCA, e que no final da década iria agitar as águas ao exigir uma parte dos lucros que já provinham das televisões e ameaçar criar uma série paralela, feita pelas suas regras, livrando-se da FISA, que seria liderada pelo francês Jean-Marie Balestre.
O que me salta à vista nesta sua entrevista, onde fala um pouco sobre si mesmo, sobre José Carlos Pace, dos motores Alfa Romeo e da possibilidade de o Brasil - numa altura da crise petrolífera - ficar sem competições automobilisticas por ordem do governo militar de então, é quando se aborda a questão dos motores Turbo, que já se sabia por essa altura que iriam entrar ainda em 1977 através da francesa Renault. A reação de Ecclestone a esta matéria é lapidar, do qual transcrevo para aqui:
"QR – Como vê a entrada dos motores turbo na Fórmula 1?
BE – Não será possível admitir motores turbo na Fórmula 1, porque teríamos que fazer uma modificação total nos regulamentos, utilizar outro tipo de combustível, mais complicado. E, por favor, acredite-me, não há possibilidades. A utilização do motor turbo nos protótipos é diferente, porque tem outro coeficiente de cilindrada 2.200cc com turbo para elevar para 3.000, enquanto que na Fórmula 1 os motores turbo têm que se ter apenas 1.500cc. Fui assistir a uma competição com carros turbo e a diferença de potência entre eles é muito grande, não havendo competitividade. A Porsche tentou uma vez utilizar um motor turbo e não deu certo. Acredito que não temos nada mais avançado que os atuais motores da Fórmula 1."
Uma das conclusões que chego é que quase 35 anos depois, o estilo de Ecclestone não muda. Este tipo de discurso, caso se modificassem os tópicos, seria exactamente igual ao dos dias de hoje. Mas o que acho surpreendente é que ele tenha sido contra a introdução dos motores Turbo, pelas indicações que o extrato acima colocado refere. Honestamente, acho que é sintomático do seu discurso: é mais um dos seus "achismos bombásticos" que polvilhou a imprensa ao longo dos mais de quarenta anos em que esteve envolvido na Formula 1.
Mas mesmo esse "achismo" tem razão de ser, se olharmos para a o resto da História. Em 1981, quando ele, em nome da FOCA, decidiu criar a sua série paralela, correndo aquele Grande Prémio "pirata", em Kyalami, todos os 19 carros presentes tinham motores Ford Cosworth. Até então, mais do que lutar contra a abolição das "saias", também era anti-Turbo, pelo menos na aparência. Mas ele conhece sobejamente aquela frase: "se não consegues batê-los, junta-te a eles". E, esperto como sempre, no final desse mesmo ano de 1980 já tinha feito um acordo com a alemã BMW para que eles fizessem um motor Turbo para colocar nos seus carros a partir da temporada de 1982. E Hans-Joachim Stuck fazia os primeiros testes num modelo BT49.
Em suma, o segredo do sucesso de Ecclestone é ser esperto e "saber onde sopra o vento". E a não ligar ao que ele diz num momento, pois sendo oportunista que é, mais adiante nesse caminho estará a dizer o contrário, desde que veja algo no qual saia a ganhar. E foi o que aconteceu: graças ao motor BMW Turbo, ganhou o título de Pilotos em 1983, com Nelson Piquet, e ajudou a moldar os anos 80, que foi conhecido como... "a era Turbo", que durou até 1988, quando a FIA decidiu abolir esse tipo de motores.
Razão tinha José Carlos Pace quando o chamava de "anãozinho tenebroso".
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