domingo, 5 de junho de 2011

Grand Prix 1972 - Um jantar de campeões

Pouco depois, os mesmos seis do pequeno almoço chegavam a um dos mais selectos restaurantes da cidade, onde eram esperados à porta por um “conciérge”, que pegou no seu carro e o estacionou num parque privativo. À porta estava o dono do restaurante, que os esperava para os levar rumo à mesa enorme e redonda, onde cabiam doze pessoas. Lá, o anfitrião os esperava, e não era um qualquer: era El Chueco.

Juan Manuel Fangio era um previlegiado, em todos os aspectos. Não tanto porque era um homem de negócios bem sucedido, mas também a sua posição era de lenda no seu país e era tratado como tal. Tinha sobrevivido às escassas hipóteses de sobrevivência e tinha sido o piloto mais bem sucedido do seu tempo, vencendo cinco títulos mundiais. Agora, com sessenta anos de idade, e quase quinze anos depois da sua última corrida, a sua aura crescia mais do que nunca e todos o reverenciavam, incluindo todos os que ali estavam.

Fangio tinha convidado Harry Temple e Hermann Fuchs, que levava Juan – ou Johann – consigo. Louro e de olhos claros, era um jovem atlético e sorridente, apesar de já manifestar alguma da calvície que Hermann já tinha, mas ainda não era aquilo que El Chueco já tinha na sua cabeça. Apenas uma testa mais proeminente. Señor Fangio ainda trazia a sua mulher e outra lenda do automobilismo consigo: Froilan Gonzalez.

A ideia de todos por ali era aparentemente de convívio entre campeões. Os cinco títulos de Fangio, os dois de Pete, era algo que valia a pena ser celebrado, e El Chueco provavelmente quereria saber como é que a nova geração se dava com os novos carros, para eventualmente trocarem experiências.

De braços abertos, El Chueco recebeu-os:

- Como vão, meus amigos? Sejam bem-vindos a Buenos Aires!
- Senõr Fangio, é uma honra jantar consigo, respondeu Pete, apertando as mãos e depois abraçando-se, em sinal de amizade. Depois de cumprimentar a sua mulher, disse:
- Por fim, conheço a lenda americana. Ganhou alguma vez as 500 Milhas de Indianápolis?
- Não, nunca consegui. Mas não foi por falta de tentativa.
- Tenho pena. Vocês tem uma prova e tanto por lá.
- É verdade, é a prova mais rica do mundo. Quem ganha ali tem a vida feita. Em compensação, tenho o Mónaco e Monza no meu palmarés.
- Sim, é verdade. E estes são os seus pilotos? Este rapaz não é estranho…
- É capaz. Alexandre de Monforte, Don Fangio, e a sua noiva.
- Uau… a senhorita é sublime. Um prazer conhecê-la, disse, beijando a mão dela. Venha comigo, faço questão de a levar ao lugar.

Alexandre e Philipp olharam um para o outro e encolheram os ombros, sem falar nada, mas ambos com largos sorrisos e gestos cúmplices. Aparentemente, até o grande campeão tinha sido superado pela beleza feminina de Teresa e limitaram-se a sorrir e a dirigir-se à mesa. Quando ele a sentou, virou-se para os “muchachos” e disse:

- Perdoem-me. Como sabem disso perfeitamente bem, rapazes, também gosto da beleza feminina. Quem é o feliz contemplado?
- Sou eu, senhor Fângio, respondeu Alexandre.

Dirigiu-se a ambos e cumprimentou-os, e dirigiram-se todos para a mesa. Assim que se sentaram, Fangio ficou entre Pete e Alexandre, enquanto que este ficou entre ele e Teresa. Ela ficou entre o seu namorado e Philipp, que tinha uma cadeira ainda por preencher. Depois de se sentarem, Alexandre dirigiu-se a e ele e disse:

- Don Juan, não me reconhece, pois não?

Fangio sorriu e disse:

- Temo-me enganar, mas… não és o neto do Conde?
- Sou sim senhor, respondeu.
- Meu Deus… como cresceste. E sempre conseguiste ser aquilo que querias. Ainda te lembro agarrado aos “pantalones” do teu avô, que Deus o Tenha. Ele fez um grande circuito, que tive o prazer de o guiar. E foi dos mais difíceis que já guiei, tão bom como Nurburgring. Fizeram um bom trabalho.
- E verdade.
- E vai ser esse que irá receber a Formula 1?
- Se tudo correr bem, sim.
- Vai ser algo que o teu avô iria se orgulhar. Ele sempre quis a Formula 1 no seu pais.
- E estou a fazer por isso.
- Acho que merecem. Ah! Froilan, “mi amigo”, venha, venha conhecer a gente.

Froilan Gonzalez poderia ser dez anos mais novo do que Juan Manuel Fangio, e pode não ter ganho qualquer título, mas a sua carreira foi suficientemente marcante para poder ter o seu lugar na lenda. Fora o primeiro piloto a vencer oficialmente ao serviço da Ferrari, e fora também o piloto que venceu por duas vezes o GP da Grã-Bretanha, ganhando o apelido de “O Touro das Pampas”. Todos se levantaram para o cumprimentar, da mesma forma que cumprimentaram Fangio. E pouco depois os Fuchs e Harry Temple chegavam, acompanhados por Bob Bedford, o outro piloto da equipa nesta temporada.

Durante o jantar, todos conversavam sobre automobilismo, a Argentina e outras coisas mais triviais. foi uma conversa animada entre duas gerações de pilotos, a do passado e a do presente, onde cada um falava das suas técnicas, das corridas mais marcantes nos seus passados e como os carros tinham modificado até então. Monforte tinha até desafiado os senhores mais velhos a tentarem a sua sorte nos seus carros, mas eles polidamente declinaram o convite, afirmando que perfeririam guiar os carros do seu tempo.

- Um destes dias guio o seu Mercedes. Sempre tive curiosidade em guiar um desses. O meu avô fartava de falar bem dele, e claro, sempre tive esse sonho.
- Mas não é por falta de oportunidade. Vou fazer uma demonstração no domingo antes da corrida. Sempre podem guiar um nessa altura...
- Adorariamos, mas acho que temos compronissos por essa altura... retorquiu de Villiers.
- Acima de tudo, o trabalho, brindou Alexandre.
- Tenho pena.
- De guiar o seu Mercedes? Outras oportunidades acontecerão, descanse.
- Não estou a falar do carro. Ao vê-lo brindar, lembrei-me do seu fabuloso vinho de Monforte. Dos melhores que já bebi na vida, respondeu Fangio.
- Ahhh... isso, sorriu. Se quiser vir à Sildávia em Setembro, teria um enorme gosto em recebê-lo. Vindimas e o Grande Prémio, seria fabuloso. E ficava na nossa casa. E claro, Don Froilan... também seria bem vindo.
- Agradeço o vosso convite. Assim sendo, como não tempos o Moscatel para brindar, ficamo-nos pelo nosso vinho, afirmou.

E erguendo os copos, os quatro pilotos, de duas gerações diferentes, brindaram ao convite feito.

- À vossa. Desejo-vos toda a sorte na corrida.
- Obrigado, "Señor Chueco". E "el Toro" também, retorquiu Alexandre.

(continua amanhã)

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