Na quinta-feira passada, foi feriado e andei o dia todo fora de casa a ajudar nas mudanças de um amigo meu. Cheguei muito tarde e estava demasiado cansado para poder fazer a 5ª coluna da semana que passou. E como a minha prioridade nessa semana tinha sido os posts a comemorar os cem anos do nascimento de Juan Manuel Fangio, acabei por deixar passar a oportunidade de escrever a minha coluna de opinião. Por esse fato, peço-vos desculpa.
Contudo, esta semana existe um assunto que é interessante o suficiente para ser falado. É sobre o fato de este domingo termos assistido pela terceira vez na historia da Formula 1 uma corrida onde todos os pilotos que largaram chegaram ao fim. E não são poucos: foram 24 pilotos a partir e 24 a chegar, o que é incrivel. E o indiano Narian Karthikeyan, no seu Hispania tornou-se no primeiro piloto da história da Formula 1 a chegar ao fim nessa 24ª posição. Poderemos dizer que é o sinal do bom trabalho dos engenheiros: a fiabilidade dos carros de Formula 1 chegou ao ponto de que são praticamente inquebráveis. Mas tem um lado mau: de que retirou imprevisibilidade à categoria máxima do automobilismo.
Falei disso logo no domingo, na minha crónica da corrida. Mas esse fato teve eco nos dias seguintes, quando o veterano Jarno Trulli, piloto da Lotus e 20º classificado na corrida valenciana, escreveu sobre isso na sua coluna no jornal italiano "La Reppublica": "Se isso é positivo ou negativo, depende da ambição do piloto, mas eu não gosto disso. A corrida em Valência, na minha opinião, indicou outro vencedor além do usual Sebastian Vettel e esse vencedor é a tecnologia." escreveu.
"Isso diz duas coisas: Primeiro, as chances de uma equipa pequena conquistar pontos fica tremendamente reduzida. Segundo, a Formula 1 perde o seu apelo, não é coincidência que a corrida de [Domingo] foi a mais chata do ano", concluiu. Que claro contraste com Canadá, não é? Outra noticia relacionada com o caso e do qual a Autosport portuguesa faz hoje eco: o jornal alemão "Die Welt" noticiou que nas oito primeiras corridas de 2011, registaram-se apenas 18 falhas mecânicas, menos vinte do que em igual periodo do ano passado.
Por um lado, Jarno Trulli pode estar a "puxar a brasa para a sua sardinha", mas por outro lado... quando comecei a ver Formula 1, no inicio da década de 80, vivia-se a era Turbo: motores pequenos, de 1.5 litros, mas sobrealimentados, chegando até a ter potencias de 1500 cavalos em qualificação. Eram ultra-potentes, mas tinham dois grandes defeitos: eram pouco fiáveis e bebiam imenso. Só por si eram dois fatores de imprevisibilidade, e se quiserem ler as estatisticas, vejam a carreira de Jean-Pierre Jabouille, o primeiro piloto que guiou um Formula 1 Turbo: só pontuou três vezes na sua carreira, duas delas foram vitórias. Aliás, tem mais corridas onde conseguiu a "pole-position" - cinco - do que a chegar ao fim nos pontos. Ali, as corridas dependiam não só do talento do piloto, mas sim da colaboração da máquina, ou de um momento de distração, muitas vezes fatal.
Nelson Piquet disse certo dia numa entrevista que "as pessoas vêm as corridas porque querem ver o circo pegar fogo". Lá isso é verdade: mais do que querer ver o nosso piloto ganhar, queremos ver o nosso adversário desistir. E se for por quebra mecânica, melhor. Conheço a história do GP do Brasil de 1978, onde em Jacarépaguá, sempre que passava o Ferrari de Carlos Reutemann, as multidões uluantes gritavam: "quebra, quebra!" só porque queriam ver Emerson Fittipaldi vencer no seu carro. E acho que muitos gostariam de ver as novatas a pontuar, algo que nunca se viu até agora, e pelos vistos, só poderão alcançar pela forma mais dificil: desenvolver o carro, porque o "fator acaso" ou se perferirem, o "fator sorte", foi-lhes retirado.
Neste mais de um século de competições automobilisticas, o acidente e a quebra mecânica sempre fez parte do jogo. As vitórias não eram só resultado do bom dia do piloto ou de uma máquina superior às outras, também tinha a ver com uma falha mecânica, eletrónica ou humana. Quando esse fator desaparece, a sensação que se fica é como termos eliminado a Morte, pois modifica-se um dos paradigmas, uma das razões pelo qual vemos corridas. E com estes regulamentos atuais, em que os motores e caixas de velocidades se tornaram inquebráveis por ordem da FIA, o seu desenvolvimento foi congelado por um periodo de tempo, tudo isto em nome da redução de custos, acabaram sem querer por matar um pouco mais a galinha dos ovos de ouro que se tornou a Formula 1.
Sem querer, ou talvez não, existe agora menos um motivo para acordar nas manhãs de domingo.
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