Com a desistência de Van Diemen, toda a gente sabia que o título já tinha dono, pois mesmo que ele vencesse no México, não conseguiria alcançar o falecido Philippe de Beaufort na tabela de pontos. Na Matra, começava a haver algumas comemorações e alguns choros pelo meio. Na Apollo, os sorrisos eram a norma, e alguns já ensaiavam algumas palmadinhas nas costas de Pete. Só que ele refreou os ânimos:
- Ainda não ganhamos nada, falta ainda muitas voltas. Nem ao meio chegamos, rapazes.
Ele tinha razão. Monforte poderia liderar, mas estava a ser seguido por Gustafsson, que por sua vez tinha De Villiers atrás de si, a pressioná-lo. Os três não se largaram, mesmo depois do sul-africano o ter passado na volta 53, relegando o sueco para o terceiro posto. Os pneus tinham sido a razão dos Apollo conseguirem uma superioridade sobre a concorrência, mas a resistência dos motores V8 da Cosworth também tinha ajudado. À medida que se chegava ao final da corrida, a ansiedade aumentava nas boxes. Se os Apollo até se portavam melhor do que o esperado, nas outras boxes as coisas estavam um pouco pior. Gustafsson começava a ver escapar os Apollo e começava a sentir a aproximação do Matra de Gilles Carpentier, que já se tinha livrado de Michele Guarini, o Ferrari sobrevivente. O sueco tinha uma boa razão para ter abrandado: estava a poupar combustivel, porque este tinha baixado demasiado. O motor V12 da BRM era glutão e parecia não ter o suficiente para fazer a corrida inteira e quando ouviu o sinal de que tinha alcançado a reserva, estava na volta 88, faltando-lhe vinte voltas para acabar. Assim, não teve outro remédio senão rumar às boxes e abdicar de um pódio certo.
- Olha, aí vêm ele. Problemas? disse Michael Delaney.
- Veremos o que farão... hmmm, um dos mecânicos tem um funil... gasolina. Não estou surpreendido, o motor BRM é beberrão, disse Alex Sherwood.
Feito o reabastecimento, Gustafsson arrancou veloz para a pista, tendo apenas perdido um lugar para Carpentier, mas com Guarini e Kalhola logo atrás. A partir dali, o sueco tentou aumentar enormemente o ritmo para o apanhar, pois os pneus dele estavam em melhores condições do que as do francês. O ritmo permitiu-lhe ganhar quase dois segundos por volta e fazer cair o melhor tempo de corrida por várias vezes, mas na volta 101, já com Carpentier à vista, exagerou na curva anterior à meta e teve uma incursão na relva ainda molhada. Isso foi mais do que suficiente de que deveria ficar com o quarto posto.
Na frente, estava tudo calmo. De Villiers estava algo longe de Monforte e não valia a pena atacá-lo à procura da vitória. O sildavo estava já a pensar em levar o carro até à meta, mas à medida que contava as voltas que faltava para acabar, começava a estar mais atento a algum barilho fora do vulgar, pois não queria que isto fosse retirado por alguma falha mecânica ou falta de concentração.
Então, quando viu a placa de que faltava uma volta para o final, começaram a assaltar-lhe outros pensamentos: onde estava um ano antes, o que se passara naquele ano, a vitória em Brands Hatch, o seu acidente em Zandvoort e as mortes dos seus amigos em Rouen e Monza, Teresa, a sua cidade e sobretudo o aviso que recebera alguns meses antes. Tudo isso lhe passava pela cabeça, e ele estava ansioso para ver a bandeira de xadrez o mais rápido possivel...
Agora faltavam duzentos metros. Monforte concentrava-se mais no que podia na curva final, não permitindo sequer respirar fora do ritmo que tinha imposto a si mesmo, até sustendo a respiração quando por fim viu o homem com a bandeira de xadrez. Acelerou suavemente até passar pela personagem, e só então é que comemorou, efusivamente, com as mãos no ar. Aliviado, conseguira vencer e resolver a luta pelo título a favor de, na sua opinião, o piloto que merecia tê-lo: Philippe de Beaufort. Depois da euforia, abrandou o carro, fechou os olhos e respirou aliviado.
Alguns segundos mais tarde, o segundo Apollo passou sobre a meta, deixando um extasiado Pete Aaron duplamente contente: era a sua aposta para o futuro, o sul-africano Phillip de Villiers que ficava com o segundo posto, conseguindo o seu melhor resultado da sua curta carreira. E se não fossem os problemas passados por Teddy Solana, teria monopolizado o pódio.
Atrás, Anders Gustafsson cortava a meta no quarto lugar, algo frustrado pelo resultado, mas não poderia dar a tarde como perdida, pois tinha conseguido o seu melhor resultado do ano, superando o Ferrari sobrevivente de Michele Guarini, e o Jordan de Antti Kalhola, que fechava os pontos. E mais á frente, no pódio, estaria o francês Gilles Carpentier, no seu Matra. Pelo menos estaria alguém no qual poderiam dizer em pessoa de que fizeram tudo aquilo por eles, os que lhe assentariam melhor o título do que à Ferrari. Na boxe, Patrick Van Diemen vira o final de forma resignada. Tinha perdido as suas chances de título, com aquele motor rebentado. Mas aplaudia, com "fair-play", o resultado final. E quando foi abordado pelo primeiro jornalista que o encontrou, disse:
- Parabéns á Apollo, parabéns à Matra. Merecem a vitória e o título. Fiz o melhor, mas o carro não colaborou, é pena. Temos um excelente carro e enquanto houve a hipótese de lutar pelo campeonato, fizemos. Não consegui, foi pena. Espero que no próximo ano todo este esforço nos dê o campeonato que nos escapou agora em 1970.
- E no México?
- Queremos ganhar, ora. É a última corrida do ano, temos de nos esforçar para obter tal feito.
- E os pneus novos que a Greatyear deu à Apollo?
- Aparentemente, são magnificos. Espero que o nosso fornecedor nos dê algo semelhante que é para nós podermos lutar e superar os nossos adversários. Mas hoje não foram só os pneus que nos fizeram perder. Foi mais do que isso.
De facto, era assim. Van Diemen ficara sem motor, Bernardini sem caixa de velocidades, e Guarini salvara o dia com o quinto lugar final. Muito pouco para uma equipa com asprições ao título.
No pódio, Pete, Alex e Teresa tinham subido ao palanque para receber a enorme taça que era o troféu de vencedor do Grande Prémio. Com uma "Miss Watkins Glen" a seu lado, segurando a coroa de louros tamanho-familia, colocou-o em Alex, para depois o director de corrida lhe dar o troféu e a garrafa de champanhe, antes de se colocar em sentido para ouvir o hino sildavo, o seu hino. Depois, foi tocado o hino americano, país de origem do construtor. Pete colocou a mão no peito, não se furtando a uma lágrima. Mas não era por um patriotismo de última hora: era porque não tinha esquecido que, quase dois anos antes, tinha quase perdido a vida nesse mesmo circuito. A sua vida tinha finalmente dado a volta de 180 graus que ele queria, algo que poucos conseguem.
Depois das poses, Alex abriu o champanhe, despejou o seu conteúdo no troféu e bebeu um pouco. Deu a Pete e à Teresa e foi abraçar De Villiers, que também tinha aberto o champanhe, mas para despejar sobre os outros. Logo depois, viu Gilles Carpentier e disse:
- Estás feliz?
- Acho que tinha de ser assim. Obrigado por terem ajudado a alcançar o objectivo.
- Sabes como é, acho que ele merecia. Acho que todos nós sabiamos que este teria de ser o final da temporada, por muito que os outros se esforçassem. Vocês, e ele em particular, onde quer que esteja, devem sorrir hoje.
Logo a seguir, apareceu Patrick Van Diemen ao pódio para lhe dar os parabéns pela vitória conquistada naquela tarde. Os três abraçaram-se e todos juntos, posaram para que lhe tirassem as fotos que iriam surgir nos jornais dos dias seguintes um pouco por todo o mundo, todos falando sobre o inédito campeonato de 1970, que passaria para a história cpomo aquele cujo vencedor não estaria vivo para o receber.
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