segunda-feira, 10 de dezembro de 2018

O futuro do automóvel, por Mate Rimac


Ontem, apareceu no jornal "Público" uma matéria de duas páginas sobre Mate Rimac, o croata fundador e empreendedor que constrói supercarros eléctricos. Esteve no mês passado na Web Summit de Lisboa para falar da sua empresa, do seu negócio e o que vai ser o futuro dos automóveis.

Muitos fora do universo automóvel podem nunca ter ouvido falar de Mate Rimac. Mas neste mundo do qual reconheço que sigo muita coisa, Rimac é um dos nomes em ascensão na industria. Tem apenas 30 anos, é croata e á um génio inventivo. E é graças a ele que o seu país está na industria automóvel, graças aos seus hipercarros elétricos. Não só fabrica automóveis, como também fabrica componentes eletrónicos que acabam noutras marcas de automóveis, principalmente na sua vertente elétrica. O seu "know-how" é tal que a Porsche comprou no ano passado dez por cento da sua marca, a troco de 18,4 milhões de euros, que investiu no Concept Two e noutras tecnologias.

Muitos chamam Rimac de "Elon Musk europeu", mas há quem ache mais ser um herdeiro de Nikola Tesla, pois apesar de ele ser sérvio, Tesla nasceu num lugar agora situado na Croácia. E também ao contrário de Musk, que investiu dinheiro na venda da PayPal para formar a Tesla, Rimac começou do zero: muito génio mental, capacidade de invenção da sua parte e o amor por tudo mecânico. Aos 17 anos, tinha ganho um prémio por ter inventado uma luva que funcionava como teclado e rato de computador, e com vinte anos, comprara um BMW Serie 3 de 1984, que o converteu para elétrico na garagem do seu pai.

Sendo croata, lia muitas coisas sobre Nicola Tesla e o motor eléctrico dele. Convenci-me que seria a melhor solução e decidi converter o BMW para mostrar como carros eléctricos podem ser empolgantes e interessantes, além de mais rápidos”, começou por dizer. "No início, os resultados foram péssimos. Imaginem: um carro construído na minha garagem, havia sempre qualquer coisa que falhava - ou era o motor que ardia ou eram as baterias. Mas nunca desisti e fui tentando melhorar de corrida para corrida”, continuou.

Em 2010 decidiu dar o passo seguinte, ao construir o seu próprio carro e no ano seguinte, o protótipo foi apresentado no Salão Automóvel de Frankfurt. O Concept One foi construido num ano, na garagem de um amigo, e ficou pronto a tempo de ser entregue à familia real de Abu Dhabi, que encomendou o automóvel. Depois disso, recebeu mais oito encomendas, e construiu o suficiente para dar o passo a seguir: o Concept Two, que já tem 150 encomendas, tantos quantos serão feitos.

Quando eu comecei, a Tesla era a única novidade que valia a pena seguir. O que está a acontecer agora não teria sido possível sem eles. Há muitas críticas, mas quem as faz ignora o que eles conseguiram. É uma empresa relativamente pequena, nova na indústria, construiu uma rede global de supercarregadores e um carro que, seis anos depois do lançamento, ainda é, de longe, a referência para uma indústria gigantesca que movimenta milhares de milhões de dólares. O Model S entrou no mercado em 2012, a concorrência teve seis anos para se colocar ao mesmo nível e ainda não o conseguiu”, defende.

Apesar de Rimac afirmar não ter uma bola de cristal que adivinhe o futuro, afirma ter uma visão clara do presente: que muitos incumbentes do sector “estão de cabeça perdida”. “É uma das maiores indústrias do planeta e há muitos fabricantes que têm muito a perder, porque o modelo de negócio está em risco”, sustenta.

Rimac afirma que a grande revolução não vai ser no tipo de propulsão do automóvel, mas sim em como o usaremos. A propriedade de um automóvel desaparecerá em favor do seu usufruto, partilhado por outros conforme as suas necessidades, a um determinado preço. E o grau de autonomia na condução será de tal forma grande que a pessoa não terá tanta necessidade de conduzir, que poderá baixar o número de acidentes como o de engarrafamentos.

A electrificação não é uma grande viragem”, continua. “A grande alteração será na mobilidade. Para os consumidores, [o motor eléctrico] é uma mudança pequena, passam a recarregar o carro em casa ou num posto em vez de abastecer o depósito com combustível fóssil. O que vai mudar é a relação que temos com o carro. A compra é feita a pensar em necessidades, mas é feita segundo crenças. Porque o carro está parado 97 por cento do tempo. É um desperdício de espaço, de material, de recursos. No futuro, vamos deixar de os comprar, vamos usá-los on demand, será um objecto sem condutor, eléctrico, e isso sim será realmente uma grande mudança”, argumenta. 

A eficiência de frotas inteligentes, com carros conectados e sem condutor é gigantesca. Pode ser até 80 por cento mais barato do que o recurso a um táxi, 70 por cento mais barato do que um Uber e 50 por cento mais barato do que o uso de carro próprio. Isto sim será a força motriz da mudança”, defende.

E em relação à autonomia dos carros eléctricos, Rimac afirma ser uma “falsa questão” porque “uma autonomia de 20 km cobriria 95 por cento das necessidades. O problema é que depois compramos carros para os outros cinco por cento dos casos. Um erro.

A evolução da Rimac teve altos e baixos. Um dos momentos mais criticos foi em junho de 2017, quando se soube que um dos Concept One, emprestado a Richard Hammond para gravar um dos episódios do The Grand Tour na Suíça, acabou no fundo de uma ravina, durante uma subida de montanha. Hammond quebrou o joelho esquerdo e o carro ardeu... por quatro dias. Rimac estava nessa altura a conversar com investidores e as coisas poderiam ter corrido mal. Mas eles confiaram no projeto. Aliás, eles não tem tido mãos a medir, com tantas solicitações de vários lados. Tanto que tiveram de recusar algumas propostas, apostando tudo nos automóveis.

Esta é a altura das oportunidades, tivemos de aprender a dizer que não. Todos vêm ter connosco, barcos, camiões, aviões, aplicações aerospaciais, armazenamento energético, contentores. Tivemos de dizer que não porque fazer crescer uma empresa exige foco. E o nosso está nos nossos próprios carros eléctricos desportivos, na propulsão eléctrica de alta performance e nas baterias.”, concluiu.

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