segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Grand Prix (numero 62, uma oportunidade inesperada)

Alexandre guardou para si aquela tarde de sol em Monforte. Viu na televisão a prestação da Matra em Charade, onde sem a presença da Apollo, a equipa francesa inscreveu um terceiro carro para que Pierre Brasseur tivesse a sua primeira experiência de Formula 1. No "Nurburgring francês", o homem de Clermond-Ferrand acabou a corrida na porta dos pontos, em sétimo lugar, mas na cauda de Bob Bedford, que ficou com o ponto final na sua Jordan negra e dourada.

Aqui, a Matra foi rei e senhor, fazendo uma dobradinha com Philippe de Beaufort e Gilles Carpentier na primeira e segunda posições, à frente do alemão Pieter Reinhardt, no Jordan oficial. Atrás dele, de modo surpreeendente, ficou o Temple-Jordan de Antti Kalhola, que naquela pista de montanha, estava imensamente à vontade, entre curvas e contracurvas, superando os Ferrari de Van Diemen e Bernardini, que desistiram, e o McLaren de Peter Revson, o quinto classificado. Já agora, Antti tinha sido o último dos pilotos a ficar na mesma volta do vencedor, e um dos seis ou sete que não furaram naquela pista francesa.

Brands Hatch estava agora a duas semanas de se realizar, e normalmente era uma prova com imensas inscrições, de pilotos locais e outros, pois era uma excelente montra para se mostrarem perante o publico, dirigentes e jornalistas. E a silly-season estava ao rubro, dadas as circunstâncias. Nos jornais, a Lamborghini anunciou que tinha decidido cancelar a sua parceria com a McLaren, mas não a sua aventura da Formula 1, afirmando que iria fazer um motor V12 de três litros para correr em 1972, em conjunto com as Interseries. Quanto a Peter Hogarth, Teddy Mayer decidira inclui-lo, ao lado de Peter Revson e Dan Gurney, que iria correr pela equipa sempre que não havia corridas de Can-Am nos fins de semana da Formula 1. A equipa iria encher-se de veteranos, antes de em 1971 escolher um piloto mais jovem.

Entretanto, corriam-se rumores de que Bruce Jordan iria despedir ou trocar Bob Bedford por um dos pilotos de Henry Temple. Todos falavam que o seu substituto seria o jovem finlandês Antti Kalhola, mas não havia nada definido. Aliás, numa terça-feira, quando perguntaram isso a Bruce Jordan, ele respondeu com um tipico "utter nonsense, uma noticia à Monty Python". Mas alguns dias depois se soube que haveria dois novos chassis para a equipa de Henry Temple, para além de um terceiro carro oficial para a Jordan. Os rumores, que já eram grandes, aumentaram ainda mais...

Na BRM, Bob Turner ainda mostrava quem mandava, mas sabia que a sua sorte poderia acabar a qualquer momento. Também via que ali, as coisas eram menos organizadas do que na Jordan, e no dia a seguir ao GP de França, decidira chamar um veterano jornalista da Autosport britânica para lhe dizer que o ano de 1970 seria o seu ano final como piloto. Tinha gozado quase doze anos de sucessos, com títulos mundiais, e queria retirar enquanto era capaz. Quanto ao seu futuro, considerava todas as opções, desde ser o director desportivo da BRM até fazer a sua própria equipa.

Alexandre lia a entrevista numa banca de jornais a caminho de Silverstone, no seu Alpine azul. Comprara a revista e estava a saborear o "breakefast" britânico, perto da sede da Apollo, em Silverstone. Era uma quinta-feira e era a primeira vez que lá ia depois dos acontecimentos de Zandvoort. Apesar de Pete lhe ter dito que a equipa continua e o chassis estaria pronto, ele tinha dito que "tinha uma uma coisa interessante para ele". Eventualmente seria um lugar como piloto titular na Apollo, mas tinha uma dúvida: por um lado, era bom, pois seria um lugar no qual iria ser pago para correr, mas por ouro lado, tinha compromissos que não queria quebrar. A ser verdade, como iria descalçar esta bota?

Por volta das dez da manhã, chegou à sede da Apollo, em Silverstone. Um pouco a medo, entrou dentro da fabrica, com a secretária a dar-lhe os bons dias.

- O Pete?
- Está na oficina. Pode entrar.

Alexandre entrou dentro da oficina, onde os mecânicos colocavam elementos num novo chassis, verde e branco, enquanto que a seu lado estava um totalmente pintado com as cores dos seus patrocinadores, a brilhar de novo, pronto para rolar em pista. Por acaso até tinha consigo o saco com o fato de corrida e o capacete, que deixara dentro do carro. Alexandre viu Pete a falar com um outro senhor de meia idade, louro, forte e com entradas, denunciando um principio de calvície. Confessa conhecer aquela cara, embora não soubesse de onde.

Quando Pete o viu, saudou-o:

- Olá Alex! É bom ver-te por aqui.
- O mesmo digo de ti, Pete.

Cumprimentaram-se e Pete disse:

- Alex, este é Arthur O'Hara, tio de John. Vai estar aqui para acompanhar durante uns tempos.
- Como vai? disse Arthur.
- Prazer, sr. O'Hara. Quero dizer que sentimos imenso a falta do John.
- Acredito, meu jovem. Mas nós fazemos parte do barco e continuar por aqui é uma forma de honrar a memória dele.
- Assim seja, sr. O'Hara.
- Alex, vamos para o escritório?
- Vamos, mas primeiro, gostaria de dar uma olhadela ao meu carro.

Alexandre olhou para o chassis. Era aquilo que queria: um chassis actualizado, virgem, com as cores dos seus patrocinadores, pronto para correr e disputar, palmo a palmo, a vitória nas corridas que iria disputar até ao final do ano. Era algo belo para os seus olhos, e estava ansioso para dar as suas primeiras voltas antes da corrida britânica, em Brands Hatch.

Depois disso, Alexandre seguiu para o escritório, acompanhando Pete e Arthur. Estranhou a presença, mas depois lembrou-se que a familia O'Hara era o patrocinador principal e um dos sócios da equipa. Sentou-se e ouviu o que tinham a dizer:

- Alex, deves ter uma ideia porque estás aqui.
- Para além de ira buscar o chassis novo?
- Sim, para além disso.
- Quem que substitua o John, certo?
- É isso tudo, jovem rapaz, disse Arthur.
- A ideia é ficares com o lugar a partir de Brands até ao final da época, para ver como é que te comportavas na nossa equipa. Sabemos que tens potencial de vencedor e o provaste com o Eagle, pontuando em duas corridas importantes. Se foste capaz com um carro datado, porque não num carro mais actual, como o nosso? perguntou.

Alexandre ficou a pensar por um momento, e depois respondeu:

- Senhores, sinto-me muito honrado pelo vosso convite. Antes de poder dizer sim ou não, quero colocar um problema em cima da mesa. Tenho compromissos assumidos com o Automóvel Clube, que me pagou para comprar este chassis, para além da Tecno, que me paga o salário para impedir que corra nas suas rivais, como a Matra e a Jordan. Foi por isso que aprovou a ideia de correr num chassis comprado, numa equipa minha e não numa oficial. Agora, as circunstâncias são diferentes, e sinto-me tentado em aceitar a vossa proposta. Mas também quero ganhar a Formula 2, logo, tem de falar com a sede, em Bolonha, para saber se me deixam correr para vocês.
- E o Automóvel Clube?
- Isso lido com eles. Deverão deixar que eu corra, mas se calhar com algumas garantias. Talvez vos peça para devolver o dinheiro ou coisa assim... mas isso se negoceia.
- Hmmm... falaremos com eles todos, disse Pete.
- Otimo. Dou-te os contactos, se quiseres, afirmou Alex, tirando uma agenda castanha, de tamanho pequeno, no bolso das calças.
- Serve. Deixa-me passar os numeros de telefone..., respondeu Pete.

Arthur tomou a palavra:

- Diga uma coisa, meu jovem: quanto pensa ganhar aqui, caso fique conosco como piloto principal?
- Ficaria satisfeito se me dessem um contrato para 1971, e aí desse para pagar o investimento que já fiz até agora.
- Quanto é que já inestiu?
- Quase 45 mil libras.
- É muito, meu jovem.
- Formula Ford, Formula 3, Formula 2... tirando esta última, comprei todos os chassis, formei as minhas equipas, trabalhei com os meus mecânicos, do qual paguei o que tinha a pagar. E claro, a Formula 1 e os chassis que adquiri até agora.
- Pete, o que vais fazer em relação ao chassis que construiste para ele?
- Para todos os efeitos, só falta entregar a chave.
- Quanto é que lhe custou?
- Nove mil e quinhentas libras.
- Está pago?
- Está. Adiantado.
- Se todos os clientes fossem assim como você, o mundo seria perfeito! repondeu Arthur. Como prova da nossa boa vontade, vamos devolver-lhe o dinheiro. Considere como um salário até ao final da época, sr. Monforte.
- Devolvo o chassis?
- O chassis é seu, meu caro. Apenas será assistido por nós e pelos mecânicos que achar de confiança para si. Vá falar com a sua parte, que nós falamos com a nossa, e no dia 18, estará a correr com as nossas cores, concluiu.
- É assim, Pete?
- É. Agora vou ligar para Bolonha. Entretanto, não queres dar umas voltas no novo carro?
- Obvio! quero ver como funciona.

Pete dirigiu-se para a oficina, onde disse aos mecânicos para que colocassem o carro fora da garagem e tivessem pronto para correr. Três deles colocaram na porta das boxes do circuito, preparando-o para as suas primeiras voltas.

Poucos minutos depois, Alexandre apareceu com o macacão de corrida e o seu capacete integral, entrando para dentro do seu carro. Os mecânicos colocaram o cinto de quatro pontos no seu corpo e prepararam para ligar o carro para que pudesse dar as suas primeiras voltas em pista. Na boxe, Arthur O'Hara via todos estes preparativos à distância, observando os rituais que o seu sobrinho tinha feito até umas semanas antes. Quando o motor foi ligado, Alexandre sentia o ronco do seu motor logo atrás de si, e estava preparado para dar as suas primeiras voltas. Brands Hatch era dali a dez dias.

(continua)

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