Quase cinco meses depois da decisão de Interlagos, a temporada de 2009 de Formula 1 vai começar nas ruas de Melbourne, no estado australiano de Victória. Neste final de Verão austral nessas paragens, máquinas e pilotos começarão a nova temporada em carros completamente diferentes daqueles que correram em 2008. As asas frontais serão maiores, foram retirados os apêndices aerodinâmicos, a asa traseira encurtou, permitindo assim facilitar as ultrapassagens, temos o regresso dos pneus “slick” e um novo sistema de recuperação de energia, o KERS.KERS é simplesmente a sigla de “Kinectic Energy Recovery System”, um sistema de recuperação de energia que irá utilizar a desaceleração para movimentar um volante inercial que recarregará baterias, e essa energia armazenada será usada mais tarde, em outras situações, como aumentar a energia do motor. Contudo, as equipas não aceitaram muito bem esta imposição da FIA, pois é um sistema pesado (alguns pilotos tiveram de perder peso para “caber” lá o KERS), ainda é pouco fiável, pelo que foi visto nos testes, e inseguro, pois os funcionários têm que usar luvas para segurar os carros, caso contrário, sofrerão um poderoso choque eléctrico. E algumas equipas, como o Toro Rosso e a Brawn, decidiram não usar o KERS na Austrália, para começar.
Mas para além das mudanças regulamentares e técnicas, o defeso foi marcado por polémicas de bastidores, e a chegada da crise mundial, que fez retirar abruptamente, e pela porta pequena, a Honda da competição, causando uma enorme novela sobre quem ficaria com o espólio, e qual seria o destino dos pilotos Jenson Button e Rubens Barrichello. No final, após dois meses de todo o tipo de especulações, apareceu um “management buyout”, liderado por Ross Brawn, para tomar conta da equipa, dos trabalhadores, do chassis, e de Rubens Barrichello e Jenson Button. A escolha do veterano piloto brasileiro causou ondas, por achar que Bruno Senna, sobrinho de Ayrton, faria melhor trabalho, mas Brawn tem muito mais confiança em Rubens, pelo empenho, dedicação e experiência que ele já demonstrou.
E guardado estava o melhor bocado: com motores Mercedes, o novo chassis BGP 001, surpreendeu tudo e todos nos testes em Barcelona e Jerez, no inicio de Março, levando muitos a pensar se não se trataria de “bluff”. Quando se verificou que o carro era muito competitivo, mesmo em “stints” longos, as pessoas começaram a entender a razão: o Brawn foi o primeiro carro a ser projectado com as novas regras, em Maio, logo, teve muito mais tempo para aperfeiçoar do que a concorrência. E mesmo com o novo motor, que em princípio poderia ser uma razão para o carro não se dar bem, afinal, nem se manifestou. Muitos já colocam Button e Barrichello como possíveis vencedores de Melbourne, e se o brasileiro ganhar, muitos provavelmente colocarão como título “O Regresso do morto-vivo”… nem o Zé do Caixão se lembraria de algo melhor!
Mas este “melhor bocado” não será aceite de bom grado pelas restantes equipas. Sete delas protestam o difusor da Brawn, afirmando que está ilegal, e a Red Bull decidiu apresentar uma queixa formal em Melbourne. Hoje é o dia das verificações técnicas, e os técnicos da FIA já disseram que o carro está dentro das normas. Mas isto não quer dizer que a polémica fique por aqui, pois eles não desistirão. Muito mau perder de certas equipas, de facto… Mas se tirássemos a Brawn desta equação, pode dizer-se que a indecisão pairaria no ar. Tirando os problemas da McLaren relacionados com o desgaste dos pneus traseiros, e o redesenhar do fundo plano, poderia dizer-se que Ferrari, Toyota, Red Bull, Renault e Williams eram fortes candidatos à vitória, e mesmo a Force Índia e a Toro Rosso, que agora são fortes candidatos à parte de trás do pelotão, podem nem estar tão longe de um lugar pontuável. Em suma, com as novas regras, seria baralhar e voltar a dar, se não fosse a Brawn…E candidatos ao título mundial? Esqueçam. O leque é mais vasto, este ano. Para além de Lewis Hamilton, Felipe Massa, Kimi Raikonnen, Fernando Alonso, podem incluir aí pessoal como Jarno Trulli ou Nico Rosberg, pelo menos para a luta pelas vitórias. Agora, com a Brawn GP, até se pode dizer que Rubens Barrichello - com quase 37 anos de idade e 17 temporadas ao mais alto nível - é um bom candidato ao título, algo que teríamos de recuar até a Michael Schumacher, em 2006, ano da sua última temporada competitiva, para ver algo semelhante.
Para finalizar, referências acerca da polémica da semana anterior e as suas consequências. Quando a FOTA mostrou a Max Mosley o próprio regulamento da FIA, que impede qualquer alteração no sistema de pontos sem a autorização unânime dos construtores, Mosley e Bernie Ecclestone reconheceram que caso persistissem no erro, estariam a dar um enorme tiro no pé. Sendo assim recuaram logo, para depois “salvar a face”, dizendo à imprensa que iriam adiar as regras para 2010. O dia seguinte a essa decisão, no passado Sábado, foi no mínimo, cómico. Ver Mosley a fazer-se de “virgem ingénua” na entrevista que deu ao Daily Telegraph, e Ecclestone a “jurar vingança” demonstra mais uma vez que estes dois senhores só se regem por si mesmos, afirmando-se como os “reis da cocada preta”. Toda a gente sabe que isto é uma guerra, e o que aconteceu foi apenas a primeira ronda de um longo combate. Eles foram humilhados, e os animais feridos são os mais perigosos.E para provar isso foram as decisões tomadas por Ecclestone esta semana, como acção de retaliação. Primeiro, quando revelou ao jornal “The Times” que Ron Dennis e Flávio Briatore tentaram “apertar os calos” a ele, ameaçando boicotar a presença em Melbourne, caso não aumentasse a percentagem das transmissões televisivas às equipas. O “Tio Bernie” não se fez rogado, e ameaçou cancelar ali mesmo o transporte dos carros para a Austrália, ao que eles recuaram. E ameaçou: "Até parece que não me conhecem! Se entram aqui de 'arma' em punho e a apontam à minha cabeça, é bom que disparem, e que tenham a certeza que há balas, porque se assim não for é bom que se pirem bem depressa..."
A segunda acção soube-se ontem, quando decidiu retaliar na Brawn GP. Segundo a revista suíça “Motorsport Aktuell”, a Brawn ficou sem o dinheiro das transmissões televisivas por culpa de Ecclestone. Mesmo com a aprovação das equipas para manter o lugar deixado vago pela Honda, Ecclestone decidiu vetar tal decisão, e deu à Brawn os últimos números do pelotão, 20 e 21, como se fosse uma equipa nova, em vez dos esperados 18 e 19, privando assim a equipa de 22 milhões de dólares ao qual teriam direito pela percentagem das transmissões de TV. Dinheiro esse que seria muito importante para aguentar o barco da Brawn nos meses que aí vêm. A razão desta retaliação? O facto de no passado mês de Fevereiro, Ross Brawn ter recusado o dinheiro de Ecclestone para completar o “management buyout” que necessitava. Eis o preço a pagar para não assinar pactos com o Diabo!Mas enfim, vamos ao que interessa: as corridas. Que comece logo o campeonato, e vença o melhor!
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