quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

I still remember...

Hoje dei por mim a fazer este exercício de reflexão. O Heath Ledger puxou-me para isto, mas quando estava a ver a sério o site do Robert Murphy e as suas reflexões sobre o automobilismo, decidi fazer algo semelhante.

Primeiro que tudo: para aqueles que começaram a ver Formula 1 a partir de 1995, vocês estão safos: não tem que fazer este tipo de lista. Mas como eu tenho 31 anos de idade e 26 de Formula 1, já tenho a minha lista de nomes para lembrar. Ao todo são nove, mas acrescento mais dois, que não tem a ver com a Formula 1, mas que estão também imprimidos na minha memória.

Começo com Gilles Villeneuve. A minha imagem mais distante da Formula 1 é ver o grande Gilles a ir pelo ar, depois de tocar no March de Jochen Mass, em Zolder. E de abrir Telejornais com as imagens do acidente, e da minha familia a falar sobre outros pilotos do passado, especialmente a minha mãe a falar sobre um "Pato"... na inocência dos meus cinco anos, e não ligando a caras, pensava que o Villeneuve era o Piquet! E o "Pato" era o José Carlos Pace.



Semanas depois, estava a ver Ricardo Palleti preso no seu carro, fatalmente ferido, e de repente, o carro pegou fogo. Mais uma vez, a minha familia a reviver tudo de novo. Mas eu não ligava nenhuma. Afinal, tinha 5 anos...



Quando tudo voltou a acontecer, passaram-se três anos. Estamos em 1985, e já era um apaixonado pela Formula 1, mas nem sabia que os pilotos podiam correr por outras provas. E quando soube que num espaço de três semanas, dois talentosos pilotos alemães, Manfred Winkelhock e Stefan Bellof, tinham morrido em provas de Sport-Protótipos, fiquei confuso, mas sabia quem era Stefan Bellof: muito talentoso e muito rápido. Achava que ele seria um bom rival de Ayrton Senna. E fiquei chocado com a noticia da sua morte, quando tentava uma ultrapassagem impossivel ao Jacky Ickx na zona do Eau Rouge.



Poucos meses mais tarde, em 1986, senti melhor esse impacto: as mortes do Dakar (Thierry Sabine), a tragédia da Pena, no Rali de Portugal, e depois... Hari Toivonnen e Elio de Angelis. Em pouco mais de 15 dias, via dois talentosos pilotos a morrerem em circunstâncias difrentes. Então o De Angelis... tinha visto o acidente, mas sabia do seu desfecho. Dias depois, quando entrevistaram o Senna, que estava de passagem por Portugal, e comentou a morte de De Angelis, soube do que tinha acontecido.


Quanto ao Toivonnen: eu já começava a gostar de Ralies, mais pelo espectáculo do que a torcer por A ou B. Dele, lembro-me de duas coisas: de como ficou reduzido o seu carro, depois do despiste na volta à Corsega, e lembro do histerismo da imprensa depois, a saber o porque é que tudo isto estava a acontecer. Era a minha primeira experiência de como os meios de comunicação social disseminam o problema, mas não apresentam a solução...



Mas para mim, ficou-me como o meu primeiro "maldito Maio".



Os anos passam, e as coisas melhoram. Vês acidentes espectaculares, em que o piloto saia do carro a sacudir o pó e nada mais. continuavam a desafiar a morte, é certo, mas safavam-se sempre. Mesmo quando o Martin Donnely teve aquele acidente grave em Jerez, em que acabou a sua carreira competitiva, achei que as mortes na pista tinham ido de vez.



Julgava isso tudo, até ao dia 30 de Abril de 1994. Estava a ver os treinos na Eurosport, na casa de um vizinho meu. Não vi o momento do acidente do Roland Ratzenberger, mas vi as repetições, e pensei que era grave, mas que iria sobreviver. Como estava a demorar, tive que sair de casa para resolver umas coisas, e quando voltei, estavam a anunciar a morte dele. Sofri um baque. Não pensei que voltaria a ver isso de novo. E fiquei com a memória de um piloto esforçado, que guiava um carro patrocinado pela MTV, e que teve um incrível azar. Fiquei deprimido.


No dia a seguir, fui visitar os meus avós, e sabia que pela viagem, iria perder o inicio da corrida. Quando lá cheguei, a minha avó disse-me que tinha havido um acidente. Quando vi os destroços, pensei: "é o Damon Hill". Tu pensas sempre que o teu ídolo nunca morre, não é? Mas morreu. E lembro-me de tudo o que fiz nesse dia. Tudo...




A morte do Senna trouxe-me um paradoxo: passei a ver a Formula 1 de uma maneira desapaixonada. Não torcia por ninguém, excepto por algumas vezes, com Villeneuve Jr., Montoya, e agora Hamilton. Mas essas paixões passavam, pois o primeiro era o unico. E vi o meu segundo "maldito Maio": Wendlinger, Lamy, Montermini, o histerismo da imprensa, a FIA a fazer medidas à pressa...




A minha última história ocorreu na Noite das Bruxas de 1999. Estava a ver no Eurosport a última prova do campeonato CART, em directo, no ultra-veloz oval de Fontana. Enquanto Dario Franchitti e Juan Pablo Montoya disputavam o título, via Greg Moore perder o controlo do seu carro e bater forte no muro. Quando o carro parou, sabia que ele estava morto. Sentia-o. Nem era preciso saber se mexia ou não. Eu já sabia, muito antes do médico confirmar.



E o resto daquela noite foi surreal: fui sair, ter com a minha namorada de então, e contei o que se tinha passado. E ela lá tentou animar-me no resto da noite, mas não: sentia uma "profunda, apagada e vil tristeza" (Camões)



Vocês, os mais novos, que nunca viram mortes em directo, desejo que continuem assim. Mas quando me recordo do impacto dos acidentes do Alex Zanardi, em 2001, no Lauritzring, e do Robert Kubica, o ano passado, em Montreal, pergunto-me: como é que o público em geral reagiria de novo a uma morte na Formula 1? Lembro-me como foi em 1986 e 1994...



E ainda me lembro de uma coisa: estava eu a estagiar na RTP, em 2006, quando chega a noticia da morte de Henri Magne, ex-navegador do Carlos Sousa, no Rali de Marrocos. Mesmo jornalistas tarimbados ficaram espantado com tão trágico destino. E falamos de um navegador...



Em suma: sou novo, mas já tenho as minhas cicatrizes, e algumas delas foram profundas. Hoje em dia, a unica coisa que posso fazer é homenageá-los e contar a história das suas vidas curtas e intensas. E torcer para que mortes destas em pista nunca mais voltem a acontecer.



Já agora, para acabar: tentem ler isto com uma banda sonora como fundo. Eu escrevi isto a ouvir esta canção. Mas também poderia ter escrito a ouvir esta canção ou esta. A escolha é vossa, claro. Mas fiz isto como exercício de recordação, espero que façam o vosso.

13 comentários:

hjg disse...

wow, excelente post. Eu so teve oportunidade de ver dois mortes, una delas ao vivo e que me deixou acabado, deprimido. A primeira Roland, a segunda Ayrton.

Eu entendo este mundo de automobilismo desde 1991, mais assisto desde 1989 (casim 5 anos de idade). Mais para mim pensar no que e a morte, os riscos e tudo mais e mto dificil, eu sofri muito a morte de Senna, e tamben senti o complicado que e sair de pista a mais de 150 Km/h. Um accidente e o preço que algum ter que pagar, ate que chegue o momento certo do que a seguridade seja mais forte que esse preço.

Cuando alguem me fala de seguridade eu respondo: Luciano Burti, Robert Kubica. Cuando me falam de azar respondo Wendlinger e Zanardi, que tomaram café com a morte e voltaram. E nao somente eles ha muitos esquecidos que estao vivos o que foram vitimas fatales da inseguridade, ou da barbaragem humana.

Obrigado pelo post :D

Octeto Racing Team disse...

Nossa!!! Realmente... excelente o seu post.
Admito que fiquei emocionada ao ler! Estas coisas me afetam muito!!

Eu era muito pequena quando Senna morreu ... mas lembro daquele dia como se fosse hoje! Também não vi o início da corrida, liguei a TV logo após o acidente, quando ele já estava sendo atendido!
Eu não sabia o que estava acontecendo...foi uma angústia sem fim! Até que nos chegou o anúnico do fim. Lembro de ter chorado muito! Na verdade, ainda choro... basta vê-lo!É impressionante.

Aqui no Brasil, nunca tinha sido visto tanta tristeza!!
Até hoje sentimos, choramos e lamentamos a morte dele. Ele era o nosso " orgulho de ser brasileiro ".

Quaisquer acidentes me faz recordar aquele dia. E também nos mostra o quanto este esporte é perigoso!

Desejo o mesmo que vocÊ : Espero que estas coisas não aconteçam mais ...

Tatiana

Anónimo disse...

Apesar de ter 28 anos, fui muito cedo confrontado com a morte o k me trouxe muito cedo pra realidade da vida, lembro-me da morte Thierry Sabine, do Hari Toivonnen não me lembro pois não acompanhava os rallies na altura apenas a F1.

Lembro-me perfeitamente do acidente do Martin Donnely, pensei k ele tivesse morrido por muita sorte safou-se.

E então chegou akele fatidico fim de semana em 1994 primeiro com a morte do Roland k como muitos a seguir estava a viver o seu sonho correr na F1. No sábado o Rubens Barrichelo tem um acidente e safa-se só com um nariz partido, e no inicio da corrida akele acidente ceifou a vida a um espectador e por pouco não levou o nosso Pedro Lamy e o JJ Letho, esse só vi no telejornal á noite.

No Domingo atrasei-me a almoçar na casa dos meus tios e kuando cheguei a casa liguei a TV e o acidente tava a acontecer, pensei logo bem akeli Hill é cá um carroceiro então perde o controlo do carro ali, depois vi k era o cena e k afinal parecia mais grave do k tinha pensado, lembrei-me logo do acidente do berger em 1989 e pensei k o carro fosse pegar fogo, desesperei a ver k os comissário demoravam seculos a chegar ao carro, lembro-me de ver o Larrouse do Erick comas a tentar para para ajudar (para kem não se lembra ou não sabe em 1992 o Comas teve um acidente algo grave em Spa o Senna seguia atrás e mal aconteceu o acidente parou e saltou do carro para ajudar o Comas, enquanto toda a gente passava por lá o Senna tentava ajudar o Erick) os comissários não o permitiram, e os medico não chegavam, parecia-me impossivel com as boxes ali tão perto e nada de médicos.

Para min foi um dos meus piores dias nesse dia perdi um idolo uma referência humana e kuase perdi o amor á F1, e ganhei um odio por um determinado senhor alemão.

TB me lembro dakele fatidico dia Em k o Greeg Moore morreu, primeiro pensei ganda acidente o gajo teve uma sorte, mas afinal não teve essa sorte k protege alguns.

Anos mais tarde vi o terrivel acidente do Alex Zanardi.

Fora destas morte em pista, não me posso eskecer da minha outra paixão o TT, ai perdemos alguns exemplos de heroismo puro e alguns ninguem se lembra deles, recordas-te e bem o Henri Magne, mas anos antes o Grande e digo mesmo grande pq parecia uma torre John Deacon, perde a vida no Masters Rally ao cair num precepicio, Depois foi o Richard Sainct k apesar denão gostar do gajo por ser francês admirava-o, e finalmente entre muitos outros k tb me lembro mas não me marcaram tanto, perdi o meu ultimo heroi Fabrizio Meoni, o resistente, nunca dizia não a nada, amigavel, jogador de ekipa e lutador nato nunca baixava os braços e mesmo na morte a culpa não foi um erro k cometeu mas sim a sua "máquina" interna k o tramou.

Fora da F1 a morte k mais me marcou foi sem duvida o Miklos Feher, morte em directo é terrivel.

Apesar de tudo o k se tenha dito acerca dele recordo Il Pirata Marco Pantani.

Sei k este comentário já mais parece um post num blog, mas por vezes é aki nos blogs k falamos o k nos vai na alma.

Os herois nunca morrem, as lendas perduram para sempre.

Anónimo disse...

Link para o Video do Senna a ajudar o Comas, homens assim já não existem.

http://www.youtube.com/watch?v=LuB1f0JMjEM

Anónimo disse...

Parecem k ando a fazer publicidade ao youtube mas aki está outro video apesar de estar em japones dá pra ver todo o acuidente do Eric Comas e o Senna ajuda-lo ( a salvar-lhe a vida, palavras do Eric Comas)

http://www.youtube.com/watch?v=ycCB5Cn6fLY

Anónimo disse...

Speeder,

O automobilismo, em especial a F1, tem essa característica mesmo. Ainda assim, amamos esse esporte.

Pensei que a F1 não voltaria a ser a mesma desde a morte de Senna. Mas havia Michael Schumacher para substituí-lo.

E hoje, com sua aposentadoria, queira ou não, o melhor piloto em atividade é Fernando Alonso.

Um abraço.

Anónimo disse...

Belíssimo texto.
Assisti à morte covarde de Roger Williamson, em 1973, ao vivo, quando tinha doze anos, e foi uma espécie de trauma.
Acho que a história dos mortos é uma outra história que precisa ser contada: com seria a F1 com Peterson, Villeneuve, Cevert, Tony Brise, Revson e tantos outros que morreram cedo. Que tal os anos 90 com DeAngelis e Belof?
Parabéns, Speed!

Anónimo disse...

Cara legal, gostei da 1ª foto deste comentário. Qual é o GP?? Da Inglaterra em 1973?? Na foto vejo o March do Mike Bleutler passando incólume e de frente a Surtees do Andrea de Adamich destruída e tendo o patrocínio da Cerâmica Pagnossim italiana. É...tem tempo, será que é o GP da Inglaterra mesmo?? Um abraço para ti e continue a desenvolver este ótimo blog que estou sempre a ver.

Speeder76 disse...

É, Fernando. GP de Inglaterra 1973, com as pernas partidas do de Adamich no seu Brabham.

E já agora: obrigado pelos vossos comentários. Sabia que todos vocês, os que amam o automobilismo, têm também as vossas recordações. Eu pura e simplesmente, limitei-me a escrever sobre elas...

Anónimo disse...

Bem Speeder, tenho 34 anos e acompanho este esporte desde 1983, vi muitos acidentes, e infelizmente vi os de Rolland e Ayrton.
É sabido que quem assiste corridas esporádicamente o faz para ver os acidentes, sendo fatais ou não.
Apenas quem gosta realmente do esporte automotor sente os baques.
No domingo em que Senna morreu não fiz mais nada após a corrida. Fiquei sentado na sala olhando a tela da tv e esperando que fosse anunciado o milagre, que ele ficaria bom. Veio a noticia fatal e eu continuei lá, prostrado.
Continuo amando a f1 da mesma forma, nunca fui torcedor deste ou daquele piloto. Gosto de Piquet além da conta. Mas amo as corridas acima de tudo...
Quanto ao teu texto. Sim, muito bom, muito bom.. Porém é chover no molhado, teus textos são jornalisticamente muito bons, sempre!

I wanna be Nuno Rogeiro disse...

Eu acho que a morte choca sempre a nós, os vivos, porque não queremos abandonar esta condição. E então se for de pessoas que reverenciamos, mais ainda. Co isto não me refiro só a nomes como o Senna ou Toivonen. Todos aqueles que andam nas pistas de asfalto e terra à procura de superar os seus limites e os da máquina merecem toda e maior admiração de nós, os fãs desta bela modalidade. É claro que todos os óbitos que li no Autosport ou outro orgão de comunicação e/ou tive a infelicidade de assistir pela televisão deixaram mossa.
Veja-se o caso de Ratzenberger e Senna. A morte do austríaco soube-a pela hora do jantar. A minha idade não me permitia ter recordação das mortes de Paletti e Villeneuve, mas o facto de saber das mortes destes e de outros mártires do automobilismo fez com que o choque fosse mais brutal.
No dia seguinte, já não deu para ser assim. Quando o Senna se despsita, a minha primera reacção foi de contentamento, pois nunca fui fã do brasileiro, mas passado alguns momentos a "clubite2 passou, pois dava para ver que o caso era deveras sério. Sei que vi o GP até ao final, depois fui ao cinema com a minha familia, e na volta, ao fim da tarde, o auto-rádio dizia que Senna era dado como morto no hospital de Bolonha. Fiquei abismado. Não chocado, abismado.

Curiosamente a ultima vez que senti o mesmo feeling igual ao de recever a notícia da morte de um piloto ou navegador, foi qundo cancelaram o Dakar. É que senti que tinham acabado de matar a prova. E os ultimos zunzuns dão-me razão...

Anónimo disse...

Ótimo post Speeder. E minha experiencia em Imola 1994 relatarei autrora no meu blog.

Creio que a coisa mais horrivel foi ver o desespero do David Purley, que faria aniversário hoje, tentando salvar o coitado do Roger Williamson. Eu tinha 13 anos e aquilo me marcou profundamente.

Mas quando você senta em um carro de corrida, estas imagens e impressões estão, e tem que estar, completamente ausentes. Além disto, TODO piloto acredita fielmente que com ele não pode acontecer algo assim.

João Carlos Viana disse...

Pelo menos a F1 tomou consciência de melhorar a segurança e não vimos mortes há quase 14 anos, mesmo com as pancadas do Trulli, Kubica e Burti(2x).
Pena que outras categorias não pensem assim...