Jackie Stewart e a Tyrrell partiam para a época de 1971 confiantes que o carro que tinham entre mãos tinha potencial para ser vitorioso. O escocês tinha um novo companheiro de equipa, um jovem e talentoso piloto francês chamado Francois Cevért, que conheceu no ano anterior numa prova de Formula 2 em França, e tinha dado nas vistas. Como Johnny Servoz-Gavin tinha ido embora, devido a uma lesão no olho, e para satisfazer as pretensões da petrolifera Elf, que queria um piloto francês, tudo estava perfeito.
Para além disso, Stewart decidira fazer dois gestos que iriam marcar o inicio do profissionalismo na Formula 1. Primeiro, fez um seguro de vida milionário, inédito até então. Uma manobra arriscada, pois no ano anterior a Formula 1 tinha perdido três excelentes pilotos: Bruce McLaren, Piers Courage e Jochen Rindt, todos amigos de Jackie. Rindt até tinha uma casa ao lado da dele no Lago Leman, na Suiça, comprada com o prémio da sua vitória no GP dos Estados Unidos de 1969. O segundo gesto foi o de se juntar ao "manager" americano Mark McCormack, para vender a sua imagem em anuncios publicitários para marcas como a Rolex. Essa parceira deu resultado e fez com que a sua imagem fosse conhecida nos Estados Unidos e o tornaria milionário.
No Inverno de 1970/71, a Tyrrell tinha concluido o modelo 003, e Stewart tinha investido grandemente em testes, para ter o carro no ponto na primeira corrida do ano, na Africa do Sul. Agora equipado com pneus Goodyear (num dos testes, a marca levou... 500 jogos de pneus para Stewart), tudo parecia que iria ganhar a primeira prova do ano. Mas a corrida não correu bem, e terminou na segunda posição, atrás do Ferrari de Mario Andretti. Mas a seguir, quando a Formula 1 chegou à Europa, o dominio de Stewat foi arrasador: venceu nas ruas de Montjuich e do Mónaco, nas pistas do novo circuito de Paul Ricard, Silverstone e Nurburgring. Com essas cinco vitórias em sete corridas, Stewart tinha conseguido o bi-campeonato, quase com o dobro de pontos sobre o segundo classificado, o sueco Ronnie Peterson. O escocês também tinha dado à marca o seu título de construtores, numa temporada em todos os aspectos perfeita. No final da época, Stewart seria bi-campeão do Mundo com 63 pontos.
Em 1972, Stewart esperava continuar com a senda vitoriosa, mas agora tinha como principal rival a Lotus, na forma de um jovem talentoso, vindo de um país até então com pouca tradição automobilistica: o Brasil. Emerson Fittipaldi era um digno e rápido sucessor de Jim Clark e Jochen Rindt na equipa de Colin Chapman, e este tinha projectado um carro que iria marcar toda uma época: o Lotus 72. A temporada começa com o vitorioso 003, mas já se desenhava o seu sucessor, o 005. Vence na Argentina, mas desiste nas duas provas seguintes, e não vai mais longe do que o quarto posto no chuvoso GP do Mónaco. Para piorar as coisas, Fittipaldi aproveita estes precalços para vencer e passar para a liderança.
Isso tudo irá ter consequências a nivel de saúde. Sofrendo com uma úlcera gástrica, a situação agrava-se tanto que é forçado a faltar ao GP da Belgica, que Fittipaldi aproveita... vencendo. Quando consegue curar-se, Stewart vence em Clermont-Ferrand, no circuito de Charade, mas em Brands Hatch, é batido pelo brasileiro da Lotus. entretanto, a equipa tinha-se concentrado no desdenvolvimento do chassis 005/006, preparando a temporada seguinte, logo, a época foi para o piloto brasileiro. O carro estreia-se em Zeltweg, palco do GP do Austria, e Stewart vence as duas últimas provas do ano, em Mosport e Watkins Glen.
Stewart começa a época de 1973 com a caminho dos 34 anos e na sua décima temporada consecutiva. Conseguiu muito mais daquilo que esperava e acha que já é altura de se retirar, depois de ter sido batido por Fittipaldi na época anterior. Mas não o queria fazer sem abandonar o seu amigo Ken Tyrrell e decide preparar o seu companheiro Francois Cevért para lhe suceder na equipa. Nessa altura, ambos eram grandes amigos dentro e fora das pistas, e o respeito que o piloto francês tinha para com o piloto escocês era grande, que muitos comparavam com a de um mestre e o seu pupilo.
Stewart começa a temporada atrás de Fittipaldi, pois este vencia as duas primeiras corridas do ano, na Argentina e no Brasil. Vence em Kyalami, mas perde de novo a favor do piloto brasileiro em Barcelona. Mas duas vitórias, na Belgica e no Mónaco, onde iguala o recorde de vitórias de Jim Clark, fazem com que a sua candidatura ao título esteja relançada. Por esta altura, Stewart decidiu que iria abandonar a competição no final daquela temporada. Comunicou a decisão a Ken Tyrrell, e o segredo ficou entre eles até Watkins Glen.
Vence de novo em Zandvoort, e pela terceira vez na sua carreira em Nurbrurgring, fazendo dobradinha com Cevért. Era a sua 27ª vitória oficial na Formula 1, um recorde que ficaria na sua posse durante os 14 anos seguintes. Com as dificuldades de Fittipaldi dentro da Lotus (Chapman não favorecia Fittipaldi e dava tiros no pé em relação à briga pelo título), Stewart tinha tudo para ganhar o tricampeonato. Conseguiu-o em Monza, quando chegou em quarto lugar, e Fittipaldi perdeu a vitória em favor de Peterson.
Watkins Glen iria ser a corrida numero 100 da sua carreira. Um palco ideal para a sua despedida das pistas, e tinha preparado as coisas para tal. Durante aquela temporada, os rumores sobre a sua retirada fervilhavam o "paddock", mas o escocês ficava calado. Na sexta-feira à noite, Stewart convida Cevért, Peterson e Fittipaldi, seus amigos mais próximos, para jantar, onde conta as suas intenções. No dia seguinte, perto do meio dia, quando o seu companheiro Francois Cevért tentava establecer uma volta mais rápida, perde o controlo do seu carro na zona dos "Esses", batendo em cheio a um ângulo de 90 graus e arrastando-se durante cem metros. O piloto francês, então com 29 anos, teve morte imediata.
“Os socorristas nem se deram ao trabalho de tirar os seus kits, porque via-se logo que estava morto”, contou anos mais tarde. Cevert tinha o corpo lacerado, e a causa da morte teria sido degolação, no momento do impacto com os rails de protecção. Quando os treinos recomeçaram, Stewart voltou à pista, numa tentativa de saber por si mesmo a razão do acidente. Logo descobriu que o seu estilo de condução, combinado com o irregular asfalto daquela zona e a falta de escapatórias, teria sido o factor decisivo do acidente. Pouco depois, a Tyrrell retirava os seus carros da competição, em sinal de luto. E Jackie Stewart abandonava a competição, sem fazer o seu centésimo Grande Prémio.
A sua carreira na Formula 1: 99 Grandes Prémios, em nove temporadas (1965-73), 27 vitórias, 47 pódios, 17 pole-positions, 15 voltas mais rápidas, 360 pontos no total. Campeão do Mundo de Formula 1 em 1969 (Matra) 1971 e 1973 (Tyrrell)
(continua amanhã)
5 comentários:
Speeder, estou me deliciando com a sua biografia sobre o Stewart.
Fantástico, irretocável!
Cada vez que entro no Continental Circus encontro uma surpresa agradável como esta.
Parabéns!
Olá Speeder, estive a ler a biografia do Jackie Stewart e adorei, ta muito bem escrita e descrita, gosto muito de visitar o teu blog, quase todos os dias dou um saltinho ao Continental Circus.
Continua assim, a deliciar-nos com os teus artigos.
Eu vou continuando a fazer os kits, agora tou a fazer um Ferrari F189 e um Brabham BT46, ao mesmo tempo, novidades para breve.
Um abraço
Reza a lenda que depois da prova com chuva em Monaco 1972, onde Emerson teve uma atuação incrível e poucas voltas depois de passar o Stewart, o escocês abandonou a prova. Saiu irritado dizendo que não poderia correr com alguém que fazia o impossível - grande parte também devido ao fantastico carro da Lotus daquele ano. Na corrida seguinte, Jackie não foi por causa da úlcera - então surgiu a história da úlcera Fittipaldi...rsrs. Grande duelo travaram os dois.
Concordo com o Malfitani, sensacional o especial, Speeder. Pelo jeito ainda teremos mais bons episódios pela frente.
Abraço.
Grande obra prima! Um trabalho de resgate da carreira de um dos maiores expoentes do automobilismo no planeta Terra! Viva Stewart!!!
Booooooooa Speeder... To acompanhando tudo aqui,,,
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